Título: Brecha para anular ação
Autor: Lima, Daniela
Fonte: Correio Braziliense, 03/10/2009, Política, p. 7

Defesa argumenta que os 1.554 servidores contratados sem concurso demoraram a ser citados, o que levaria à prescrição do processo.

A demora na citação dos 1.554 servidores do Senado que respondem a processo na Justiça por terem sido efetivados sem concurso público abre uma brecha para a extinção do procedimento. A ação popular que questiona ato do ex-senador Moacyr Dalla tramita desde 1985, ano seguinte à canetada que efetivou os funcionários na gráfica da Casa. Apenas em 1993 todos os funcionários foram citados. Os oito anos que separam a nomeação da citação sobre o procedimento já foram objeto de questionamento pela Advocacia-Geral do Senado no ano de 2002, e agora estão listados entre os argumentos da defesa dos servidores.

A ação popular tramita há mais de 24 anos. Pelo número de pessoas envolvidas no procedimento, a citação foi feita por edital, prática pouco usada pelo Judiciário atualmente. Apenas em 1993 todos os réus foram avisados da existência do processo. Em recurso de apelação impetrado em 2002 pelo então advogado-geral do Senado, Alberto Cascais, a tese de que a demora na citação dos servidores teria resultado na perda do objeto da ação foi levantada.

Em 2006, houve uma decisão na Justiça Federal de primeira instância em Brasília. Ela determinou a anulação do ato que efetivou os servidores e a consequente exoneração dos beneficiados. Portanto, desconsiderou a argumentação feita pelo ex-advogado-geral do Senado. No mesmo ano, no entanto, o escritório de advocacia contratado pelos servidores que respondem à ação encontrou uma falha formal no processo. Dos 1.554 réus, pelo menos dois já haviam morrido e seus beneficiários não foram citados. Por conta do erro, a decisão foi anulada na segunda instância e o processo retornou praticamente à estaca zero, desde a fase de citação dos réus.

Beneficiados

Por conta disso, a tese de que a ação teria perdido o objeto ganhou força. O ato que nomeou os 1.554 servidores abriu as portas para nomes que chegaram a ocupar os cargos mais altos na hierarquia do Senado e que protagonizaram escândalos recentes da instituição. Entre os beneficiados por aquele que ficou conhecido como o maior trem da alegria da história da Casa estão o ex-diretor-geral Agaciel Maia e o ex-diretor de Recursos Humanos João Carlos Zoghbi. A atual diretora de RH, Doris Marize, também foi efetivada pelo ato questionado na Justiça.

Outro argumento que reforça a tese da prescrição é o de que a administração pública não pode, passados mais de cinco anos, anular ato que resultou em benefícios a terceiros. Juristas ouvidos pelo Correio dizem que a teoria sobre a prescrição de ações populares é controversa. Isso porque a lei que versa sobre esse tipo de procedimento não estabelece um prazo. Ela é omissa sobre o assunto. Mas muitos advogados traçam um paralelo com a legislação que aborda as ações civis públicas para sustentarem a tese de que as populares também devem ter um período de validade.

A lei das ações civis públicas é que estabelece um prazo de cinco anos para que os réus de um ato questionado sejam citados. Mas, para um dos especialistas ouvidos pelo Correio, a ação popular trata de algo maior, de um dano à administração pública. Tanto que ela não pode sequer ser abandonada. Caso o autor desista, o Ministério Público ou outra instituição é obrigado a assumir o processo, acredita o jurista.