Título: Nova data muda até concurso
Autor: Mariz, Renata; Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 07/10/2009, Brasil, p. 7

Universidades alteram dias dos vestibulares, e seleções para IBGE e Receita também são modificadas. Unicamp desiste de usar nota do teste

A mudança no calendário do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2009 provocou efeito cascata nos vestibulares pelo país. É que a nova data coincide com diversos vestibulares de instituições públicas e privadas, e pelo menos quatro universidades confirmaram que vão alterar o dia da aplicação da própria prova. Dois concursos públicos: o da Receita Federal e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) também sofrerão alterações. Já a Universidade de Campinas (Unicamp), em São Paulo, desistiu de usar a nota do Enem este ano, depois que a prova foi adiada pelo vazamento das informações. A medida, prevista no edital, foi tomada ontem pela Comissão Permanente para os Vestibulares (Comvest). A justificativa é de que as notas do exame não estarão disponíveis até 30 de novembro e, por isso, não haverá tempo hábil para contabilizar os valores.

Na Unicamp, o Enem iria compor apenas a nota da primeira fase e equivaleria a, no máximo, 20% do valor. Os outros 80% são relativos à própria prova do vestibular. Em nota, a Unicamp minimizou o impacto da decisão e garantiu que os candidatos podem ficar tranquilos. Não haverá qualquer alteração nas fichas de inscrição.

Outras duas importantes instituições de ensino ¿ a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual Paulista (Unesp) ¿ informaram que vão se reunir nos próximos dias para discutir as mudanças. O calendário do vestibular, segundo a assessoria de imprensa, é decidido conjuntamente pelas instituições. O exame da Unesp está marcado para a mesma data do Enem.

Prejuízo Outros processos seletivos afetados foram o da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), o da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e o da Fundação Getulio Vargas (FGV). Em nota, a Uerj informa que, ¿caso o MEC confirme a realização da prova do Enem em 5 e 6 de dezembro, a Uerj apresentará nova data para a sua segunda fase sem prejuízo para os candidatos inscritos¿. Já a UFSC disse que, apesar de o exame não ser etapa obrigatória no processo seletivo, a Administração Central da instituição irá se reunir hoje para avaliar as providências que serão tomadas referentes às novas datas do Enem, que coincidem com o vestibular. A Fundação Getulio Vargas (FGV) ainda avalia se haverá mudanças. A decisão deve sair nos próximos dias.

O pró-reitor de graduação da Universidade Federal de Juiz de Fora, Eduardo Magrone, considerou ¿delicadíssima¿ a situação dos candidatos que vão prestar o vestibular e mostrou-se decepcionado com a decisão do Ministério da Educação (MEC), que reagendou para o 6 de dezembro o Enem. ¿Não há um clima propício para mudanças num processo tenso por natureza¿, disse o pró-reitor. A decisão da UFJF de alterar a data da primeira etapa será tomada na semana que vem em reunião extraordinária do Conselho Setorial de Graduação. Ontem, o reitor Henrique Duque esteve com Fernando Haddad e alertou ao ministro que não cabe a ele a palavra final sobre uma eventual modificação no calendário. ¿Apesar de toda turbulência, acreditamos no Enem como alternativa ao processo seletivo. Mas será necessário recuperar a credibilidade do exame, que ficou muito abalada¿, assinalou Magrone. Em Minas, além da UFJF, a nova data coincide com vestibulares do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet-MG), da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) e da PUC Minas.

Mudança Candidatos com problema de distância do local de prova no Enem vão poder fazer a solicitação de mudança de endereço ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) a partir de hoje. O prazo termina na meia-noite da próxima quarta-feira, 14 de outubro. O serviço está disponível em um link no site do Inep: www.inep.gov.br.

Colaborou: Ricardo Beghini

Crimes têm penas de até 27 anos

Ullisses Campbell

São Paulo ¿ Depois de indiciar cinco pessoas ¿ embora ninguém tenha sido preso ¿, a Polícia Federal encerrou ontem o inquérito que apurou como ocorreu o vazamento da prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) que seria aplicada no fim de semana passado. Para os agentes federais, não resta a menor dúvida: o grande responsável pelo crime é o capoeirista Felipe Pradella, de 32 anos. Foi ele quem teve a ideia de pegar dois exemplares da prova para vender. A primeira foi retirada por um funcionário da esteira da impressão da gráfica Plural em 21 de setembro e entregue ao capoeirista. A segunda prova foi obtida da esteira pelo próprio Pradella, que teria escondido o exemplar na cueca.

A Polícia Federal estuda ainda a possibilidade de fazer uma reconstituição com os cinco acusados no parque gráfico da Plural para mostrar com detalhes como ocorreu o furto da prova. ¿Pradella já pegou a prova com a intenção de ganhar dinheiro fácil¿, disse o delegado de Repressão a Crimes Fazendários de São Paulo, Marcelo Sabadin Baltazar.

O capoeirista responderá por crimes de peculato e violação do sigilo funcional, além de extorsão. Para piorar a situação, o acusado ainda ameaçou de morte a repórter do jornal O Estado de São Paulo que teve contato com ele por causa da publicação de sua foto no jornal. ¿Para não cumprir a ameaça, ele pediu R$ 10 mil à jornalista¿, disse Baltazar.

Pradella foi contratado por uma semana pelo Instituto Cetro, que faz parte do Consórcio Nacional de Avaliação e Seleção (Connasel), responsável pelo processo de produção e de distribuição do Enem. Pelo contrato inicial, ele seria encarregado da segurança, mas acabou sendo aproveitado na tarefa de fazer a conferência e lacrar as caixas com as provas.

Além de Pradella, foram indiciadas outras quatro pessoas que participaram do esquema: o empresário Luciano Rodrigues, 39 anos, o DJ Gregory Camillo de Oliveira Craid, 26 anos, e os funcionários da gráfica Felipe Ribeiro, 21 anos, e Marcelo Sena, 20 anos. Os acusados responderão aos processos em liberdade porque não houve flagrante. O crime de peculato tem pena de 2 a 12 anos de prisão, o de quebra de sigilo de 2 a 5 anos e o de extorsão, de 4 a 10 anos.

Ribeiro e Sena negaram que tinham interesse em lucrar com o furto das provas. No depoimento que os dois funcionários da gráfica prestaram à PF, eles disseram que as provas foram furtadas apenas para dar um grande furo jornalístico para a imprensa. Para o Superintendente Regional da Polícia Federal de São Paulo, Fernando Duran Poch, a simples intenção de furtar uma prova para dar um furo para a imprensa não passa de uma estratégia de defesa. ¿Todos cinco assumem que estiveram com a prova na mão, mas todos eles negam o interesse financeiro¿, ressaltou o policial.

O inquérito da PF concluiu que o esquema de segurança da gráfica é falho, já que nenhum dos dois funcionários foram revistados quando saíram do local com uma cópia da prova. Poch disse ainda que a PF vai preparar um relatório detalhando as falhas do sistema de segurança para evitar fraudes em outros concursos públicos.

Em nota, o diretor-geral da gráfica Plural, Carlos Jacomine, voltou a dizer que o esquema de segurança do local é rigoroso e atribuiu a responsabilidade ao Instituto Cetro. Segundo ele, se as provas foram furtadas da esteira da gráfica, uma das câmeras teria registrado a ação. Jacomine disse ainda que a logística da operação após a produção das provas e a segurança não era de responsabilidade da Plural.

Mutirão para evitar falhas

Renata Mariz

Homens do Exército e da Força Nacional de Segurança Pública poderão ser chamados para agir em qualquer etapa do processo de aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), remarcado para dezembro após o vazamento de dados no primeiro processo. O ministro da Educação, Fernando Haddad, ainda não decidiu se o apoio dos órgãos será necessário. Ele aguarda o resultado de um estudo elaborado pela Polícia Federal apontando quais os pontos mais vulneráveis da logística envolvidos na aplicação do teste e como saná-los.

O consórcio das empresas que organização o Enem, formado pelo Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe) em parceria com a Fundação Cesgranrio, também acatará as determinações dos agentes federais. Com a tarefa de distribuir as avaliações e recolhê-las para correção, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos montará uma operação especial, nos moldes da que é feita para movimentação das urnas eletrônicas durante as eleições.

Haddad afirmou ter conversado informalmente com o Tribunal de Contas da União (TCU) e com a Corregedoria Geral da União (CGU) para se certificar de que as instituições envolvidas podem ser utilizadas na aplicação dos testes. Embora a participação das empresas organizadoras e dos Correios já estejam acertadas, Haddad afirmou que o Ministério da Educação não fechou ainda valores com os órgãos para a contratação dos serviços. O primeiro processo rendeu um prejuízo ao MEC de R$ 38 milhões, já que o valor foi gasto, mas o Enem, anulado.

O que cabe a cada um no novo processo

Inep Já tem a prova pronta, digitalizada, em um cofre, numa sala cercada por câmeras. De lá, o teste digitalizado segue para impressão, que pode ser numa gráfica contratada pelo consórcio Cespe/Cesgranrio ou até num serviço terceirizado diretamente pelo MEC.

Polícia Federal Fará um mapeamento de todo o processo para apontar os pontos vulneráveis. Já se sabe que a gráfica é um grande nó na questão da segurança. A PF não atuará com homens na aplicação das provas. A ideia é trabalhar na retaguarda, apontando soluções para as brechas.

Correios A Diretoria de Operações já trabalha no desenho de um modelo específico para fazer a distribuição e o recolhimento das provas. O contrato prevê o sigilo de carga. Classificado como uma operação especial, segue os moldes do que ocorre com as urnas eletrônicas e com cartões de crédito.

Consórcio O Cespe e a Fundação Cesgranrio estudam, com técnicos do Inep, a melhor maneira de aplicar o Enem depois das fraudes. Responsável pela aplicação dos testes nos últimos três anos, o consórcio pretende usar os métodos tradicionais de organização mais as solicitações que serão feitas pela PF.

Força Nacional de Segurança Pública e Exército Homens dos dois órgãos poderão ser requisitados em qualquer etapa do processo. Sob o comando da Polícia Federal, neste caso específico, a Força está de prontidão, assim como o Exército, liderado pelo Ministério da Defesa, que ofereceu o apoio do seu contingente ao MEC ainda no fim de semana.