Título: Polícia Federal investiga Cruzeiro do Sul desde 2010
Autor: Justus, Paulo
Fonte: O Globo, 19/09/2012, Economia, p. 29

Banqueiros levaram R$ 63 milhões com fraudes, diz Procuradoria

O Banco Cruzeiro do Sul, que foi liquidado pelo Banco Central (BC) na semana passada, já estava sendo investigado desde 2010 pela autoridade monetária e pela Polícia Federal (PF). Na época, o BC acionara o Ministério Público Federal (MPF) e a PF depois de identificar indícios de irregularidades no banco. Naquele ano, a PF instaurou o primeiro inquérito para apurar fraudes como a "ocultação de prejuízo e criação de lucros artificiais" nos balanços, além de suspeitas de formação de quadrilha entre os então controladores e diretores da instituição. As manipulações contábeis teriam ocorrido ao longo de 2008 até abril de 2009.

De acordo com o MPF, os acionistas teriam embolsado R$ 90 milhões em dividendos resultantes de lucros indevidos, dos quais R$ 63 milhões teriam sido destinados aos controladores - os banqueiros Luiz Octávio Índio da Costa, e seu pai, Luiz Fellipe.

Na última segunda-feira, agentes da Polícia Federal realizaram buscas e apreenderam documentos e registros digitais dos ex-controladores do banco numa residência em São Paulo e na sede de uma empresa no Rio de Janeiro. A operação foi autorizada pela 2ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo, que também determinou a indisponibilidade de imóveis, veículos e aplicações no mercado financeiro dos ex-controladores do Cruzeiro do Sul.

Segundo a PF, essa apreensão de documentos ainda se refere ao primeiro inquérito instaurado em 2010, não tendo portanto relação direta com os desvios - entre outros, R$ 1,3 bilhão em financiamentos inexistentes lançados no balanço como ativos -, que levaram à intervenção no banco. Estes últimos são objeto de outro inquérito, aberto pela Delegacia de Repressão aos Crimes Financeiros na Superintendência Regional da Polícia Federal no Rio, em 4 de junho, depois que o banco foi colocado em Regime de Administração especial temporária (Raet) pelo Banco Central.

Nesta investigação, a PF analisa também a operação em que o Cruzeiro do Sul teria adquirido por R$ 55 milhões o Banco Prosper, que estava descapitalizado e já não operava mais. Corre na PF ainda um terceiro inquérito, também para apurar gestão fraudulenta no Cruzeiro do Sul.

formação de quadrilha investigada

Além dos ex-controladores, o MPF investiga um ex-membro do Conselho de Administração e uma ex-diretora do Cruzeiro do Sul. Eles teriam se unido de "maneira estável e estruturada para administrar o banco de maneira fraudulenta" - o que caracterizaria o crime de formação de quadrilha. De acordo com os procuradores, o grupo teria sido responsável por "idealizar, decidir e coordenar a criação de resultados artificiais nas demonstrações financeiras da instituição".

As investigações revelaram que o grupo também atuara para induzir a erro tanto a fiscalização do BC quanto os demais agentes do Sistema Financeiro Nacional, apresentando "informações falsas nas demonstrações financeiras do Cruzeiro do Sul por meio da introdução, nos documentos, de elementos contábeis forjados". Dessa forma, afirma o MPF, apresentavam ao mercado uma "aparência de saúde financeira e de instituição sólida" incompatíveis com a real situação do Cruzeiro do Sul.

Apesar dos muitos indícios de irregularidades, o BC só se convenceu das fraudes em 4 de junho, quando enquadrou o Cruzeiro do Sul no Raet, e indicou o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) para buscar uma solução de mercado que evitasse a quebra do banco. O FGC contratou os serviços de auditoria da PriceWaterhouseCoopers (PwC) e nos três meses que passou mergulhado nas contas do Cruzeiro do Sul identificou um rombo muito maior, de mais de R$ 3 bilhões.

O FGC traçou um plano de resgate do banco, conseguiu a adesão de quase 90% dos credores a um desconto de 50% nos seus investimentos, mas não encontrou um outro banco disposto a ficar com o Cruzeiro do Sul. O Santander chegou a entabular negociações, mas desistiu depois que o FGC recusou-se a garantir eventuais novas perdas que fossem descobertas.

Com a liquidação, na última sexta-feira, o Cruzeiro do Sul deu um prejuízo imediato de R$ 337 milhões aos detentores de suas ações e deixou investidores estrangeiros, que tinham comprado bônus que emitira no mercado internacional, com R$ 3,3 bilhões em títulos sem qualquer garantia, que dificilmente serão honrados.