Título: Depois do curral, a banca do crack
Autor: Alves, Maria Elisa
Fonte: O Globo, 01/11/2012, Rio, p. 23
Nova cracolândia, e já a maior da cidade, tem ponto de venda de pedras e fila
Não é difícil achar a mais nova (e já a maior) cracolândia da cidade. Na Avenida Brasil, basta olhar, na altura da Ilha do Governador, para a Avenida Brigadeiro Trompovsky, para enxergar um muro azul, todo pichado, com cerca de um quilômetro de extensão. É ao longo dele, que termina num descampado com poucas árvores, que têm se reunido diariamente quase 300 usuários da droga, consumida a céu aberto e, ontem, a poucos metros de um carro de polícia. Além de enorme, a cracolândia também exibe outro superlativo: é a mais violenta do Rio. Na última segunda-feira, equipes da Secretaria municipal de Assistência Social foram recebidas a pedradas.
Assim que chegaram ao local, assistentes sociais e psicólogos conseguiram conversar com alguns usuários. Mas, em poucos minutos, tiveram que sair às pressas: pedras voavam em direção aos carros. Drogados, homens e mulheres faziam ameaças com estiletes e facas de cozinha, mesmo na presença de policiais militares. Na confusão, alguns consumidores de crack correram em direção à Favela Parque União, ao lado. Acabaram expulsos de lá, não se sabe se por traficantes, com pedras e pedaços de pau.
- Foi um horror. Nunca tínhamos enfrentado situação parecida - disse um dos agentes que participaram da ação.
O local já era há algum tempo um ponto de encontro de usuários de crack, mas ganhou fôlego nos últimos dias. Para o endereço migraram os usuários expulsos pela pacificação do Jacarezinho, os mesmos que tentaram transformar o espaço entre tapumes da Transcarioca, na entrada da Ilha, em ponto de consumo.
Venda da droga aumenta
A quantidade cada vez maior de usuários de crack - até passarelas na Avenida Brasil foram ocupadas por viciados - tem feito fervilhar o comércio da droga no local. Ontem, era possível ver uma banca improvisada de venda de pedras de crack. Diante dela, usuários, um deles de muletas, faziam fila. Também floresce de vento em popa na região a venda de copos de água, a R$ 0,50 cada. Como mostrou ontem o RJ TV, da Rede Globo, não é a sede que move os usuários: eles compram a água para usar os copos descartáveis como cachimbo para queimar a droga. Por alguns centavos a mais, usuários se oferecem para fazer a adaptação.
A Secretaria de Assistência Social informou que deve voltar ao local na próxima semana. Na segunda-feira, agentes conseguiram recolher 20 adultos e cinco adolescentes, que procuraram a equipe de forma voluntária.
Segundo a secretaria, o Rio tem cerca de três mil usuários de crack, mas as estimativas do Ministério Público são bem mais altas: cerca de seis mil pessoas. Há atualmente 716 vagas para internação e tratamento de usuários, mas a prefeitura tenta ampliar a rede e ter mais 600 novas vagas.
A secretária de Assistência Social, Fátima Nascimento, reuniu-se ontem com promotores do Ministério Público, que, anteontem, haviam dito ser ilegal a ideia do prefeito Eduardo Paes de internar compulsoriamente adultos usuários. Em nota, a secretaria disse que "o modelo de internação involuntária estudado pela prefeitura em parceria com o Ministério da Saúde terá todo o respaldo legal, inclusive com consulta ao MP".