Título: Congresso do Uruguai torna aborto até 12 semanas legal
Autor: Campodonico, Matilde
Fonte: O Globo, 18/10/2012, Mundo, p. 42

Com esperado aval do presidente Mujica, país será 2º da América Latina a despenalizar prática

Como já fizera em 2008, o Congresso do Uruguai aprovou ontem projeto de lei despenalizando o aborto no país. Só que desta vez o texto não será vetado pela Presidência, tornando o Uruguai o segundo país latino-americano, após Cuba, a legalizar a prática para todos os casos. O texto defendido pela governista Frente Ampla, autorizando a interrupção voluntária de gestações até o terceiro mês, já havia passado pela Câmara em setembro e foi aprovado ontem pelo Senado com 17 votos a favor e 14 contrários.

Em 2008, o então presidente Tabaré Vázquez vetou a despenalização, mas seu sucessor, José Mujica, já anunciou que sancionaria o projeto caso ele fosse aprovado no Congresso.

- Com esta lei, entramos na lista de países desenvolvidos que, em sua maioria, adotaram critérios de liberalização e reconheceram o fracasso das normas judiciais que tentam impedir os abortos - comemorou o senador Luis Gallo.

A prática era proibida desde 1938 no Uruguai e constituía um crime passível de penas que variam entre três e nove meses de prisão para as mulheres e até dois anos para quem o praticasse. Hoje, as estimativas indicam que, por anos, até 30 mil abortos são realizados ilegalmente no país de pouco mais de 3 milhões de habitantes.

Com a nova lei, a gestação poderá ser interrompida até a 12ª semana, desde que a mulher expresse tal desejo e passe pela avaliação de um grupo de profissionais. Um ginecologista, um psicólogo e um assistente social darão à gestante, então, um prazo de cinco dias para refletir sobre a decisão final. Num dos pontos controversos do texto, menores de 18 anos também terão direito ao aborto sem a necessidade de autorização dos pais - bastará apenas o aval de um juiz.

OPOSIÇÃO QUER REFERENDO

Uma pesquisa recente da consultoria Cifra indica que 52% dos uruguaios são favoráveis à despenalização, e 34%, contrários. Mesmo assim, a tensão acerca da iniciativa já era vista no próprio plenário do Senado. Enquanto nas galerias, antes da votação, defensores da medida aplaudiam as explanações dos oradores, a oposição protestava, colérica.

- Não vamos compactuar com isso. Somos do partido da liberdade e da defesa dos direitos humanos. É um projeto centralista, de escritório, impraticável - atacou o senador Jorge Larrañaga, do opositor Partido Nacional.

Ele fez, ainda, um apelo à população uruguaia:

- Conto com a confiança dos cidadãos para governar a partir de 2015, quando vamos derrubar esta lei.

Outro opositor do Partido Nacional, o deputado Pablo Abdala, foi mais longe e disse que a legenda vai trabalhar pela convocação de um referendo popular sobre o tema. E prometeu que, em um ano, vai conseguir as assinaturas de 25% dos colegas para tal.

- Uma decisão dessa magnitude não pode ficar nas mãos de uma maioria ocasional, por maior que seja. Deve ser submetida ao veredito popular - alfinetou.

PROTESTOS DOS DOIS LADOS

Organizações não governamentais protestaram em frente ao Senado. Também houve resistência entre grupos favoráveis, como o "Coordenação pelo Aborto Legal", que veem "exigências demasiadas" para a interrupção da gravidez.

Espera-se que Mujica sancione rapidamente a lei despenalizando o aborto de fetos saudáveis - permitido na América Latina, além de Cuba, apenas na capital mexicana.