Título: Três são demitidos de agência reguladora após operação da PF
Autor: Carvalho, Jailton de ; Ribeiro, Marcelle
Fonte: O Globo, 28/11/2012, País, p. 4

E-mails apreendidos mostram que Vieira tinha trânsito livre na Antaq

Por determinação da presidente Dilma Rousseff, foram demitidos ontem três integrantes da direção da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq): o chefe de gabinete Ênio Soares Dias, o procurador Glauco Alves Cardoso Moreira e o ouvidor Jailson Santos Soares. Também por ordem da presidente, foi exonerado José Francisco da Silva Cruz, inventariante da extinta Rede Ferroviária Federal. Com isso, sobe para 13 o número de servidores afastados dos cargos desde o início da Operação Porto Seguro, da PF, na sexta-feira.

Deste grupo, 12 são investigados por suposto envolvimento com uma organização acusada de vender pareceres técnicos de áreas importantes do governo federal. Entre os demitidos ou afastados estão a ex-chefe de gabinete do escritório da Presidência da República Rosemary Nóvoa de Noronha; o ex-advogado-geral adjunto José Weber Holanda Alves; Paulo Rodrigues Vieira, ex-diretor da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil); e Rubens Carlos Vieira, ex-diretor da ANA (Agência Nacional de Águas).

Antaq: investigação interna

Na lista de demitidos está Mirelle Nóvoa de Noronha, filha de Rosemary, que era funcionária da Anac no Rio. O nome de Mirelle não aparece na lista de investigados. Mas ela teve que deixar o cargo depois da descoberta de que foi indicada para o cargo pela mãe, que está sob investigação de tráfico de influência.

Na lista de afastados constam ainda Esmeraldo Malheiros Santos e Márcio Barbosa Lima, funcionários do Ministério da Educação, e Lucas Henrique Batista, servidor dos Correios. No sábado, dia seguinte à deflagração da operação, a presidente determinou o afastamento de todos os servidores federais investigados.

O diretor interino da Antaq decidiu abrir uma investigação interna sobre os atos dos três ex-dirigentes da instituição colocados sob suspeita pela polícia.

Os e-mails de Paulo Vieira, apontado pela PF como chefe da quadrilha que fraudava pareceres para obter benefícios para empresas junto a órgãos federais, mostram que ele e outro indiciado no esquema, Carlos César Floriano, supostamente tinham trânsito livre e influência em fiscalizações feitas pela Antaq. Segundo o inquérito, como resultado, a Antaq teria se pronunciado favoravelmente à empresa Tecondi, que atua com contêineres no porto de Santos, em fiscalização realizada em 2011, por determinação do Tribunal de Contas da União em 2010.

Tecondi: vice é indiciado

O vice-presidente da Tecondi é Carlos César Floriano, que, assim como Paulo Vieira, foi indiciado pela PF. A Tecondi está no centro da denúncia que deu início à investigação. A empresa buscou a ajuda de Paulo Vieira pois era alvo de ação da TCU, que suspeitava que a companhia usava instalações portuárias que não estavam previstas na concorrência inicial feita em 1998 pela Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp).

A PF indiciou dois funcionários da Antaq pelo caso: o procurador Glauco Moreira e o chefe de gabinete Ênio Soares Dias. Paulo Vieira era ouvidor-geral da Antaq no período em que teria oferecido propina a um servidor do TCU para beneficiar a Tecondi.

"Paulo tem pleno conhecimento do funcionamento da Antaq e orienta como o itinerário do processo deve seguir na Antaq", afirma o procurador da República em São Paulo José Roberto Pimenta Oliveira, em documento do dia 8 de fevereiro de 2012.

Segundo o procurador, pareceres, despacho e relatório da Antaq estão "coordenadamente articulados para manutenção das áreas portuárias da Tecondi". Num dos e-mails rastreados pela PF, Paulo Vieira chega a dizer a pessoa identificada como "ouvidor da Antaq": "Não deixem os técnicos da Antaq escrever (sic) o que quiserem, pois pode comprometer todo o trabalho já feito".

E-mails rastreados pela PF mostram suposta troca de favores entre Paulo Vieira e Ênio Dias, o chefe de gabinete, acusado de ter encaminhado documento sigiloso a Vieira. Em mensagem de 4 de agosto de 2011, Ênio envia cópia de resolução que a Antaq só publicaria no dia seguinte no Diário Oficial da União, sobre o contrato de arrendamento de área portuária em Santos entre a empresa Tecondi e a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp). Vieira teria pedido a ajuda de Ênio e de Glauco para defender os interesses do ex-senador Gilberto Miranda junto à Antaq. Miranda seria representante de uma empresa do setor portuário que desejava obter licença de uso privativo de um terminal no porto de Santos (SP).