Título: No Rio, 460 mil eleitores votam vigiados por tropas
Autor: Castro, Juliana; Araújo, Vera; Ramalho, Sérgio
Fonte: O Globo, 07/10/2012, País, p. 16

Combate a currais eleitorais e compra de votos marcou campanha

O rigor da Lei da Ficha Limpa, denúncias de currais eleitorais, práticas assistencialistas e compra de votos deram o tom desta campanha eleitoral. No pleito de hoje, cerca de 460 mil eleitores de 28 comunidades do Rio sob influência das milícias ou do tráfico vão às urnas protegidos por um forte esquema de segurança. O reforço de tropas federais foi articulado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) para garantir que os moradores dessas favelas - quase 10% do colégio eleitoral da capital - não se sintam obrigados a eleger candidatos ligados a facções criminosas.

Seis mil integrantes do Exército e da Marinha ocupam essas comunidades. No restante do estado, há cerca de 50 mil homens, somando os policiais, reforçando a segurança. Campos, Magé, Rio das Ostras, Macaé , Itaboraí, São Gonçalo e Cabo Frio receberam apoio de tropas federais. O objetivo é garantir que os eleitores não sejam aliciados nem se sintam acuados na hora do voto. Essas regiões foram previamente mapeadas pelos setores de inteligência que integram o Centro de Controle e Comando das Eleições 2012. A estrutura, aberta pelo presidente do TRE-RJ, desembargador Luiz Zveiter, centraliza todas as informações sobre a segurança do pleito.

Aliás, é justamente nestas áreas, do tráfico e das milícias, que alguns políticos montaram seus centros sociais, muitas vezes, pagando a grupos criminosos pelo espaço:

-O TRE foi proativo diante de práticas nefastas de alguns políticos em manter centros sociais e currais eleitorais. Conseguimos inibir as ações. Não podíamos admitir que traficantes e milicianos dessem as cartas. A prisão de pessoas que fazem boca de urna será outra página na história das eleições. Fatos como esses denegriam o processo. Todo mundo sabia que isso acontecia, mas ninguém combatia. A população se sentia órfã - disse Zveiter.

- Esse assistencialismo acontece em todos os estados. No Rio Grande do Sul, por exemplo, há albergues para pessoas que vêm do interior, financiados por políticos. No Rio, vimos essa prática no Complexo da Maré, em favelas da Zona Oeste, e em cidades como São Gonçalo. Para o eleitor, interessa menos que o Estado se faça presente. Para ele, o importante é que seu benfeitor continue com aquela mão estendida para ele. O eleitor não se dá conta de que é refém dos maus políticos - analisou o coordenador do 5º Centro de Apoio Operacional das Promotorias Eleitorais do Rio, Rodrigo Molinaro Zacharias, lembrando que o Ministério Público mapeou 200 centros sociais no Estado do Rio.

Barrados na Ficha Limpa

Não é possível fazer um balanço preciso do número de candidatos barrados com base na Lei da Ficha Limpa, já que alguns tribunais regionais eleitorais não têm ainda este levantamento. Mas, dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dão a dimensão da abrangência da regra: 45% dos 6.535 recursos de registro de candidatura que chegaram à Corte até sexta-feira eram relativos à nova legislação.

No Rio, a nova lei barrou até prefeitos que tentam a reeleição, como Rafael Miranda (PP), de Cachoeiras de Macacu; e ex-prefeitos que querem voltar ao cargo, como Mario Tricano (PP), de Teresópolis; e Carlos Rogério dos Santos, o Rogério do Salão (PR), de Queimados. Entre enquadrados pela Lei da Ficha Limpa e barrados por outros motivos, há 23 candidatos a prefeituras no Estado do Rio que estão com o registro indeferido ou cassado e ainda esperam por uma decisão do TSE.O eleitor pode escolher hoje o político indeferido mas, se o tribunal negar a candidatura dele posteriormente, o voto será anulado. Essa indefinição da Justiça Eleitoral fez com que candidatos desistissem do pleito. Somente entre a semana passada e a última sexta-feira, seis deles renunciaram à disputa por prefeituras no estado.

Na primeira campanha eleitoral com as novas regras, o TSE analisou questões que abriram jurisprudência para a aplicação da lei.

- O TSE entendeu que os dirigentes de empresas que fizeram doações de campanha acima do limite legal, no futuro, estarão inelegíveis. Já decidiu também sobre a inelegibilidade decorrente de atos de improbidade administrativa. Enfim, acho que os pontos mais difíceis foram enfrentados - explicou a vice-procuradora-geral eleitoral, Sandra Cureau.

Recentemente, o tribunal decidiu que o órgão competente para julgar as contas de prefeitos é a Câmara, o que cria jurisprudência para que não sejam barrados candidatos que, na qualidade de prefeitos, tiveram contas reprovadas pelos tribunais de contas dos municípios e dos estados. A vice-procuradora entrou com recurso no Supremo Tribunal Federal para mudar essa decisão.

- Esse entendimento compromete a eficiência da Lei da Ficha Limpa na medida em que retira do órgão técnico a apreciação das contas de gestão e a coloca no órgão político - opina o procurador regional eleitoral do Rio, Maurício da Rocha Ribeiro.