Título: Pressão em 2010
Autor: Bancillon, Deco; Verdini, Liana
Fonte: Correio Braziliense, 09/10/2009, Economia, p. 12

Indicadores econômicos começam a comprovar que Banco Central pode ser obrigado a elevar taxa de juros para conter inflação causada por forte consumo.

A impressão é de que alguns setores querem criar as condições para um aumento dos juros no próximo ano. Isso é indevido e deve-se combater esta tendência¿ Guido Mantega, ministro da Fazenda

A combinação de resultados positivos na área econômica deu corpo a um novo debate entre governo e mercado financeiro: o de que o fortalecimento do consumo neste e no próximo ano deverá se traduzir em aumento dos juros em 2010. Entre os analistas, há temor de que os gastos do governo, aliados ao superaquecimento do mercado de trabalho e à retomada da indústria, produzam pressão inflacionária que obrigue o Banco Central a operar com mais rigor a política monetária.

A lógica do mercado é de que, ao crescer acima de 5% em 2010, a economia brasileira produzirá riquezas em escala maior que a demanda, abrindo espaço para uma alta nos preços dos produtos. ¿Três grandes áreas definem a inflação, sendo que duas delas, os preços administrados (contas de água, luz e telefone) e os preços livres (vestuário e alimentos), tendem a ficar dentro da meta no próximo ano. Mas ainda há um risco grande de a inflação ficar maior por conta dos serviços, que tendem a acompanhar o mercado de trabalho¿, lembra o economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa.

Números do Ministério do Trabalho não param de surpreender positivamente o mercado. Nos últimos sete meses, o saldo entre demissões e admissões ficou positivo em seis ocasiões, sendo que, em agosto, registrou-se recorde histórico para o mês, com 242,1 mil contratações formais. ¿Nossa projeção para o mercado de trabalho é de 850 mil contratações neste ano. Para 2010, acreditamos que deverão ser criados 1,6 milhão de empregos formais¿, diz o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges.

O economista Cristiano Souza, do Banco Santander, lista outros fatores que tenderão a vir melhores no próximo ano, mas que deverão pressionar o consumo doméstico. ¿O crédito está melhorando, o mercado de trabalho está sólido e o crescimento econômico já é certo. Mas acreditamos que o maior temor de inflação será mais para 2011, o que fará com que o Banco Central tenha que começar a olhar mais para esse problema já no começo de 2010.¿ Seriam quatro altas na Selic a partir de julho, fazendo com que a taxa básica atinja 9,75% até dezembro.

Para o Banco ABC Brasil, o crescimento econômico em 2010 acima dos 5% e a manutenção do consumo como pilar da economia deverão fazer com que o amargo remédio dos juros altos seja dado ao Brasil mais cedo do que se imagina. ¿Esperamos que as primeiras altas venham já entre abril e julho. E a nossa projeção é de que essa dose necessária fique entre 2 e 2,5 pontos percentuais a mais em 2010¿, opina o economista-chefe da instituição, Luís Otávio de Souza Leal.

Resposta

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que há setores da economia brasileira se precipitando e apostando em alta dos juros de longo prazo para 2010, conforme sinalizam as taxas no mercado futuro. ¿A impressão é de que alguns setores querem criar as condições para um aumento dos juros no próximo ano. Isso é indevido e deve-se combater esta tendência¿, declarou.

Mantega afirmou que o governo mantém a projeção para a economia brasileira em 2010, de crescimento de 5% no ano. ¿Com isso, não há qualquer fator de pressão inflacionária.¿ Mas ressaltou que alguns analistas estão carregando em suas interpretações, acreditando que a economia estaria mais aquecida do que o previsto. A afirmações foram feitas após a solenidade do 8º balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

EMPREGOS NA INDÚSTRIA A recuperação da indústria e o fortalecimento da demanda doméstica continuam pressionando positivamente o emprego. Em agosto, a geração de carteiras assinadas na indústria avançou 0,3% ante julho, na comparação com ajuste sazonal. É a segunda vez no ano que o indicador mostra resultado positivo na comparação mês a mês. No acumulado do ano, porém, o emprego industrial recuou 5,5%.¿São resultados positivos, sobretudo porque temos vindo de quedas muito fortes¿, diz a economista Denise Cordovil, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Gás puxa inflação

Fortemente influenciado pelo preço do gás de botijão, que subiu 3,40%, a inflação oficial do país sofreu uma aceleração no mês passado. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) subiu de 0,15% em agosto para 0,24% em setembro. O gás chegou a aumentar 7,79% na região metropolitana de São Paulo, mas recuou 0,18% em Brasília e 0,21% em Salvador. Outro item que registrou uma pressão para cima foram os gastos com empregados domésticos, que tiveram uma expansão de 1,15%. O indicador acumulado em 12 meses está em 4,34%, próximo ao centro da meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para este ano, que é de 4,5%.

A chegada às lojas da coleção primavera-verão fez os preços dos vestuários subirem 0,58%. Esse foi o segundo grupo de despesas que mais subiram no mês, superado apenas por habitação, em que são computados os pagamentos a empregados domésticos. Os outros itens com variações positivas mais relevantes foram os gastos pessoais (0,52%), saúde e cuidados pessoais (0,30%) e transportes (0,27%). O agregado de alimentação e bebidas, motivo de preocupação no ano passado, segurou um pouco o IPCA, com deflação de 0,14%. A principal contribuição negativa em todo o índice foi do leite pasteurizado, com queda de 8,76%. O feijão carioca caiu 6,17% e o feijão preto, 4,84%.