Título: Missão da OEA fracassa
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 09/10/2009, Mundo, p. 18

Chanceleres deixam o país sem obter um acordo para pôr fim à crise. Líder interino promete que eleição vai ocorrer no dia marcado, mas Zelaya desmente

A novela hondurenha se arrasta com o desfecho de mais um capítulo infeliz. Os chanceleres da Organização de Estados Americanos (OEA) voltaram ontem para casa sem conseguirem encontrar uma saída para a disputa pelo poder entre o presidente deposto, Manuel Zelaya, e o interino, Roberto Micheletti. Deixaram uma mesa de diálogo montada para que os interlocutores de ambas as partes conversem e acertem os ponteiros sobre a Declaração de San José, proposta de mediação redigida pelo mandatário da Costa Rica, Oscar Arias.

Mas as negociações continuam travadas em torno da restituição de Zelaya ao governo do país e da realização das eleições de 29 de novembro. ¿A comunidade internacional deve atuar com firmeza, porque Micheletti quer ficar mais tempo no poder¿, anunciou Zelaya na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, onde se abriga desde 21 de setembro. ¿Há maus augúrios, está comprovado que não há (boa) vontade deste regime, que quer fazer eleições a sangue e fogo, ao estilo do Afeganistão¿, completou. A comunidade internacional afirma unanimemente que não reconhecerá o governo que ganhar as eleições, caso Zelaya não seja restituído ao poder antes.

John Biehl, delegado chileno na OEA, avaliou a situação como ¿complicada¿. ¿Se Zelaya não voltar, há movimentos sociais que não permitirão as eleições de novembro, que poderiam ser militarizadas, violentas e quem for eleito não terá governabilidade¿, declarou o diplomata à rádio hondurenha Cooperativa. Na noite de quarta-feira, José Miguel Insulza, secretário-geral da OEA, reuniu-se com o presidente deposto e insistiu no diálogo. ¿Temos que dialogar, tem que haver um acordo, as partes têm que aceitar, seguir conversando¿, disse o diplomata.

Garantia Por sua vez, Micheletti garantiu aos delegados da OEA que as eleições ocorrerão na data prevista. ¿A não ser que nos ataquem ou que nos invadam, é a única forma de deter as eleições¿, disse, irritado. O líder interino assegurou que só deixará o poder se Zelaya se abstiver de voltar ao governo, em resposta ao plano de Arias ¿ a proposta inclui a restituição condicionada de Zelaya, deposto em 28 de junho; a formação de um governo de reconciliação nacional; uma anistia política e uma verificação internacional. Ainda não se pode prever qual será o acordo alcançado por ambas as partes, uma vez que até os ânimos entre os representantes de Zelaya mostraram-se distintos ontem. Pessimista, Juan Barahona, coordenador do Bloco Popular e da Frente Nacional contra o Golpe de Estado, reclamou que não havia nenhum avanço sobre os pontos do plano, pela ¿intransigência dos golpistas em não permitir a restituição de Zelaya ao poder, como exige o Acordo de San José¿.

Pela liberação da embaixada

O chanceler costa-riquenho, Bruno Stagno, destacou ontem que a missão da OEA pediu ao governo interino o restabelecimento de todas as garantias constitucionais para a manutenção do diálogo e a reabertura de todos os meios de comunicação em Honduras. ¿A missão solicitou também que se resolva o problema da Embaixada do Brasil e que sejam garantidas ao presidente Zelaya condições de vida e trabalho de acordo com sua alta dignidade¿, disse Stagno em um comunicado.

Na quarta-feira à tarde, o chanceler canadense na OEA, Peter Kent, afirmou que era preciso arrumar um lugar mais confortável para o presidente deposto. À noite, dentro da embaixada brasileira, o tema também foi levantado pelo chanceler de El Salvador, Hugo Martínez. Os delegados da OEA avaliaram a possibilidade de liberar a representação brasileira do hóspede presidencial e conseguir que Zelaya fique em sua casa em Tegucigalpa, mas com imunidade diplomática ¿ a proposta deve ser recusada tanto pelo governo interino, que busca julgar Zelaya por crimes atribuídos a ele, como pelo próprio líder deposto, que teme ser morto.

Em entrevista a jornais brasileiros, a vice-chanceler interina de Honduras, Marta Alvarado, fez duras críticas ao governo brasileiro e seu uso da representação diplomática para abrigar Zelaya. ¿O Brasil protegeu Zelaya, brindou uma carinhosa acolhida a 300 amigos seus. Desde a sacada da embaixada, ele iniciou sua campanha por `restituição, pátria ou morte¿. O Brasil infelizmente emprestou seu território para favorecer esse homem¿, reclamou. Marta disse ainda que o Brasil é um ¿país lindo¿, mas alertou aos brasileiros que ¿não se metam em Honduras¿. Desde a destituição de Zelaya em 28 de junho, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva mantém suspensas as relações diplomáticas com Honduras e a representação em Tegucigalpa permanece sem embaixador, mas sob o comando do encarregado de negócios, Francisco Catunda Rezende. (VV)