Título: Laranjas são 40% dos fiscalizados
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: O Globo, 24/09/2012, Economia, p. 15
Oito em cada dez ações têm como alvo pessoas jurídicas, revela o Fisco.
Com o acesso aos extratos bancários de contribuintes, a Receita Federal descobriu que em mais de 40% dos casos fiscalizados o beneficiado pela sonegação não é o alvo da ação. Ou seja, as contas fiscalizadas são de laranjas ou testas de ferro de criminosos, identificados a partir do cruzamento e checagem das transações financeiras. Segundo Iágaro Jung Martins, coordenador geral de fiscalização da Receita Federal, muitos dos contribuintes ignoravam o saldo movimentado nas contas bancárias em seu nome.
- Eu tenho que seguir o dinheiro, descobrir quem é o sujeito que está por trás daquela movimentação. Por isso há procedimentos de fiscalização em que eu tenho até 15 quebras de sigilo para rastrear - explicou Martins, que afirma que, das ações de fiscalização com checagem de fluxo bancário, 91% comprovam infrações.
- Nas mais de 80 requisições de dados já feitas, nunca a intimidade do contribuinte foi rompida, porque nenhuma delas vazou da Receita - disse. - Eu não quebro o sigilo, eu transfiro de bancário para o sigilo fiscal, ao qual só o auditor tem acesso - justificou.
A Receita informou que todas as requisições de movimentação apontam qual a suspeita entre as 11 possibilidades de desvio previstas no decreto 3.724 de 2001.
- Há pessoas que movimentam mais de R$ 2 milhões por dia na Bolsa e não declaram nada - disse Martins, afirmando que os investigados não são assalariados comuns, mas pessoas com grande discrepância entre os dados declarados e os movimentados. Em média, segundo a Receita, cada autuação com quebra de sigilo resultou em créditos de R$ 3,5 milhões que foram sonegados. Oito em cada dez ações têm como alvo pessoas jurídicas.
Para o advogado Antônio Glaucius de Morais, sócio do escritório Meira Morais Advogados, a Receita não é clara ao justificar a quebra de sigilo:
- O contribuinte fica refém diante de um auditor, sem ser informado claramente sobre os motivos do acesso a seus dados bancários.
A Receita alega que esse é o método mais adotado para fiscalização tributária no mundo. Segundo Martins, levantamento da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) com 88 países em 2010 revelou que só 18 exigem decisão judicial para o acesso aos dados. Nenhum país avançado consta dessa lista.