Título: A mágica dos altos salários
Autor: Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 02/10/2009, Política, p. 2

Para garantir reajustes no próximo ano, funcionários públicos do Senado precisam primeiro explicar aos parlamentares a complicada fórmula que garante rendimentos extras nos atuais contracheques

Sala vazia no Senado em janeiro e funcionários com gratificações garantidas no contracheque mesmo nos momentos que não aparecem no Congresso para trabalhar

Os 3,4 mil servidores efetivos do Senado terão uma difícil tarefa para convencer os parlamentares a aprovarem um reajuste salarial para o próximo ano. O primeiro componente é político. O presidente da Casa, José Sarney(1) (PMDB-AP), e o primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), já sinalizaram aos funcionários que uma reforma no plano de cargos e salários só sairá se envolver corte de gastos. Dessa forma, o plano de reestruturação que prevê a incorporação de gratificações não deve sair do papel. Um ingrediente não menos importante é explicar aos senadores a complicada matemática do contracheque dos servidores. Afinal, ao salário-base, os efetivos têm outros seis ganhos indiretos. Eles proporcionam um crescimento salarial que ultrapassa, em alguns casos, o teto de R$ 24,5 mil do funcionalismo público. O Senado gasta R$ 2,3 bilhões com sua folha de pessoal.

A mágica do aumento salarial tem o nome de batismo entre os servidores de ¿conta de chegada¿. Eles recebem um vencimento básico que varia, dependendo do nível de escolaridade e do cargo ocupado, de R$ 1.140 até R$ 6.410 por mês. Sobre ele, são pagos a todos os servidores a gratificação de auxílio legislativo (GAL). Ela corresponde a 50% do vencimento básico, ou até 3,2 mil a mais. A partir daí, começam algumas diferenças salariais nas carreiras. Somente os servidores de níveis médio e superior recebem a gratificação de representação, um acréscimo de até R$ 3,3 mil.

A grande briga do momento dos servidores está no quarto dos seis itens da equação do Senado: a incorporação das funções comissionadas (FCs). Pelo menos 90% dos efetivos ganham as tais FCs, distribuídas sem qualquer critério nos últimos 15 anos. Desejam agregá-la para sempre, afinal é um aumento de mais R$ 2,4 mil por mês. ¿Ela está integrada à nossa remuneração¿, afirmou o presidente do sindicato da categoria (Sindilegis), Magno Mello, que espera sensibilizar os senadores para aprovar o plano de salários. Só essa composição garante aos funcionários de nível médio R$ 9 mil e aos de nível superior, R$ 13 mil em fim de carreira, segundo o sindicato.

Uma série de outros penduricalhos, contudo, ajuda a engordar o contracheque dos servidores. Primeiro são as horas extras. Desde o início do ano, o Senado gasta uma média de R$ 6 milhões mensais com o pagamento de extras para efetivos e comissionados, também. Um adicional garantido de até R$ 2,6 mil por mês, pagos em meses em que não houve sequer sessão legislativa: janeiro e metade de julho. Eles ainda podem receber por participação em comissões especiais, 14º e 15º salários como os senadores e abono permanência, no caso de quem já alcançou o tempo de contribuição do serviço público (leia quadro).

Porta de saída Com tantos ganhos indiretos, os efetivos não querem se aposentar. Uma estimativa obtida com um servidor da cúpula administrativa dá conta de que 600 funcionários tem tempo de contribuição para deixar o trabalho. Pelas regras atuais, para homens, são 35 anos de contribuição e 65 anos de idade e, para as mulheres, 30 anos de contribuição e 60 anos de idade. Até o fechamento desta edição, a diretoria-geral não confirmou a informação. Os aposentados e pensionistas perdem direito a boa parte dos penduricalhos, o que acarreta uma redução de quase 50% dos vencimentos, em alguns casos. Acabam saindo apenas aos 70 anos, prazo máximo para a aposentadoria compulsória dos funcionários públicos.

O presidente do Sindilegis sustenta que, só com a reforma que incorpore os ganhos indiretos, os servidores mais antigos vão querer, de fato, se aposentar. Nos últimos 10 anos, tem se mantido inalterado o número de aposentados da Casa. Para Magno, a salvação está numa nova política salarial. ¿É muita gente. O Senado fica prendendo os seus quadros com essa maluquice (a falta de um plano de carreira). O Senado deixa oxigenar seus quadros, deixa de renovar, deixa de poder até reduzir seus quadros¿, disse.

1- Atos secretos A comissão criada para investigar a edição dos atos secretos isentou os integrantes da Mesa Diretora do Senado de qualquer irregularidade no caso. Ao fim de dois meses de trabalho, o texto apontou como únicos responsáveis pela não publicação de medidas administrativas o ex-diretor-geral Agaciel Maia e o ex-diretor de Recursos Humanos João Carlos Zoghbi. No Senado, quando o presidente da Casa, seu primeiro-secretário ou qualquer outro membro da Mesa assina um ato administrativo, não pratica ele qualquer irregularidade se o ato não vier posteriormente a ser publicado, já que não é da sua competência adotar tal providência, descreve o texto.

É muita gente. O Senado fica prendendo os seus quadros com essa maluquice (a falta de um plano de carreira)¿

Magno Mello, presidente do Sindilegis

Servidores cobram sindicato

Daniela Lima

Os 1.554 servidores efetivados naquele que se tornou o maior trem da alegria da história do Senado devem cobrar do sindicato que os representa o pagamento de honorários para defesa na ação popular que questiona a inclusão deles no quadro da Casa. Em 2002, a entidade firmou contrato com um escritório de advocacia por tempo determinado, no valor de R$ 1,5 milhão, mas não comunicou os funcionários sobre o prazo de validade. Como revelou o Correio, o procedimento contra esses funcionários foi incluído no programa Meta Dois, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o que dá prioridade de trâmite para decisão até o fim deste ano. Desde 2006, os servidores estão sem defesa formalizada.

Muitos dos réus da ação só souberam que estavam sem advogado após a publicação de reportagem do Correio. Logo depois, o Sindicato dos Servidores do Legislativo (Sindilegis) se apressou em renovar a contratação com o escritório de advocacia que, em 2006, quando houve decisão em primeira instância exigindo a exoneração desses funcionários, conseguiu anular o processo, fazendo com que ele retornasse praticamente à estaca zero.

O pagamento pelo novo contrato, no valor de R$ 2 milhões, foi questionado por servidores. ¿Para mim essa ação já estava acabada. Eu não sabia que precisaria pagar novamente o advogado¿, reclamou uma servidora ontem, em reunião com os demais réus da ação, em que o sindicato tentava argumentar pela renovação do contrato.

Representante do escritório de advocacia disse, em reunião com os servidores, que só trabalha com prazos determinados e que a validade de quatro anos estava descrita no contrato. Portanto, caberia ao sindicato fazer a ressalva aos seus filiados. Dessa vez, no entanto, abriu uma exceção e ficará com a causa até o fim. A ação corre desde 1985 e foi iniciada um mês após o ex-presidente do Senado Moacyr Dalla transformar os 1.554 funcionários celetistas em efetivos na base da canetada.

O presidente do Sindilegis, Magno Mello, por sua vez, afirmou que a falha ocorreu na gestão anterior, e que por isso não poderia comentar. ¿Mas agora estamos enviando cópias dos contratos para todos¿, garantiu. Mello também ressaltou que o sindicato não tem condições de arcar com o valor da causa. Já o ex-presidente da entidade, Ezequiel Souza Nascimento, disse que todos os funcionários foram informados sobre a validade do contrato e que o sindicato atuou apenas como intermediador da relação entre os réus do processo e o escritório de advocacia.

A conta da chegada

Os salários do servidores efetivos do Senado obedecem uma lógica própria. São vários os ganhos indiretos ao vencimento básico a que um funcionário da Casa tem direito. Saiba como:

Vencimento Básico (VB) De R$ 1.140, o piso para os auxiliares legislativos (nível básico) até R$ 6.410, o teto dos consultores e analistas legislativos (nível superior)

+ Gratificação de Auxílio Legislativo (GAL) Corresponde a 50% do vencimento básico do cargo efetivo. Todos os servidores fazem jus. Varia de R$ 570 a R$ 3.200.

+ Gratificação de Representação (GP) Os servidores de níveis médio e superior recebem desde 2002. Corresponde ao dobro de uma função comissionada FC-6, para nível médio (R$ 2.641,92) , e FC-7, para nível superior (3.302,40).

+ Função Comissionada (FC) Atualmente, 90% dos 3412 funcionários do quadro do Senado recebem uma função comissionada. Elas representam de R$ 1,3 mil a R$ 2,4 mil a mais no salário.

+ Horas extras O servidor tem direito a receber um acréscimo salarial por ter trabalhado a mais do que a rotina diária. Por duas horas a mais de trabalho, um servidor pode ganhar mensalmente até R$ 2,3 mil em horas extras.

+ Comissões especiais Os servidores também podem participar de comissões especiais criadas para os mais diversos fins. O funcionário que participar de 10 sessões por mês dessas comissões garante um adicional de até R$ 2,6 mil.

+ Abono permanência Previsto apenas para quem já tem tempo de contribuição que lhe permitiria se aposentar, o servidor deixa de ter descontado do contracheque a contribuição previdenciária, de 11%. E passa a receber esse percentual a título de prêmio do funcionalismo.

Fonte: Sindilegis