Título: BC dobra aposta nos juros e inflação
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Fonte: O Globo, 20/10/2012, Opinião, p. 16

O Banco Central, há um ano, fez uma aposta ousada - e ganhou. A inflação chegara a furar o teto de 6,5% da meta, e, mesmo assim, o Copom decidiu abrir um ciclo de corte dos juros básicos - de 12,5% para 12%, até chegar aos 7,25% atuais, um mergulho vertiginoso. Antes de muito analista, o BC detectou sinais de agravamento da crise mundial, a partir da Europa, fator de redução de pressões sobre os preços internos. Deu certo.

O BC, sob a direção de Alexandre Tombini, conquistou confiança do mercado e afastou temores de que a imprescindível autonomia operacional da instituição havia sido reduzida ou cassada. Não é que o último corte da Selic tenha ressuscitado todos aqueles fantasmas. Porém, na conjuntura interna em que foi executado, voltou a colocar alguns pontos de dúvidas sobre a convicção do BC no enfrentamento dos ventos inflacionários que se armam no horizonte. Oportuna, de qualquer forma, a referência feita na ata desta última reunião do Copom, divulgada quinta-feira, aos efeitos maléficos da inflação sobre a economia. Não custa lembrar. Mas a decisão do último corte foi tão polêmica que três dos oito diretores do BC votaram contra a redução. O presidente Tombini se alinhou ao bloco dos que optaram pela redução.

Algumas variáveis da atual conjuntura são inquietantes. A começar pela própria inflação, que roda além dos 5%, mais de meio ponto percentual acima do centro da meta. Faz pensar se o governo, em nome de "um pouco mais de crescimento", não estaria revendo informalmente a política de metas. Seria desastroso, pelo fato de a economia ainda manter perniciosos mecanismos de indexação. O BC, porém, segundo a ata do Copom, continua firme na convicção dos efeitos desinflacionistas da conjuntura externa, além de creditar as atuais pressões a fatores episódicos externos (quebra de safras nos EUA devido à seca). Não é de todo errado.

Em entrevista a "O Estado de S. Paulo", o economista Carlos Geraldo Langoni, ex-presidente do BC, diretor do centro de estudos da economia mundial da FGV, fez alertas a serem levados em conta. Ele considera que os juros reais (descontada a inflação) estão "exageradamente baixos" (2% a 3%). Um poderoso estímulo ao crescimento, que se soma a tantos outros de origem fiscal e creditícia, sem falar nos ganhos salariais claramente acima dos aumentos de produtividade, turbinados por um mercado de trabalho aquecido. Pode, então, estar sendo gerada nas profundezas da economia brasileira uma pressão inflacionária tsunâmica. Por isso, Langoni considera que o BC enfrentará grande teste em 2013, quando aflorarem os efeitos de todos estes estímulos, e se souber se a nova aposta do banco terá sido ou não certeira.

Serão conhecidos o alcance da autonomia do banco no governo Dilma e a profundidade da fé da equipe econômica na política do tripé - meta de inflação, câmbio flutuante (parece congelado em R$ 2) e superávit primário (efetivo, não maquiado pela "contabilidade criativa").