Título: Haddad, o queridinho da turma
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 15/10/2009, Brasil, p. 12

Ministro passa no teste do Congresso, recebe elogios na Câmara e no Senado e quase nenhum questionamento. MEC fará campanha com atores como Wagner Moura e Selton Mello para recuperar a credibilidade do exame

Haddad na Comissão de Educação do Senado: auditoria interna do MEC vai apurar responsabilidades no caso

No centro da crise detonada com o vazamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o ministro da Educação, Fernando Haddad, saiu de duas audiências públicas no Congresso Nacional, ontem, melhor do que entrou. As sessões, onde tradicionalmente os convidados são questionados com veemência sobre o assunto em questão, foram recheadas de elogios à atuação de Haddad frente ao escândalo. A benevolência dos parlamentares vinha até dos que fazem oposição ao governo. O deputado Paulo Magalhães (DEM-BA), por exemplo, chegou a classificar Haddad como ¿uma coisa boa que o presidente Lula fez ao nosso país¿. ¿O ministério (da Educação) não tem nenhuma culpa nisso. Nós estamos plenamente satisfeitos com suas colocações¿, destacou Magalhães, dirigindo-se ao ministro, que foi aplaudido ao término da audiência pública na Câmara.

No Senado, a postura de cobrança veio de Marisa Serrano (PSDB-MS), que indagou sobre uma eventual falha do MEC no que diz respeito à elaboração do edital. Anotando os questionamentos apresentados pelos parlamentares, Haddad explicou que os dirigentes indicados politicamente não se envolvem nas compras e contratações de serviços. ¿Você não está lá para ditar critérios de licitação, pois isso é papel da máquina administrativa. Se um edital cai na mesa de um dirigente, levanta-se a desconfiança de interesses. Para isso, temos servidores de carreira, concursados, envolvidos nesses processos há muito tempo¿, esquivou-se o ministro. Segundo Haddad, o local de onde a prova do Enem foi retirada era um ambiente não previsto no plano logístico, que foi montado de última hora, dentro da gráfica, pelo consórcio(1) de empresas contratado ¿ e ¿aparentemente¿ sem o conhecimento do Instituto Nacional de Ensino e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável por elaborar o teste e acompanhar a execução da aplicação.

Interpelado novamente sobre a responsabilidade do MEC na contratação de um consórcio de empresas sem experiência e cercadas de denúncias, Haddad bancou o professor. Em tom característico, propondo um ¿exercício intelectual¿, recorreu a um exemplo hipotético de um viaduto construído por uma empreiteira, contratada pelo governo, que cai e mata pessoas. ¿No caso do Enem, ninguém morreu. Mas de quem seria a responsabilidade pelo viaduto que tirou vidas? Há um espaço que tem de ser investigado, sem dúvida, mas há um ponto a partir do qual é difícil atribuir responsabilidades ao contratante¿, ponderou. Quanto ao exame vazado, Haddad explicou que uma auditoria interna do MEC está apurando as responsabilidades, inclusive se o Inep foi informado sobre a montagem da tal área de manuseio da prova onde teria ocorrido o vazamento. No fim da investigação administrativa, de acordo com o ministro, a Advocacia Geral da União poderá demandar judicialmente os responsáveis para garantir o ressarcimento de cerca de R$ 40 milhões que foram gastos pelo MEC com a impressão das provas inutilizadas.

Campanha Numa demonstração de apoio a uma improvável candidatura de Haddad ao governo de São Paulo, cogitada pelo governo antes do escândalo do Enem, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) fez questão de ressaltar que o nome do ministro continua forte. ¿Como a inscrição para candidato depende do aval de 1% dos filiados, se algum filiado do PT quer que o ministro Fernando Haddad seja candidato ao governo de São Paulo, por favor, coloque o nome dele na lista¿, conclamou Suplicy. Sorrindo, Haddad desconversou. ¿Eu vou assinar a sua lista, senador¿, disse o ministro. Enquanto uma auditoria do MEC apura as responsabilidades civis, a Polícia Federal investiga os responsáveis no âmbito penal.

1 - O antigo e o novo Único participante da licitação que o MEC fez para contratar organizadoras que aplicassem o Enem 2009, o Connasel (Consórcio Nacional de Avaliação e Seleção) é formado por três empresas: Funrio, Instituto Cetro e Consultec. Depois do vazamento de dados, noticiado há 15 dias, o MEC cancelou o contrato. Agora, está fechando um novo contrato com outras duas empresas: o Cespe e a Fundação Cesgranrio.

"No caso do Enem, ninguém morreu. Mas de quem seria a responsabilidade pelo viaduto que tirou vidas?¿

Fernando Haddad, ministro da Educação

Time forte em cena

Depois do vazamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), uma campanha para recuperar a credibilidade do teste será feita pelo Ministério da Educação. A veiculação em rádio e TV, entre outras mídias, vai começar em novembro e seguirá até os dias da prova, remarcadas para 5 e 6 de dezembro depois da fraude com o primeiro exame. Entre os atores cogitados para estrelar a publicidade, estão Wagner Moura, Lázaro Ramos e Selton Mello ¿ todos com imagem positiva na sociedade. Quanto isso vai custar, o MEC ainda não anunciou, bem como o valor do novo contrato que está sendo costurado com as novas empresas que aplicarão o Enem, o Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe) e a Fundação Cesgranrio.

Segundo o ministro da Educação, Fernando Haddad, a campanha será importante para informar aos alunos os procedimentos corretos de preenchimento das questões, além de tirar outras dúvidas que pairem na cabeça dos estudantes. ¿Há pequenos cuidados, como verificar o CPF antes de assinar a folha de respostas, que nos ajudarão a ganhar agilidade na correção. Em um país onde há muitos homônimos, identificar a prova correta de alguém que assinou sem checar os dados pode levar dias. Nesse sentido, os alunos serão informados do que devem fazer para zelarem pelo Enem¿, disse o ministro durante audiência pública no Senado Federal ontem.

À meia-noite desta quarta-feira terminou o prazo para candidatos ao teste que quisessem trocar a cidade de realização da prova. O Instituto Nacional de Ensino e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) não soube informar quantos alunos já teriam solicitado a mudança até ontem. Os que desistirem da prova, segundo Haddad, terão o ressarcimento do valor da inscrição. Mas o ministro não sabe ainda como isso será feito. As regras só serão anunciadas depois que os testes forem aplicados. Não só os alunos, mas reitores também criaram resistência com o Enem como forma de ingresso nas instituições.

Caso de Ronaldo Tadeu Pena, reitor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que anunciou ontem a intenção de não usar a nota da avaliação proposta pelo MEC nem no vestibular de 2011. A maior instituição de ensino superior do estado foi a única, entre as 11 federais de Minas, a não dar seu voto de confiança ao Enem.

Concursos Haddad defendeu, durante as duas audiências públicas das quais participou, que seja criado um centro de excelência em aplicação de concursos públicos no país. ¿Temos o Cespe, que é da Universidade de Brasília, a ESAF (Escola de Administração Fazendária) e o ENAP (Escola Nacional de Administração Pública), todas com grande experiência no ramo. Digo isso porque, nas conversas que tivemos em função do Enem, percebemos que as tentativas de fraude ocorrem em todos os concursos. E como não podemos abrir mão desse instituto, que avalia o mérito, no país, precisamos torná-lo menos vulnerável¿, disse o ministro. (RM)