Título: Freio nos investimentos
Autor: Bonfanti, Cristiane; Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 12/11/2012, Economia, p. 17

Governo gastou só 44% do total autorizado para projetos este ano, menos do que em 2011

máquina enferrujada

BRASÍLIA Na contramão do discurso a favor do crescimento, o governo da presidente Dilma Rousseff não está conseguindo avançar em um componente chave para estimular a economia. Dados do Tesouro Nacional mostram que, entre janeiro e setembro, o governo gastou R$ 45,2 bilhões ou 44% do total de R$ 102,3 bilhões autorizados pelo Congresso Nacional para investimentos. Proporcionalmente, o valor pago foi menor do que o despendido no mesmo período do ano passado: R$ 36,6 bilhões, ou 46,7% de um total autorizado de R$ 78,5 bilhões. Uma análise dos dados mostra que, do total efetivamente pago no acumulado nos nove primeiros meses do ano, a maior parte - R$ 30,3 bilhões - são aos chamados "restos a pagar", despesas de exercícios anteriores executadas este ano. Ou seja, do orçamento de 2012, foram gastos apenas R$ 14,8 bilhões ou 14,5% do total aprovado pelo Congresso.

Na avaliação de especialistas, quando não realiza os investimentos previstos, o governo contribui para o ambiente de desconfiança e para o pífio resultado não apenas da indústria - que caiu 3,8% em setembro com relação ao mesmo mês do ano passado - mas também dos investimentos do setor produtivo como um todo. Para o diretor presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luís Afonso Lima, se o governo tivesse um desempenho melhor, haveria algum "alento", principalmente no setor da construção civil. Segundo ele, o ambiente de negócios no Brasil não está favorável e a situação não deverá mudar em 2013, porque os riscos externos permanecem elevados.

- A chance de termos mais um voo de galinha em 2013 é grande. Talvez não tenhamos uma retomada dos investimentos como espera o governo - disse Lima, acrescentando que falta ao Executivo capacidade e agilidade para investir de forma a atrair o empresariado.

Segundo o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, os números dos investimentos federais refletem, além de problemas políticos, a dificuldade dos ministérios de implementar os projetos, mesmo com dinheiro disponível. Ele observou que, como este é o segundo ano da gestão Dilma, o resultado deveria ser melhor.

- Geralmente, no primeiro ano de mandato, o governo segura os investimentos para arrumar as contas. Mas o segundo ano deveria mostrar recuperação - afirmou ele.

pac em retomada, diz ministro

Juntos, os ministérios dos Transportes, Integração Nacional e Cidades - responsáveis pelas obras de infraestrutura do país, que permitem à economia crescer sem pressionar os preços de bens e serviços - executaram 52,2% da dotação de R$ 42,5 bilhões autorizada pelo Congresso. Na prática, isso significa que eles só têm os meses de outubro, novembro e dezembro para executar os outros 47,8%.

O resultado só não foi pior devido ao fato de o Ministério das Cidades ter executado, incluindo os restos a pagar, 75,53% da dotação de R$ 17,9 bilhões aprovada para o ano. Os dados computam, no entanto, os gastos com o programa Minha Casa, Minha Vida, antes considerados despesas de custeio, mas reclassificados para turbinar os investimentos públicos. Na Integração Nacional, apenas 33,98% dos investimentos foram executados até setembro. Nos Transportes, carro-chefe da área de infraestrutura, 35,64%.

planejamento tem o pior desempenho

O ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, disse que o ritmo dos investimentos efetuados pelo ministério dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já está em fase de retomada acelerada, depois de um período que reconhece ter sido complicado. No caso da Valec, estatal responsável pelas ferrovias, por exemplo, o investimento em 2010 foi de R$ 1,271 bilhão. Em 2011, ano da "faxina" do setor (quando o então ministro Alfredo Nascimento e os presidentes da Valec e do Dnit foram afastados do governo sob suspeita de corrupção), o investimento caiu para R$ 856 milhões. Este ano, até o mês de setembro, foram executados R$ 621 milhões em investimentos.

Segundo ele, no caso do Dnit, no meio do ano, o investimento estava muito baixo, na faixa dos R$ 500 milhões ao mês. Entretanto, em agosto, setembro e outubro, já foram registrados desembolsos acima de R$ 1 bilhão.

- Eu apanhei muito, porque diziam que o desempenho estava baixo, mas estamos recuperando terreno e nos aproximando do ritmo de investimentos dos anos anteriores - disse o ministro.

O Ministério das Cidades disse que, do total de R$ 17,9 bilhões aprovados, já empenhou R$ 12 bilhões. Informou que os desembolsos ocorrem à medida que as obras são executadas, caso contrário haveria irregularidades. O Ministério da Integração Nacional não respondeu ao pedido de informações até o fechamento desta edição.

Na análise da execução do orçamento por órgão, o Ministério do Planejamento teve o pior desempenho, com 4,56% de despesas pagas. Depois vêm Comunicações, com 12,82%; e Cultura, com 14,64%. O Ministério da Cultura disse que tem uma execução "excelente" e, referindo-se a números que vão além dos investimentos, informou que pagou este ano 97% dos R$ 660 milhões liberados pelo Tesouro até o momento. O Ministério das Comunicações também disse que a execução encontra-se "compatível com o planejamento orçamentário e financeiro" do órgão, especialmente em função de grandes licitações que estão em andamento, como de implantação de cidades digitais.

O Ministério do Planejamento informou em nota que, a cada ano, o governo tem ampliado o espaço orçamentário para investimentos. Como a execução é plurianual, os pagamentos podem ser feitos no ano seguinte ao empenho, o que gera os "restos a pagar":

"Além de ampliar o espaço fiscal, o governo vem realizando cada vez mais investimentos, que este ano cresceram 23% em relação ao ano passado".