Título: Nos portos, gasto de R$ 1,5 bi a ver navios
Autor: Bottari, Elenilce; Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 20/10/2012, Economia, p. 43
Empresários reclamam da burocracia estatal e demora da Marinha em homologar obras. Governo nega.
Com o governo prestes a lançar novo pacote para investimentos em portos e aeroportos, empresários do setor alertam que os problemas vão muito além da falta de recursos. Maior legado da Secretaria Especial de Portos, o Programa Nacional de Dragagem, que já consumiu R$ 1,5 bilhão em investimentos e tem previsão de gasto total de R$ 2,4 bilhões até 2014, apesar de ter saído do papel, ainda não trouxe ganhos para o país. O motivo? Os empresários reclamam da demora da Marinha em homologar obras, algumas concluídas há um ano e, assim, navios maiores não podem atracar nos terminais. Segundo eles, só o Porto de Recife foi homologado.
A Marinha contesta e diz que, além de Recife, homologou novas profundidades de canais de acesso dos portos de Rio, Salvador, Angra e Itaguaí. Por este cálculo, porém, faltariam ainda nove homologações. Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec), Sérgio Salomão, a burocracia estatal provoca atrasos e custos para empresários e governo:
- Os navios trabalham com cartas náuticas, nas quais, entre os valores dos portos, está a profundidade. Como os novos calados ainda não foram homologados, eles têm que trabalhar com os valores antigos, sendo obrigados a fazer operações especiais mais demoradas e com mais rebocadores. É dinheiro jogado fora.
Setor de contêineres avança 10% ao ano
Enquanto a homologação anda em marcha lenta, o setor de contêineres cresce cerca de 10% ao ano, diz a Abratec. Ano passado, a movimentação de contêineres nos portos brasileiros alcançou 8.247.156 TEUs (medida padrão do setor, que se refere a um contêiner de 20 pés). Diretor-executivo do Centronave, Cláudio Loureiro garante que o maior problema não é a falta de investimentos e sim de "procedimentos". A entidade reúne as 27 maiores empresas de navegação no setor de contêiner, responde por 75% das exportações marítimas, em valor, e 98% das cargas em contêineres de importação e exportação. Para ele, se a Marinha entende que, apesar da dragagem, ainda há restrição para homologação, então as pendências devem ser resolvidas:
- Os navios entram na baía na velocidade de 11 nós, os rebocadores alcançam até sete nós. Do que adianta a Marinha determinar operação especial com dois rebocadores no lugar de um, se eles só alcançarão o navio quando este estiver chegando ao terminal? E para que mais de um prático (profissional que conduz a embarcação no acesso ao porto)?
"Navios são 24h, mas o governo é burocrático"
Segundo Loureiro, órgãos públicos agem de forma isolada, sem se preocupar com os custos:
- Na maioria dos países, as autoridades se juntam para fazer uma única visita a bordo. No Brasil, cada um vai em horário diferente.
Um empresário lembra que há diversos grandes portos no Brasil em que a fiscalização da Receita sequer funciona no fim de semana. Em muitos, os fiscais da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) atuam só de 9h às 18h, inviabilizando ganhos de eficiência:
- Os portos e os navios são 24 horas, mas os governos são burocráticos - disse um empresário, que pediu para não ser identificado.
Em nota, a Diretoria de Portos e Costas da Marinha diz que só "os LH (laudo de homologação) de Rio Grande, Suape, Fortaleza e Santos (trecho 2) encontram-se em análise. Os dados dos portos de São Francisco do Sul, Natal, Itajaí, Suape (Canal Externo) e Santos (trechos 3 e 4) ainda são aguardados". Já a Secretaria Especial de Portos (SEP) afirmou, em nota, que o objetivo do Programa Nacional de Dragagem foi cumprido. "A SEP tentou nivelar e agilizar os procedimentos juntamente com a Marinha. Hoje todos estão bem encaminhados", afirmou, sem dar prazos para a conclusão da homologação.
Sobre a burocracia da fiscalização, a SEP disse que estuda meios para unir os órgãos públicos, citando o programa Porto Sem Papel, já implementado em 22 terminais. "Antes mesmo de o navio chegar ao porto, o sistema já libera, identifica a carga, identifica a tripulação".