Título: Poupadores terão de se habituar a juros mais baixos
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Fonte: O Globo, 05/01/2013, Opinião, p. 20
Ainflação aguda e crônica encurtava os horizontes dos poupadores no Brasil. E mesmo depois do lançamento do real, esses horizontes não se alargaram, pois, para assegurar a estabilidade monetária, o Banco Central teve de adotar uma política de juros muito elevados nos anos que se seguiram. Mesmo quando foi possível dar início a uma gradual trajetória de queda, os juros permaneceram ainda altos, desestimulando aplicações de longo prazo, pois operações financeiras com duração inferior a três anos continuavam a oferecer rentabilidade extremamente atrativa.
Esse quadro somente se sustentou porque por trás havia o escudo do Tesouro Nacional. Os títulos públicos federais, em boa parcela com vencimentos inferiores a um ano, chegaram a compor 90% das carteiras da maioria dos fundos de investimento, inclusive os de previdência complementar (tanto os exclusivos para grupos de profissionais como os abertos a quaisquer investidores). Para renovar quase que diariamente grandes fatias de sua dívida, o Tesouro tinha de alimentar o mercado com juros altos, em situação cômoda para os gestores de recursos.
No entanto, essa rotina não abria espaço para os demais agentes econômicos buscarem formas mais baratas de financiamento no mercado privado. Com o ajuste fiscal que efetivamente começou no último trimestre de 1999, a dívida pública parou de crescer velozmente, e, em termos relativos, passou a encolher. Em 2012, como a crise financeira internacional dava sinais que se estenderia mais do que havia sido previsto pelos especialistas, o Banco Central adotou uma política de sucessivos cortes na taxa básica de juros, reduzindo-a para 7,25% ao ano. Em face dessa queda, o conjunto das aplicações financeiras teve de se ajustar, inclusive as cadernetas de poupança, cujas regras antes eram vistas como intocáveis.
A trajetória das taxas de juros daqui para a frente dependerá do comportamento da inflação e do ritmo da atividade da economia, mas é pouco provável que o país volte a conviver com os patamares excessivamente elevados do passado. A tendência é que os juros reais no Brasil se alinhem aos padrões internacionais, bem mais modestos do que aqueles que os investidores aqui haviam se habituado. Tudo, porém, a depender da efetiva responsabilidade fiscal dos governos.
Fundos de previdência privada que tinham se programado com a baseada hipótese de os juros reais se manterem elevados terão de rever as estratégias. Sem assumir riscos exagerados, que conflitem com a natureza conservadora desse tipo de poupança coletiva, os gestores devem ser criativos para buscar rentabilidades próximas às que comodamente usufruíam nos títulos federais. Nesse sentido, é importante que a regulação desses fundos também se ajuste a um quadro de juros reais mais baixos, como começou a ser feito esta semana.