Título: Transição no mundo árabe domina debates na ONU
Autor: Godoy, Fernada
Fonte: O Globo, 25/09/2012, Mundo, p. 28
Assembleia Geral começa hoje com Irã e Palestina em 2º plano
Correspondente
NOVA YORK Pelo segundo ano consecutivo, a Primavera Árabe e a violenta transição no Oriente Médio e no Norte da África serão os temas dominantes da Assembleia Geral das Nações Unidas, que será aberta hoje, com discurso da presidente Dilma Rousseff - uma entre os 120 chefes de Estado e de governo presentes em Nova York. O encontro marca a estreia na ONU do presidente do Egito, Mohamed Mursi, e a despedida do iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, que deixa o poder em 2013.
Ontem, Dilma passou o dia preparando o discurso com assessores. O chanceler Antonio Patriota fez apenas um breve comentário antes de se encontrar, no início da noite, com o enviado especial da ONU e da Liga Árabe à Síria, Lakhdar Brahimi:
- Sem dúvida, ela vai tratar da situação no Oriente Médio em seu discurso. É um assunto muito importante.
A presidente vai defender o multilateralismo para resolver a crise no Oriente Médio e também dedicará parte importante de seu discurso à crise financeira internacional, voltando a se queixar do expansionismo monetário dos países desenvolvidos, especialmente dos EUA, como no ano passado.
ELEIÇÕES LIMITAM AGENDA DE OBAMA
Com a recente explosão de violência antiamericana no mundo muçulmano, que se seguiu à divulgação de um vídeo ofensivo ao Islã, o massacre contínuo de civis na Síria e o aumento da hostilidade entre Irã e Israel, essa será uma das sessões mais importantes da Assembleia Geral, segundo o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon:
- A deterioração da situação na Síria estará em primeiro plano. Essa sessão vai refletir os tempos tumultuados em que vivemos, um tempo de convulsão e transição, e ela acontecerá tendo como pano de fundo uma onda generalizada de violência ligada à tolerância.
A Síria e os levantes árabes dominam também os encontros a portas fechadas e a reunião do Conselho de Segurança em nível ministerial amanhã, que terá como tema o "papel vital da Liga Árabe" no processo e nas negociações de paz. Até agora, a Rússia e a China têm vetado propostas de punição ao regime do sírio Bashar al-Assad no Conselho de Segurança. E o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Guido Westerwelle, foi explícito ao dizer que "aumentar a pressão e aumentar o isolamento do regime de Assad é um dos objetivos da semana".
A tensão gerada pelo programa nuclear iraniano será objeto de reunião importante, na quinta-feira, do grupo intitulado E3+3 (França, Reino Unido e Alemanha, mais China, Rússia e Estados Unidos).
A questão palestina, proeminente no ano passado, quando o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, apresentou um pedido formal para obter o status de Estado-membro da ONU, voltará à pauta - mas com uma proposta mais modesta.
Com amplo apoio já negociado entre o Movimento dos Países Não Alinhados, Abbas proporá que a Palestina receba o status de observador, assim como o Vaticano. Essa era uma proposta conciliadora sugerida no ano passado, e que deverá ter trâmite mais fácil, uma vez que é votada na própria Assembleia Geral, onde a causa palestina tem grande apoio. Entre os 193 países-membros, estima-se que 120 já tenham prometido seus votos. Ainda assim, a votação deve ser marcada após as eleições presidenciais nos EUA, para evitar constrangimentos para o governo do presidente Barack Obama. Abbas discursará na quinta-feira, seguido pela réplica do premier israelense, Benjamin Netanyahu.
Hoje, um dos primeiros a discursar, Obama tratará da polêmica sobre o vídeo anti-Islã e da onda de violência no mundo muçulmano que causou a morte do embaixador americano na Líbia, Christopher Stevens, e de mais três funcionários. Obama terá que se equilibrar sobre uma linha tênu: qualquer afirmação que possa ser interpretada como um pedido de desculpas pelas ofensas aos muçulmanos poderá ser explorada por seu adversário nas eleições, o candidato republicano, Mitt Romney.
Os dois travarão um duelo paralelo à ONU: ambos discursam hoje na Clinton Global Initiative, um evento promovido pelo ex-presidente Bill Clinton.
A agenda de Obama em Nova York será enxuta - até para evitar dilemas em ano de eleição. Todas as reuniões bilaterais foram canceladas. Ele recusou um pedido de audiência de Netanyahu e, embora a Casa Branca tivesse convidado o novo presidente islamista egípcio a um encontro reservado, acabou cancelando o que seria a primeira reunião de trabalho com o chefe de Estado do maior país árabe.