Título: Impasse à americana
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Fonte: O Globo, 22/12/2012, Economia, p. 37
Bolsas caem com falta de acordo entre democratas e republicanos para evitar abismo fiscal
NOVA YORK, WASHINGTON, LONDRES E SÃO PAULO - O impasse nas negociações entre democratas e republicanos para um acordo que evite a aplicação compulsória de medidas de cortes de gastos federais e aumento de impostos em mais de US$ 600 bilhões, a partir de janeiro de 2013, derrubou os mercados financeiros no mundo ontem. Nos EUA, apesar do baixo volume devido à proximidade das festas de fim de ano, os pregões foram bastante voláteis com os investidores descrentes em um pacto bipartidário que evite o chamado abismo fiscal, antes do prazo final, em 31 de dezembro. Se isso ocorrer, economistas projetam que os EUA voltariam à recessão.
Os principais índices recuaram mais de 1%; as ações europeias, principalmente os papéis de bancos, também registraram perdas; e, no Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) acompanhou o movimento e fechou em queda, enquanto o dólar subiu, apesar de nova intervenção do Banco Central (BC) no mercado de câmbio.
Na quinta-feira à noite, o presidente da Câmara dos Representantes, o deputado republicano John Boehner, não conseguiu obter o número suficiente de votos de seu próprio partido para aprovar o projeto de lei batizado de "plano B", para evitar o abismo fiscal. A resistência dos republicanos diz respeito, sobretudo, à proposta que prevê o aumento de impostos para quem tem renda anual superior a US$ 1 milhão.
- O fracasso do "plano B" foi frustrante e terrivelmente inesperado. Agora há uma concreta falta de clareza sobre o que acontecerá; e os mercados odeiam esse tipo de situação - afirmou Mike Hennessy, diretor-gerente de Investimentos do Morgan Creek, em Chapel Hill, na Carolina do Norte.
A falta de apoio ao "plano B" sugere que será ainda mais difícil obter apoio dos republicanos para o pacote do presidente Barack Obama, que prevê um aumento de impostos ainda mais amplo sobre os mais ricos do que a proposta de Boehner no "plano B". Essa conjuntura reduz a possibilidade de um acordo entre a Casa Branca e os republicanos antes do fim do ano. Ontem, Boehner alertou que os líderes do Congresso e Obama devem trabalhar juntos para tentar um consenso.
Apesar da ansiedade dos investidores ter se refletido ontem no desempenho das bolsas, alguns analistas, como Mark Lehmann, presidente do JMP Securities, em San Francisco, afirmam que a queda das ações não foi forte o suficiente para sugerir que há uma total descrença dos investidores num acordo a tempo de evitar um estrago na economia americana em 2013.
- Hoje (ontem), a queda poderia ter sido perfeitamente de 300 ou 400 pontos e, aí sim, todos estariam dizendo: "isso significa que a situação é mesmo catastrófica" - disse Lehmann. - Se chegarmos em meados de janeiro com esse nível de conversações, é para se ficar preocupado, mas não creio que chegaremos a esse ponto.
Ontem, Obama conclamou os congressistas americanos a chegarem a um acordo para evitar o aumento de impostos para a classe média e disse que fará o possível para chegar a um consenso. Ele acrescentou que está otimista por um desfecho positivo.
Ações de bancos lideram queda
No último pregão antes do feriado de Natal em Wall Street, o Dow Jones perdeu 1,11%; o Standard & Poor"s 500, 1,18%; e o Nasdaq Composite, 1,31%. As ações de bancos lideraram a queda. O Citigroup caiu 1,8% e o BofA, 2,4%. Na Europa, Londres recuou 0,3%; Frankfurt, 0,5%; e Paris, 0,2%. O Ibovespa, índice de referência da Bolsa de São Paulo, fechou em queda de 0,44%, aos 61.007 pontos e volume negociado de R$ 6,5 bilhões. Durante a manhã, o pregão chegou a registrar queda de 1,72%.
Já no mercado de câmbio brasileiro, mesmo com o Banco Central realizando mais um leilão de venda de moeda americana, totalizando US$ 2 bilhões, o dólar fechou com valorização de 0,48% frente ao real, sendo negociado a R$ 2,072 na compra e R$ 2,074 na venda. Na máxima do dia, a divisa americana foi negociada a R$ 2,081 e, na mínima, chegou a R$ 2,069. Com o aumento da aversão ao risco nas Bolsas, os investidores compraram dólares antes do recesso de Natal.
- Até o fim do ano, se nenhum acordo for anunciado, o abismo fiscal nos EUA estará na pauta do mercado. Com o pessimismo, a Bovespa inverteu a tendência de recuperação dos últimos dias. Nesse cenário, os investidores venderam papéis mais negociados, como Petrobras e Vale, que têm peso importante na composição do Ibovespa, e compraram dólares - disse o estrategista da corretora SLW, Pedro Galdi.
Para o operador Luiz Roberto Monteiro, da corretora Renascença, o prazo para que republicanos e democratas cheguem a um acordo até o fim do ano ficou muito curto:
- Pelo que se viu até agora, a chance de que se chegue a um consenso entre republicanos e democratas, antes do fim do ano, é muito pequena. Por isso, acredito que a Bolsa vai ser influenciada negativamente por esse cenário. As ações não vão despencar, mas a tendência é que o Ibovespa se desvalorize.
Entre as ações mais negociadas do Ibovespa, Vale PNA recuou 0,75%; Petrobras PN, 1,71%; OGX Petróleo ON 0,70%. Já Itaú Unibanco PN ganhou 1,5% e PDG Realty ON fechou estável.