Título: Brasil avança, mas ainda está no meio do caminho
Autor: Cruz, Renato
Fonte: O Globo, 15/10/2012, Desafios Brasileiros, p. 2

GARGALOS: Infraestrutura, impostos elevados e educação deixam o país em situação desfavorável em relação a outras economias, inclusive as emergentes

O transporte de uma tonelada de soja produzida em Mato Grosso para Xangai, na China, pelo Porto de Santos, pode chegar a US$ 180, segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em comparação, levar uma tonelada de soja de Davenport, nos Estados Unidos, para a mesma cidade chinesa custa US$ 108. Na fazenda, o produto brasileiro é mais barato, mas acaba se tornando mais caro por causa da deficiência logística do país. O custo do transporte representa 19% do valor final do produto americano, comparado a 30% do brasileiro. E o gargalo da infraestrutura é somente um dos problemas que afetam a competitividade do Brasil.

- A questão da competitividade está razoavelmente bem diagnosticada - afirma o economista José Roberto Mendonça de Barros, sócio da consultoria MB Associados.

Além da infraestrutura, ele aponta a complexidade do sistema tributário e a alta carga de impostos, a capacitação inadequada da mão de obra e a baixa qualidade da educação como pontos fundamentais que precisam ser melhorados para que o Brasil possa competir com mais sucesso no mercado global.

Os rankings internacionais de competitividade mostram um país no meio do caminho. No relatório mais recente do Fórum Econômico Mundial, o Brasil ficou em 48º lugar, entre 144 países. Outro estudo, da Economist Intelligence Unit (EIU), mostra o Brasil na 37ª posição entre 82 países. Há um contraste grande entre a posição do país nesses rankings e o tamanho de sua economia, a sexta maior do mundo.

Mercado interno é ponto positivo

Num evento da Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) este mês em São Paulo, Justine Thody, diretora para as Américas da EIU, mostrou uma nova versão da famosa capa de 2009 da revista "Economist", na qual o Cristo Redentor decolava como um foguete. A afirmação da capa original - "Brazil takes off" ("o Brasil decola") - ganhou um ponto de interrogação.

Segundo Justine, o crescimento do Brasil foi o mais afetado, entre os Bric (que inclui ainda Rússia, Índia e China), pela crise mundial. Ela mostrou também o desempenho de um segundo grupo de emergentes, o Civets (sigla em inglês para Colômbia, Indonésia, Vietnã, Egito, Turquia e África do Sul), que vem crescendo mais que o Brasil.

No ranking do Fórum, o Brasil ganhou cinco posições no último ano, ficando pela primeira vez entre os 50 primeiros países. O avanço foi puxado por melhoras na condição macroeconômica e na ampliação do uso de tecnologias da informação e comunicação. Entre os pontos positivos, a sofisticação da comunidade de negócios (33ª colocação), em um dos maiores mercados internos do mundo (7º lugar). Entre os negativos, a confiança nos políticos (121º), a excessiva regulação do governo (144º) e o desperdício de gastos públicos (135º). A qualidade da infraestrutura de transportes ficou em 79º lugar, e a da educação, em 116º.

A pesquisa mostrou as regulações tributárias como o fator mais problemático para se fazer negócios no Brasil: 18,7% das respostas. Em seguida vêm oferta inadequada de infraestrutura (17,5%), carga tributária (17,2%), burocracia governamental ineficiente (11,1%) e regulações trabalhistas restritivas (10,1%).

Economista propõe simplificação fiscal

Além de elevados, os impostos brasileiros são complicados de pagar. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), a carga tributária do país, perto de 36% do Produto Interno Bruto (PIB), é a quarta maior do mundo, só ficando atrás da de Suécia, Noruega e Dinamarca. As empresas têm de cumprir 97 obrigações contábeis - a um custo médio, em 2011, de 1,5% de seu faturamento.

- As empresas gastam muito nas chamadas informações parafiscais, que são obrigadas a enviar à Receita - diz Mendonça de Barros, acrescentando que já haveria aumento de competitividade se o Fisco simplificasse as regras, mesmo sem mexer na carga tributária.

Recentemente, o governo anunciou um pacote de concessões que prevê o investimento de R$ 133 bilhões em ferrovias e rodovias federais. Para o professor Carlos Arruda, da Fundação Dom Cabral, parceira do Fórum no estudo de competitividade, tudo dependerá da execução:

- Nos últimos anos, houve projetos fantásticos que não foram implementados.

Boa parte dos projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está atrasada por falta de licenciamento ambiental ou indícios de irregularidades. Em 2011, o investimento brasileiro em infraestrutura cresceu apenas 2%, a R$ 173 bilhões, segundo a Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).

Na área da educação, há um problema emergencial: faltam engenheiros e profissionais com formação em ciências. Mas o grande desafio é aumentar a qualidade do ensino fundamental.

- Coreia do Sul e China cresceram com investimento na educação - diz Arruda. - Mas o avanço nessa área demora uma geração.