Título: Cachoeira ganha liberdade
Autor: Éboli, Evandro; Sassine, Vinicius
Fonte: O Globo, 21/11/2012, País, p. 3
Bicheiro, que estava preso há 9 meses, é condenado a 5 anos e passa ao regime semiaberto
BRASÍLIA Pivô de uma CPI que leva seu codinome, o bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi condenado ontem a cinco anos de prisão. Mas como a pena deve ser cumprida em regime semiaberto, a juíza Ana Cláudia Costa Barreto, da 5ª Vara Criminal de Brasília, que condenou o contraventor, expediu ontem mesmo um alvará de soltura. A partir de hoje, a Justiça terá que decidir onde ele vai ter que se apresentar todas as noites. No semiaberto, o condenado apenas dorme na prisão. Como o bicheiro tem residência em Goiás, o controle do cumprimento da pena pode ser transferido para uma vara de execução penal do estado.
Cachoeira foi condenado também a pagar 50 dias multa. O valor de cada dia multa estabelecido pela juíza foi de cinco salários mínimos. No valor de hoje, o montante atingiria R$ 155,5 mil. O bicheiro foi condenado por tentar fraudar o sistema de bilhetagem do transporte público de Brasília. Investigação da Operação Saint-Michel, da Polícia Civil do Distrito Federal, comprovou que ele tentou sustar a licitação para a contratação de um sistema de bilhetagem e assim se beneficiar desse cancelamento.
Para o advogado de Cachoeira, Nabor Bulhões, a decisão da juíza coloca o seu cliente em liberdade. Na sua interpretação, Cachoeira não terá que cumprir prisão em regime semiaberto. Ele entende que o bicheiro já cumpriu um sexto da pena e, mesmo que venha a ser condenado depois da ação transitar em julgado, Cachoeira seria beneficiado com o regime aberto. Ainda de acordo com Bulhões, a juíza entendeu que os crimes dos quais seu cliente é acusado são de médio poder ofensivo.
O bicheiro estava preso desde o final de fevereiro, como resultado da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, e também da Saint-Michel. No entanto, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) revogou a prisão baseada na Operação Monte Carlo. Ele foi transferido para a Papuda , em Brasília, em 18 de abril, após decisão do desembargador Tourinho Neto, do TRF-1. Cachoeira ficou em uma área destinada a presos da Polícia Federal (PF) na Papuda.
A juíza condenou Cachoeira a dois anos por formação de quadrilha e a três anos por tráfico de influência. Disse que o bicheiro pretendia enriquecer em detrimento do patrimônio público e que sua ação desrespeitou instituições democráticas. Ela considerou concurso material e somou as penas.
outra ação tramita em goiás
A Operação Saint-Michel foi deflagrada pela Polícia Civil do Distrito Federal, em parceria com o Ministério Público local, em 25 de abril deste ano, menos de dois meses depois da Operação Monte Carlo, a cargo da PF. Cachoeira já estava preso por conta das investigações sobre a corrupção de agentes públicos em Goiás, principalmente policiais militares, civis, federais e rodoviário federal, objeto da Monte Carlo. A operação da PF ainda acabou provocando a cassação do senador Demóstenes Torres (GO) e na instauração da CPI do Cachoeira no Congresso.
Após a revogação da prisão preventiva decretada pela Justiça Federal de Goiás na operação Monte Carlo, o bicheiro permaneceu detido por conta do outro mandado de prisão determinado pela Justiça do DF. A Saint-Michel resultou em prisões e cumprimento de mandados de busca e apreensão em Brasília, Goiás e São Paulo. Entre os presos estavam o ex-diretor da Delta Construções no Centro-Oeste Cláudio Abreu e um vereador em Anápolis (GO), cidade natal de Cachoeira. A Justiça expediu mandado de prisão para o ex-diretor da Delta em São Paulo Heraldo Puccini, que permanece foragido.
Segundo as investigações, o grupo de Carlinhos Cachoeira tentou fraudar licitação para prestação de serviço de bilhetagem eletrônica no transporte coletivo em Brasília. Aliados do bicheiro atuaram junto ao governo local para que a Delta saísse vencedora da licitação que viria a ser aberta.
Agora, a expectativa do Ministério Público Federal (MPF) em Goiás, responsável pela denúncia à Justiça decorrente da Operação Monte Carlo, é por uma nova condenação do bicheiro a pelo menos 50 anos de prisão na instância federal. O processo corre na 11ª Vara Federal em Goiânia.
As alegações finais elaboradas pela defesa do bicheiro foram protocoladas ontem na vara e sustentam que as interceptações telefônicas usadas na investigação são ilegais. Nabor Bulhões, advogado de Cachoeira, alega falta de provas dos crimes cometidos pelo bicheiro. Não é o que sustenta o MPF nas alegações finais: os procuradores da República relacionaram 17 eventos criminosos supostamente praticados pelo réu.
Os crimes apontados são formação de quadrilha armada, corrupção ativa e violação de sigilo. Para o MPF, houve concurso material dos fatos, ou seja, cada prática criminosa deve resultar numa pena. O MPF deve recorrer se a sentença do juiz Alderico Rocha determinar condenação inferior a 50 anos. Com a apresentação das alegações finais pela defesa de Cachoeira, a expectativa do MPF-GO é a de que a sentença seja proferida na primeira semana de dezembro. Até lá, Cachoeira fica em liberdade.