Título: Teto flexível criticado
Autor: D'Elia, Mirella
Fonte: Correio Braziliense, 07/10/2009, Política, p. 3

Decisão do TCU que dá brecha a salários acima de R$ 25,7 mil está longe de ser unânime

Especialistas e magistrados condenaram ontem a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que permite o pagamento de salários a parlamentares que, somados a aposentadorias, ultrapassam o teto do funcionalismo público de R$ 25,7 mil ¿ o que recebem os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ouvidos pelo Correio, ministros do Supremo disseram que o inciso XI do Artigo 37 da Constituição, que trata do teto, é autoaplicável. E que, portanto, não é necessário haver regulamentação, como prevê o parecer do relator do processo no TCU, Augusto Nardes. Para Marco Aurélio Mello, a norma é ¿abrangente¿ e ¿expressa¿: ¿O preceito é elucidativo: nada fica de fora. O objetivo da última emenda que alterou esse inciso (da Constituição) foi ter não um teto fictício, lírico, romântico ou passível de drible, mas um teto efetivo¿, disse. ¿Ninguém gosta de ser sem-teto. Nesse caso, alguns gostam¿, completou, com ironia. Na avaliação dele, o tema pode acabar na mais alta Corte de Justiça do país.

Em julgamentos recentes, o ministro do STF Carlos Ayres Britto tem ressaltado que o texto original da Constituição de 1988 já previa que o teto é autoaplicável, o que foi referendado pela Emenda Constitucional nº 45, a chamada reforma do Judiciário. ¿O teto é para valer, não pode haver sobreteto. O teto já é o limite¿, afirmou Britto, que preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Diretora-geral do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC), com sede em São Paulo, Maria Garcia concorda. ¿A proibição é geral. A falta de regulamentação não pode permitir que se extrapole o que a Constituição proíbe. Isso é um problema do Congresso. Enquanto isso, eles ganham acima do teto¿, criticou.

Para o professor de direito constitucional da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Blair, a interpretação do TCU é ¿equivocada¿. ¿O texto constitucional pode carecer, em determinados pontos, de especificidade maior. Mas, quando se está diante de normas como a fixação de um limite salarial, não há o que se indagar. Se o teto não vier para ser limitador e ficar pendente de regulamentação, não serve para nada¿, disse.

Constituição O limite para os vencimentos de funcionários públicos dos três poderes foi fixado pela Constituição Federal. Atualmente, somente magistrados que também lecionam ou que recebem gratificação por exercer função eleitoral podem receber mais. No entanto, em resposta a uma consulta feita pela Câmara, o TCU decidiu que é preciso regulamentar o que diz o texto constitucional e implantar um sistema nacional de dados sobre a remuneração de servidores da ativa e aposentados para seguir a regra.

Estima-se que a decisão poderá beneficiar dezenas de parlamentares do Congresso. Os presidentes da Câmara, Michel Temer (PT-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP), por exemplo, acumulam os proventos com aposentadorias de outros órgãos e recebem acima do teto.