Título: Para ministro, mensalão poderá ajudar no combate à corrupção
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: O Globo, 08/11/2012, País, p. 4

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA O ministro-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, disse ontem que o julgamento do mensalão prestará "enorme ajuda" no combate à corrupção no Brasil, caso a postura adotada pelo Supremo Tribunal Federal seja seguida pelo Judiciário em todo o país. Mas o ministro fez questão de ressaltar que o julgamento está fugindo ao padrão da Justiça do país, insinuando que, se fossem na primeira instância as supostas inovações adotadas pelo STF no caso, seriam anuladas por um tribunal superior.

- Se isso acontecer, não tenho dúvida alguma que será uma enorme ajuda para o combate à corrupção. Agora, é preciso ver se vai ser igual para todos ou se foi apenas neste caso excepcionalíssimo que isso aconteceu. Vamos aguardar para ver - afirmou Hage, após a abertura da 15ª Conferência Internacional Anticorrupção.

Para o ministro, ainda é cedo para saber que efeitos o julgamento do mensalão produzirá. Como juiz aposentado, ele contou ter ouvido de colegas que, se dessem sentenças nos moldes das decisões proferidas pelo Supremo, elas seriam reformadas no dia seguinte pela instância superior:

- Os juízes brasileiros não estavam acostumados com determinadas posturas e orientações que a Suprema Corte assumiu agora. Em que medida isso vai se espraiar por todo o Judiciário, com que rapidez e em que medida vamos conseguir que a legislação processual seja alterada a modo de que processos comuns que começam no primeiro grau possam chegar ao fim no Brasil, temos que esperar para ver.

fora dos padrões

Hage destacou que o caso é visto pela comunidade internacional como exemplo da independência do Poder Judiciário. O ministro enfatizou o caráter de excepcionalidade do julgamento, classificando de relativamente rápida, para os padrões brasileiros, a tramitação da ação. Os sete anos entre o surgimento da denúncia e o veredicto no STF foram um recorde no Brasil, segundo Hage, que diz esperar o mesmo tratamento para outras ações.

- O Brasil tem um dos piores sistemas processuais do mundo, com um sistema de recursos com características remanescentes da Idade Média - criticou Hage.

Ele apontou o estranhamento da comunidade internacional com os prazos e possibilidades recursais na Justiça. Segundo o ministro, o STF inovou com "posicionamentos novos", como a teoria do domínio do fato, a validade de provas na fase pré processual e a não exigência de atos de ofício.

prazo recorde

O presidente da conferência internacional, Barry O"Keefe, afirmou que um prazo de sete anos para um processo seria "inimaginável" em seu país, a Austrália.

- Três anos já seriam um escândalo. Vale a pena o Brasil rever esse sistema de apelação - afirmou Okeefe.

A presidente da ONG Transparência Internacional, Huguette Labelle, também criticou o excesso de recursos.

- Os processos nunca chegam ao fim e acusados são capazes de comprar a liberdade - disse Labelle.

Aos participantes da Conferência Internacional Anticorrupção, durante um painel sobre o fim da impunidade, Hage citou a ação penal julgada pelos ministros do STF. Ele voltou a dizer que o prazo de sete anos para o desfecho da ação é "recorde" no Brasil e que isso só ocorreu em razão do foro privilegiado de alguns réus.