Título: Congresso muito além dos royalties
Autor: Ordoñez, Ramona; Coelho, André
Fonte: O Globo, 21/12/2012, Economia, p. 45

O Supremo não proibiu o Congresso de derrubar o veto da Presidente na lei de royalties. Apenas exigiu que o faça obedecendo normas regimentais internas por ele mesmo estabelecidas. Por que esta decisão? Por três motivos principais.

Primeiro, a constituição diz que os poderes são independentes. Se o Supremo decidisse sobre vetar ou não, estaria se intrometendo na competência de outro poder. Afetaria a independência do Congresso. O Supremo respeitou-a.

Segundo, o Congresso exerce sua independência ao estabelecer seu regimento interno. Sozinho, decide seu processo, mas tem de respeitar direitos e garantias fundamentais. O atual regimento respeita, e foi feito com independência.

Terceiro, ao estabelecer seu regimento, o Congresso compromete-se consigo mesmo, com os demais poderes, e sobretudo com o eleitor, a obedecê-lo. Estar no estado democrático de direito é justamente isto. Agir dentro das balizas das normas. Assegura-se o mínimo de previsibilidade. Não pode agir ou decidir com base na negociação do dia. Acordo de líderes, votações simbólicas, prioridades de votação podem. Mas só se o regimento não tiver previsto outro rito. Se não, não. No caso, previa.

O regimento do Congresso é uma auto limitação de interesse não apenas do próprio Congresso. É garantia democrática das minorias parlamentares, dos partidos políticos e sobretudo dos eleitores. Acabamos de ver como é importante o Supremo exercer seu poder com base em regras. Por que com o Congresso seria diferente? Se o Congresso não respeita suas próprias regras, que segurança o cidadão terá de que sua liberdade está garantida?

Ou o Congresso obedece suas próprias regras. O que não foi possível no caso do veto, dada a cultura de não cumprir prazos ou a ordem de votação prevista. Ou as muda. Tem toda a independência para fazê-lo. Mas terá que obedecer as regras em vigor de mudança de seu regimento. Qualquer casuísmo poderá ser impugnado como inconstitucional.

A decisão do ministro Fux, se confirmada pelo plenário, poderá se aplicar a todo o processo legislativo. Pode abrir caminho para que o Congresso reveja a si mesmo. Estabeleça normas mais transparentes e previsíveis. E as obedeça. É uma hora grave para os parlamentares, muito além dos royalties. É hora de se aperfeiçoar como instituição democrática. Se o fizer, só terá a ganhar em confiança dos eleitores. Do contrário estará cada dia mais exposto ao controle da cidadania, através do Supremo.