Título: Micheletti revoga estado de sítio
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 06/10/2009, Mundo, p. 21

Presidente interino defende punição de quem tirou Manuel Zelaya do poder

O presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, cedeu ontem à pressão da comunidade internacional e do presidente deposto, Manuel Zelaya, para iniciar o diálogo que busque o fim da crise política: revogou o estado de sítio decretado desde 27 de setembro. ¿Assim como tomamos a decisão de estabelecê-lo, assim faremos para derrogá-lo¿, disse Micheletti ao Canal 5 de Honduras. Ele ainda admitiu que há uma semana e meia representantes de seu lado e de Zelaya já estão conversando. ¿Vamos no bom caminho¿, afirmou o presidente interino. Numa iniciativa inusitada, ele chegou a defender, em entrevista coletiva, a punição de quem articulou a deposição de Zelaya da presidência do país, em junho passado. ¿Estou totalmente seguro de que (os responsáveis) serão levados aos tribunais, como corresponde a qualquer erro cometido¿, afirmou.

A crise política institucional em Honduras completou ontem 100 dias, desde a destituição de Zelaya em 28 de junho. Esta semana, o país aguarda com ansiedade o diálogo que deve ser travado entre o presidente deposto e o interino. Quatro pontos fundamentais deverão ser abordados na discussão: a restituição de Zelaya à presidência, o reconhecimento do processo eleitoral, a anistia para os delitos políticos e a convocação de uma Assembleia Constituinte. De todos os temas, a presidência continua sendo a pedra no sapato dos negociadores:(1) Zelaya não abre mão de voltar ao cargo, o que Micheletti prefere que não ocorra.

Micheletti se esquivou ontem de responder se aceitaria ou não a restituição de Zelaya como chefe de Estado e de governo do país. ¿É uma aspiração do senhor Zelaya que teria de ser escutada agora com melhores argumentos legais¿, disse, acrescentando que se trata de uma decisão que não corresponde ao Executivo. ¿Teria de ser colocada para o Supremo Tribunal de Justiça¿, argumentou. O presidente interino afirmou que 90% dos hondurenhos não querem o retorno de Zelaya ao poder.

Os grupos políticos também estão divididos sobre os principais itens da negociação. A União Cívica Democrática (UCD) não aceita perdoar os 18 crimes políticos que Zelaya é acusado de ter cometido durante seu mandato. Já os seguidores do presidente deposto, que ainda não constituem um partido político, insistem na necessidade de uma nova Constituinte, ideia rejeitada pela maioria dos partidos.

Eleições As eleições estão marcadas para 29 de novembro e correm o risco de não serem reconhecidas pela comunidade internacional, que exige o retorno de Zelaya à presidência do país. Analistas políticos hondurenhos têm levantado três cenários possíveis para resolver a crise. Na primeira hipótese, as duas partes reconheceriam as eleições presidenciais, passariam o poder para uma terceira pessoa, os crimes políticos seriam julgados apenas no próximo mandato e aceitariam realizar uma consulta popular sobre a constituição. Na segunda, as eleições seriam reconhecidas, Zelaya não retornaria ao poder, mas receberia uma anistia pelos delitos políticos. Já no último cenário, ambos aceitariam a legitimidade do sufrágio, a devolução do poder a Zelaya sob vigilância internacional e a inclusão da consulta sobre a constituinte.

Para o presidente da Costa Rica, Óscar Arias, que tem atuado diretamente na mediação da crise hondurenha, ¿o pior que pode acontecer é que não haja um clima de tranquilidade para poder levar a cabo o devido processo eleitoral¿. Ele teme que não haja ¿esse clima de tranquilidade e de paz, a comunidade internacional não reconheça o vencedor das eleições e continuemos isolando Honduras do resto do mundo, transformando-a em uma Albânia centro-americana¿.

1- Local seguro Zelaya defendeu que a embaixada do Brasil tem a segurança necessária para a assinatura de um acordo. ¿A sede diplomática da República Federativa do Brasil em Tegucigalpa proporciona o marco de segurança nacional e internacional para a assinatura desse acordo¿, destacou, em comunicado divulgado ontem. O presidente deposto também ressaltou que a representação brasileira ¿garante transparência e imparcialidade, assim como respeito à integridade física, direitos constitucionais e à vida do presidente eleito pelo povo hondurenho¿.