Título: Reduzindo problemas
Autor: Souza, Herval Barros de
Fonte: O Globo, 30/09/2012, Opinião, p. 19

Os projetos para a Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016 estão longe de transformar a matriz de transportes e atender à crescente demanda da população. Não será desta vez que o Rio, a exemplo das grandes metrópoles no mundo, poderá ostentar como legado uma nova matriz de transporte de massa. Prevalecerá ainda o modal rodoviário, com graves problemas de mobilidade urbana - um dos desafios prioritários do desenvolvimento sustentável.

Estima-se que, com as obras previstas até 2016, a engrenagem metroferroviária que atende 9% da demanda atual passará a responder por 14%, com crescimento de 88% das viagens por trem e de 71% por metrô, e uma redução de 6% na demanda por ônibus. Mesmo assim o modal rodoviário, responsável em grande parte por engarrafamentos e mais poluição do ar, continuará respondendo por 86% da demanda, incluindo os mais de 14% do transporte alternativo, que ainda terá número de passageiros superior ao de trem e metrô juntos.

O modelo de sucesso de outros países foi o mote das privatizações. No entanto, os atuais 48 km de extensão e 35 estações da rede de metrô do Rio mostram uma realidade bem diferente da pretensão.

Numa comparação histórica, mesmo São Paulo, com 71 Km, tem uma rede minúscula para uma megalópole de 19 milhões de pessoas. O metrô da Cidade do México tem mais de 200 Km. O de Seul, quase 400 Km. O de Londres tem 408 Km e 268 estações que servem grande parte da Grande Londres e áreas vizinhas, com 55% da rede à superfície. Santiago, a capital chilena que acaba de sediar o maior evento sobre transportes na América Latina, tem uma rede de metrô com cinco linhas, 101 estações e uma extensão de 94 Km, transportando 2,3 milhões de passageiros/dia. De dar inveja. Desde 1995, a concessionária de trens urbanos fluminense recebeu US$ 865 milhões de investimentos do Banco Mundial (Bird), e hoje ainda convive com problemas diários, como superlotação, atrasos e falhas técnicas. Os atuais governos do estado e do município fazem o possível. O estado, com as obras da linha quatro (16 km, de Ipanema à Barra da Tijuca) e o projeto da linha três do metrô (37 km, de Niterói a Itaboraí) e aquisições de trens e barcas. O município, com os BRTs e iniciativas como a criação das faixas exclusivas.

A nova Lei de Diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana preenche um vazio na gestão das políticas públicas de transportes. Espera-se limitar os problemas de mobilidade em algumas grandes cidades e regiões metropolitanas brasileiras. Mas uma mudança de paradigma exige muito mais do que novas linhas de ônibus ou trens novos. O que está em questão é a melhoria de qualidade de vida. Mais do que intervenções oportunas, é preciso manter o foco em investimentos com planejamento sistêmico e continuado de Estado. Os desafios são colossais.