Título: Amplo domínio ruralista
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 15/10/2009, Política, p. 8

Bancada vence embate com ambientalistas e fatura principais cargos de comissão especial

É uma contradição. O país quer aparecer como quem trabalha por questões ambientais e deixa a formulação das leis sobre esse tema nas mãos dos ruralistas¿ Edson Duarte, líder do PV

À custa de muita polêmica e com a ajuda do PT, a bancada ruralista da Câmara conseguiu ontem instalar a comissão especial do Código Ambiental e garantir presença nos cargos mais importantes do grupo. Os ambientalistas tentaram evitar. Mas, como eram minoria, tiveram de jogar a toalha e se limitar ao papel de fiscalizadores dos trabalhos da comissão. Eles culpam o governo por ter se omitido e deixado que ¿ às vésperas de o país apresentar em Copenhague suas metas para a melhoria do meio ambiente ¿ os trabalhos sobre a reforma ambiental(1) fiquem nas mãos de parlamentares que são grandes produtores. ¿Acho uma contradição. O país quer aparecer como quem trabalha por questões ambientais e em uma hora importante como essa deixa a reformulação das leis sobre esse tema nas mãos dos ruralistas¿, afirma o líder do PV, Edson Duarte (BA).

A reclamação do líder se deve ao fato de que PV e PSol esperavam contar com a ajuda dos petistas para pressionar por divisão igual dos principais cargos. O PT, no entanto, preferiu se omitir. Apenas apoiou o nome de Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para a relatoria. Rebelo era o preferido da maioria, que acreditava no clima de acordo que a indicação poderia dar às decisões sobre os cargos. ¿O PT entendeu que deveria compor com a maioria. Foi uma grande negociação¿, diz o novo presidente da comissão, Moacir Micheletto (PMDB-PR). ¿O problema é que Aldo não é em nada neutro. Em alguns casos, ele já foi mais ruralista do que a própria bancada rural¿, contradiz Ivan Valente (SP), líder do PSol.

O presidente da comissão nega interferências em torno da composição da comissão, mas admite que a neutralidade governista ajudou a evitar atritos com os produtores. ¿Somos maioria e vamos trabalhar normalmente. Somos fiscalizados e vigiados pelos diferentes setores da sociedade¿, afirma Micheletto.

Valente, por sua vez, diz que é preciso ficar atento às principais metas dos ruralistas, como a redução de áreas de reserva legal. ¿Eles querem adaptar a lei aos próprios interesses. Diminuir as áreas destinadas à preservação é o primeiro passo¿, diz Valente.

CPI do MST Enquanto vibram com a vitória na comissão especial, os ruralistas travam outra batalha: a instalação da CPI do Campo, destinada a investigar os repasses federais ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), garante já ter assinaturas suficientes, mas diz que vai esperar por uma sessão do Congresso para apresentar o requerimento. Ontem, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), disse que convocará sessão conjunta somente se os líderes entrarem em acordo para votar outras matérias. Para pressionar Sarney, a oposição ameaça obstruir a pauta.

Tudo em um A comissão especial foi instalada para discutir o Projeto de Lei nº 1876/99, do ex-deputado Sérgio Carvalho, que propõe um novo Código Florestal em substituição ao atual (Lei nº 4.771/65). A proposta recebeu dezenas de outros projetos sobre o tema que tramitavam na Casa. O mais polêmico e o que desperta maiores divergências entre ambientalistas e ruralistas é o PL 5367/09, do deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), que institui o Código Ambiental Brasileiro e revoga o Código Florestal. Tal proposta significaria mudança completa das atuais regras e leis ambientais.

Memória Divergência acirrada

O confronto entre ambientalistas e ruralistas em torno da instalação da comissão especial do Código Florestal já dura meses, mas começou a se agravar em 29 de setembro. Por dois dias seguidos, os bate-bocas entre integrantes dos dois grupos adiaram a instalação da comissão. Os ruralistas articulavam para manter a maioria dos cargos decisivos. Os ambientalistas, em minoria, denunciavam a manobra.

No dia 30, a reunião foi encerrada às pressas, depois que o líder do PV, deputado Edson Duarte (BA), reclamou que seu partido não havia participado de acordo algum e contestou o anúncio de que o deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR) deveria ser eleito presidente. Na ocasião, Duarte questionou inclusive a pré-indicação de Sarney Filho (PV-MA) para ser um dos vices na comissão, alegando que a escolha não havia passado pela análise da legenda ambientalista.

Diante das pressões e dos indícios de que a maioria formada pelos ruralistas deveria mesmo liderar as discussões da comissão especial, o PV ameaçou diversas vezes abandonar os trabalhos como sinal de protesto. Acabou convencido pelos integrantes do Psol de que o melhor seria unir forças para exercer papel fiscalizatório dos atos dos ruralistas.