Título: Nova baixa na Ética
Autor: Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 25/09/2012, País, p. 3
Sepúlveda Pertence deixa presidência da Comissão insatisfeito com atitude de Dilma
DESGASTE E CONSTRANGIMENTO
BRASÍLIA Desgastado com o ritmo dos trabalhos da Comissão de Ética Pública da Presidência, paralisados há cerca de dois meses, e descontente com a não recondução de dois conselheiros, o presidente do colegiado, Sepúlveda Pertence, renunciou ontem ao cargo, logo após dar posse aos três novos conselheiros - Marcello Alencar de Araújo, Mauro de Azevedo Menezes e Antônio Modesto da Silveira, indicados pela presidente Dilma Rousseff em 3 de setembro. Sepúlveda deixou clara sua insatisfação com a não recondução dos conselheiros Marília Muricy e Fábio Coutinho, que poderiam ficar mais três anos na comissão. Os dois foram duros na avaliação da conduta ética de ministros do governo Dilma.
- Eu vim aqui exclusivamente para empossar os três membros designados pela presidente da República e demonstrar-lhes a satisfação que tenho com os nomes e, ao mesmo tempo, que isso nada tem a ver com o fato que lhes comuniquei de que, neste momento, estou encaminhando à chefe do governo a minha renúncia às funções de membro e, consequentemente, de presidente da Comissão de Ética - afirmou Sepúlveda, ao iniciar a reunião de ontem do colegiado.
Pouco antes, ele anunciou sua saída aos servidores da comissão. Sepúlveda vinha dando sinais de constrangimento com a postura da presidente. Dilma demorou a nomear os três novos integrantes, o que inviabilizou a realização de duas reuniões da comissão, marcadas para 27 de agosto e 3 de setembro. Depois, ficou insatisfeito com a não recondução dos dois conselheiros, cujos votos contrariaram a presidente.
- Não tenho nada contra os designados. Lamento, devo ser sincero, a não recondução dos dois membros que eu havia indicado para a comissão e que a honraram e a dignificaram - disse.
Em maio, numa conversa informal com jornalistas, após a posse do ministro Dias Toffoli, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Sepúlveda disse que estava ansioso para que acabasse seu mandato na comissão. Ele foi indicado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro de 2007, assumiu a presidência da comissão em fevereiro de 2008, substituindo Marcílio Marques Moreira, que também renunciou ao cargo. O mandato de Sepúlveda iria até dezembro de 2013.
Na gestão de Sepúlveda, Dilma se irritou com a rapidez da comissão na votação do processo contra o ex-ministro do Trabalho Carlos Lupi. O procedimento foi aberto em 7 de novembro do ano passado e, no dia 30, a relatora Marília Muricy apresentou o voto, que foi aprovado. A comissão recomendou a demissão de Lupi, com base nas denúncias de irregularidades em convênios do Ministério do Trabalho, que teriam beneficiado o PDT. Lupi pediu demissão em dezembro. Irritou ainda mais a presidente o fato de a decisão do colegiado ter chegado antes à imprensa.
No início deste ano, novo embate da Comissão de Ética com Dilma. A comissão decidiu analisar a conduta do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, que prestou consultorias à Federação das Indústrias de Minas Gerais, que lhe renderam R$ 2 milhões, entre 2009 e 2010, como revelou o GLOBO em dezembro. Relator do processo, Coutinho propôs advertência ao ministro por conflito de interesse, mas o caso está pendente de decisão do colegiado.
Mesmo com a saída de Sepúlveda, com quatro das sete vagas preenchidas, a comissão pode continuar trabalhando.
- O quorum está restabelecido, e tenho certeza de que a comissão continuará servindo voluntária e gratuitamente, como sempre, a essa missão às vezes mal compreendida, mas sempre gratificante, de estabelecer uma cultura de ética no Poder Executivo Federal - disse Sepúlveda.
Interinamente, a comissão será presidida pelo conselheiro Américo Lacombe, o mais antigo. Lacombe disse não se sentir constrangido com a saída de Sepúlveda e negou que a comissão tenha perdido autonomia. Para o conselheiro, é um direito da presidente reconduzir ou não os conselheiros. A próxima reunião da comissão está marcada para 22 de outubro.
- Para mim, não causa embaraço nenhum - disse: - Não perde autonomia nenhuma, porque temos mandato fixo. Durante esse período, ninguém pode ser demitido.