Título: Apelo à união chavista
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Fonte: O Globo, 11/12/2012, Mundo, p. 31

Presidente tenta evitar fragmentação de partido, após reconhecer piora de sua saúde

Caracas Enquanto Hugo Chávez desembarcava em Cuba para a quarta cirurgia contra o câncer que ameaça lhe encurtar o mandato, na Venezuela seus partidários tentavam dar sinais de união. O próprio presidente, em discursos durante o fim de semana, defendeu reiteradas vezes a união e alertou contra o que chamou de "intrigas", indicando preocupação com o risco de fragmentação da aliança política que lidera.

A piora de Chávez causou comoção entre seus aliados. Em Manágua, capital da Nicarágua, milhares fizeram vigília por sua saúde. Rafael Correa, presidente do Equador, cancelou compromissos e viajou a Havana para se encontrar com o venezuelano. A argentina Cristina Kirchner pediu a Deus "que devolva a saúde ao querido presidente Chávez", que "ajudou a Argentina quando ninguém a ajudava". O boliviano Evo Morales disse ter sentido "amargura" pela piora do estado de saúde de seu "irmão companheiro anti-imperialista e anticapitalista".

- Até a vitória sempre. Até a vida sempre! - disse Chávez, pouco antes de embarcar em Caracas, subindo as escadas do avião sem apoio.

Pelo Twitter, o ex-vice-presidente Elías Jaua contou ter dito a ele: "Vá e volte". Recebeu como resposta um "Claro que volto, Elías. Amém."

O presidente Raúl Castro recebeu o venezuelano na sua chegada à ilha ontem de manhã. A cirurgia deve ocorrer nos próximos dias, embora nenhuma data tenha sido divulgada. Chávez, que em duas ocasiões se disse curado da doença, anunciou a necessidade da nova operação no sábado em razão de uma reincidência do câncer contra o qual luta desde 2011. Na ocasião, admitiu pela primeira vez que poderia não cumprir o atual mandato, que termina em um mês, e tomar posse do próximo, em 10 de janeiro. Indicou, então, seu vice-presidente Nicolás Maduro como sucessor e herdeiro político.

Ontem, Maduro, que costuma ir com Chávez para Cuba, participou de uma inauguração em Miranda e pediu votos aos candidatos governistas para as eleições regionais de domingo.

- Até além desta vida vamos ser leais a Hugo Chávez - declarou, com voz embargada.

Caso Chávez abandone o cargo antes da posse ou nos primeiros quatro anos do próximo mandato, novas eleições deverão ser realizadas em um mês. O temor é que Maduro não consiga manter unidas as diversas correntes formadoras do chavismo, que vão da esquerda radical ao militarismo de direita. O retorno do presidente a Caracas para o pronunciamento de sábado foi visto como um passo para garantir tal coesão.

Na noite de domingo, horas antes de viajar de volta a Havana, Chávez promoveu a almirante-chefe Diego Morelo Bellavie, que assumiu o Ministério da Defesa em outubro, e tomou seu juramento para o cargo. Ele deixou claro que, embora não estivesse entregando o poder, delegava-o "às boas mãos" de Maduro - que o acompanhava na cerimônia. Alertou que "o inimigo espreita de fora e de dentro" e voltou a falar em união, palavra que usara várias vezes sábado:

- Só os peço mais uma vez, fortalecer a união. Não ceder à intriga - disse Chávez.

No próprio domingo, Molero já havia divulgado uma declaração de fidelidade "à sua pessoa (Chávez), à revolução e ao povo", acrescentando que as Forças Armadas garantiriam "com nossa vida a pátria socialista conquistada". O documento, porém, não menciona Maduro.

concorrentes de maduro declaram apoio

Um dos principais concorrentes do vice-presidente na disputa pela herança chavista é Diosdado Cabello, atual presidente da Assembleia Nacional. Militar reformado, ex-companheiro de armas do presidente, Cabello tem bom trânsito nos quartéis. Mas é menos bem visto pelas correntes esquerdistas do partido do que Maduro, que emergiu do movimento sindical. Ontem, citado pela TV Globovisión, Cabello veio a público dizer que Chávez viajou tranquilo porque dentro do PSUV não há intrigas.

Jaua, que cedeu lugar a Maduro ao deixar a vice-presidência para concorrer ao governo de Miranda, alertou para o risco de tentativas de "fragmentação do país" pela oposição. E garantiu "a disposição de todos deste corpo de candidatos, como do conselho de Ministros, para acompanhar (...) o vice-presidente Maduro a fim de garantir a estabilidade política, a paz na nação venezuelana" enquanto Chávez se trata.

Nos seus 14 anos à frente da Venezuela, Chávez orientou os vultuosos recursos do petróleo não só para as missões bolivarianas, destinadas à redução da pobreza, mas também à construção de uma rede de aliados estrangeiros na região. Sua saída significaria um pesado impacto econômico para nações como Equador, Cuba e Bolívia, beneficiadas por petróleo subsidiado, além de causar um vazio político para os governos ideologicamente próximos ao por ele denominado "socialismo do século XXI".

A recaída de Chávez fez dispararem os títulos da dívida venezuelana. A diferença de rendimento em relação aos títulos dos EUA caiu ao mínimo desde agosto de 2008.