Título: Combater as milícias em várias frentes
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Fonte: O Globo, 03/10/2012, Opinião, p. 24

Dois movimentos recentes do poder público dão a medida da preocupação das autoridades com a cada vez mais visível atuação de grupos paramilitares. E com razão. O primeiro foi a sanção da presidente Dilma Rousseff à lei que altera o Código Penal, para tipificar os crimes de formação de milícia. O projeto, aprovado na Câmara dos Deputados, estende os efeitos do novo artigo do CP à dosimetria das punições aplicadas a integrantes desses grupos, aumentando em um terço as penas para quem for condenado por ligação com esse tipo de quadrilha.

O segundo sinal de que as autoridades observam com inquietação a movimentação de bandos milicianos, particularmente no Rio, onde eles atuam com mais desenvoltura, foi a criação de uma ampla força-tarefa, a partir do Tribunal Regional Eleitoral fluminense, e, agora, a chegada de tropas militares para garantir a segurança de eleitores e candidatos em áreas de atuação de milícias. O problema, de fato, é gravíssimo e justifica as providências. E não só estas.

A tipificação do crime de formação de milícias era medida que se impunha já há algum tempo. Os grupos paramilitares são um fenômeno relativamente recente na criminalidade do país. Em razão disso, não havia na legislação dispositivos explicitamente apropriados para fazer frente a essa nova forma de ameaça à sociedade. A mudança no Código Penal é importante passo nessa direção.

Por sua vez, a criação da força-tarefa pelo TRE-RJ, logo no início da campanha eleitoral, e a chegada de tropas militares ao Rio são ações pontuais, ditadas pela inequívoca tentativa dos grupos paramilitares de influir no resultado das eleições. Eleger candidatos clara ou veladamente comprometidos com as milícias não é um projeto novo. Há evidências substanciais de infiltração de milicianos nos partidos - não só pela prisão de vereadores e deputados eleitos em pleitos passados, mas pela desenvolta movimentação desses grupos para sufragar seus representantes em currais notoriamente por eles controlados.

Mas, embora fundamentais, ações desse tipo não são suficientes para conter o crescimento das milícias. De acordo com levantamento da Secretaria de Segurança do Rio, elas já controlam 184 áreas no estado, mais que o dobro de favelas sob jugo da maior facção do tráfico de drogas em ação em território fluminense.

É crucial que o combate a esses grupos se estenda a outras frentes. Caso, por exemplo, da fonte de recrutamento dos integrantes das quadrilhas, preferencialmente entre agentes públicos de segurança - a chamada banda podre das polícias. Providências como uma radical depuração das corporações e a criação de mecanismos de admissão de novos quadros, refratários aos acenos do crime, também são inevitáveis. E urgentes, pois as milícias são uma crescente ameaça ao estado de direito.