Título: México avança na América Latina
Autor: Carneiro, Lucianne
Fonte: O Globo, 28/10/2012, Economia, p. 52
Economia mexicana cresce mais que o dobro do Brasil e mostra tentativa de se aproximar da região
Com uma previsão de crescer mais que o dobro do que a economia brasileira este ano, o México passou a fazer parte de um novo bloco - a Aliança do Pacífico, que reúne ainda Colômbia, Chile e Peru - e busca se aproximar da América Latina, num momento em que o Mercosul se vê às voltas com disputas entre o Brasil e a Argentina e a entrada da Venezuela. O avanço na América Latina, no entanto, não deve significar mudança na prioridade da política externa mexicana voltada para os Estados Unidos, apontam especialistas.
Depois de um tombo de 6% na economia em 2009 - a reboque da crise que atingiu os Estados Unidos e o mundo -, o México voltou a crescer em ritmo forte, com a ajuda de exportações de manufaturados, na esteira da recuperação americana. A economia mexicana cresceu 5,5% em 2010, 3,9% em 2011 e deve registrar alta de 3,8% este ano, segundo projeção do Itaú Unibanco. É mais do que o dobro da expansão de apenas 1,54% estimada para o Brasil em 2012 pelo Boletim Focus do Banco Central.
- Historicamente o México cresce menos que outros países da região, mas depois de 2009 a economia vem crescendo bem, com a exportação de manufaturados para os Estados Unidos. O peso mexicano depreciou e ajudou o país a ficar mais competitivo - afirma o economista do Itaú Unibanco João Pedro Bumachar.
Aliança diplomática
Neste ambiente de expansão econômica, o novo presidente, Enrique Peña Nieto, assume o cargo em dezembro e já demonstrou seu interesse na região com o giro que fez por aqui em setembro e o anúncio de que o Brasil será um dos primeiros países a visitar, já comandando a segunda maior economia latino-americana.
- O novo governo deve manter uma política de um discurso mais aberto com a América Latina, o que ajudará a justificar a mudança de governo. Acredito que Peña Nieto vai tentar retomar uma liderança do México na região, ainda que não acredite em diferença tão grande - afirma o professor do Departamento de Economia da Universidad Autónoma Metropolitana (UAM) Arturo Guillén.
O professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília Roberto Goulart Menezes concorda que há uma tentativa de Peña Nieto de se voltar para a América Latina, após quase 20 anos de relações mais fortalecidas com os Estados Unidos por causa da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), de 1994.
Alguns analistas, no entanto, são mais cautelosos em relação às ambições do México com a América Latina. Para o coordenador do Grupo de Análise de Conjunturas Internacionais (Gacint) da USP e sócio da Prospectiva Consultoria Ricardo Sennes, há no fundo uma tentativa de retomada de espaço político regional do México, mas ele não acredita em disputa por liderança nem disputa econômica.
- No nível diplomático, pode haver uma disputa de México e Brasil, mas do ponto de vista concreto os países estão correndo em raias diferentes. São as duas maiores economias da região, mas com perfis e estratégias econômicas muito diferentes - diz Sennes.
Na opinião do professor da Unesp Tullo Vigevani, há uma tentativa do México de se aproximar da América Latina, mas sem busca de liderança nem mudança do foco nos Estados Unidos:
- Os governos mexicanos estabeleceram desde os anos 90 que a prioridade das relações com exterior são os Estados Unidos e a Aliança do Pacífico não muda esta tendência.
O novo bloco da América Latina é visto por analistas principalmente como um esforço diplomático para se contrapor à Aliança Bolivariana para as Américas (Alba), que reúne Venezuela, Cuba, Equador, Bolívia, Nicarágua, Dominica, Antígua e Barbuda e São Vicente e Granadinas.
- A Aliança do Pacífico é mais um movimento político simbólico para afirmar temas gerais como a abertura econômica e se contrapor à Alba. É um acordo com viés mais diplomático - avalia Sennes.
- Não vejo a Aliança do Pacífico como uma nova força no continente - complementa Roberto Goulart Menezes.
Relações com a China
Na mira da Aliança do Pacífico estão as relações com a China, gigante asiático que tem reorganizado as relações no continente latino-americano. O México tem se adaptado a esse novo ator no mercado internacional, que foi visto inicialmente apenas como um grande concorrente.
- O México em certa medida tem se beneficiado do aumento do protecionismo dos Estados Unidos aos produtos chineses. Alguns investimentos têm ido para o México para acessar o mercado americano com a Alca - afirma Tullo Vigevani.
Mais recentemente, com o aumento do custo de trabalho na China, já há empresas voltando a considerar o México como uma alternativa para se estabelecer uma plataforma de exportação. Um dos principais obstáculos para esse movimento, no entanto, é o aumento recente da violência.
- É difícil imaginar que a questão do tráfico não contamine a percepção de estabilidade política e econômica do México. Não é fácil mensurar, mas tem algum impacto na economia - diz Sennes.
A realidade, aponta Arturo Guillén, é que algumas regiões do Norte do país - onde se localizam as chamadas indústrias "maquiladoras" - estão sob controle de narcotraficantes, o que preocupa investidores.
- A violência está afetando a imagem internacional do México - afirma Menezes.