Título: Aprovação de pacote não tira EUA do risco de abismo fiscal
Autor: Barbosa, Flávia; Cabral, Renata
Fonte: O Globo, 03/01/2013, Economia, p. 20

A aprovação do pacote emergencial pelo Congresso americano, em 1º de janeiro, que cancelou aumentos de impostos para 98% das famílias e adiou em dois meses US$ 110 bilhões em cortes indiscriminados de despesas e a aprovação de um novo teto de endividamento, evitou no limite do prazo uma crise econômica imediata nos Estados Unidos. Mesmo com a resistência da bancada republicana, a Câmara aprovou o pacote que passara no Senado, por maioria simples, por 257 a 167 votos. O presidente Barack Obama assinou a lei logo em seguida. A solução, porém, apenas posterga um acordo permanente que reduza o déficit público no longo prazo.

Venceu o argumento de que o Partido Republicano seria responsabilizado por levar a economia americana a uma possível recessão. Apesar da reação positiva dos mercados ontem, primeiro dia útil de negócios em 2013, três novas batalhas entre governo e oposição serão travadas no primeiro trimestre: o novo teto de endividamento, o cancelamento definitivo da tesoura automática nos gastos e o Orçamento anual.

Ou seja, os EUA continuam à beira do abismo, com um rombo anual de US$ 1,4 trilhão nas contas públicas e uma dívida de US$ 16,4 trilhões a ser rolada. A nova legislação levantou apenas US$ 626 bilhões em receitas na próxima década, segundo o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO, na sigla em inglês).

- O acordo aprovado foi outro chute jogando a lata mais adiante - resumiu o economista William Gale, do Brookings Institution.

Em nota, o Fundo Monetário Internacional (FMI) destacou ontem que "mais ainda deve ser feito" para pôr as finanças americanas num caminho sustentável. E a agência de risco Moody"s disse que o acordo não pôs fim à possibilidade de rebaixamento da nota do país. Economista-chefe do banco de investimentos Jefferies & Co, de Nova York, Ward McCarthy acredita que evitar o abismo foi importante, mas as incertezas permanecem.

benefício a emergentes

Para sepultar de vez os cortes automáticos, republicanos exigirão uma severa trava nos gastos sociais. Já democratas tentarão avançar uma reforma tributária. Obama já afirmou que não aceitará uma queda de braço que ameace os EUA de honrarem seus compromissos.

- Não terei outra discussão com este Congresso sobre se eles devem honrar contas geradas por leis que eles mesmo passaram - disse o presidente em seu pronunciamento.

Além disso, o ano fiscal americano começa em abril. Até lá, Congresso e Casa Branca terão de formatar o Orçamento 2013/2014. Pelo tamanho da economia americana, a aprovação do pacote foi um alívio não só para o país. A medida favorece nações como o Brasil, que têm nos EUA um tradicional destino para exportações.

- Para países emergentes como Argentina, México e Brasil, é desejável que os EUA tenham uma economia pujante, porque crescem com isso - destacou o professor de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Maurício David.

A China também se beneficia com o pacote, já que é hoje o país que detém a maior quantidade de títulos do governo americano. Para Márcio Scalércio, professor de Relações Internacionais da PUC-Rio, houve um alívio geral nos mercados internacionais pela demonstração do governo de que foi capaz de alcançar uma solução para o impasse.

- Foi de última hora, porque há um conflito ideológico legítimo - disse Renato Fragelli, professor da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas.