Título: Oposição dividida
Autor: Costa, Mariana Timóteo da
Fonte: O Globo, 12/01/2013, Mundo, p. 29

Enquanto o vice-presidente Nicolás Maduro anunciava que visitaria Hugo Chávez em Havana - onde encontraria os presidentes de Argentina, Cristina Kirchner, e Peru, Ollanta Humala, para uma minicúpula de aliados - a oposição da Venezuela convocava ontem sua primeira manifestação contra a crise institucional que vive o país. O evento principal, organizado pelo partido Vontade Popular, acontecerá numa praça do bairro de classe média de Chacaíto, em Caracas. O grupo pediu que críticos também se reúnam em outras praças públicas do país. No entanto, mais do que um ato para demonstrar a capacidade de mobilização dos opositores, a organização da assembleia expôs a falta de consenso entre a liderança contrária ao chavismo, que, segundo analistas, está numa situação muito difícil. Na véspera, a Mesa da Unidade Democrática (MUD), que reúne todos os partidos opositores, incluindo o Vontade Popular, havia convocado uma marcha maior para o dia 23. Ou seja, a manifestação de hoje é de um único partido. Além disso, o líder mais popular da MUD, Henrique Capriles, do partido Primeiro Justiça, não deve comparecer a nenhum dos eventos.

Aliados de Capriles já admitem que ir às ruas talvez não seja a melhor opção, já que ele é o mais provável candidato à Presidência contra Maduro - em caso de morte de Chávez, eleições terão que ser convocadas em 30 dias.

- Ao menos é o que diz a Constituição, que não vem sendo muito respeitada por estes dias, mas, caso Chávez venha a faltar, o país não terá como escapar da votação - diz a historiadora e cientista política Margarita López Maya, para quem Capriles pode estar se distanciando dos demais líderes, porque "sabe que uma estratégia mais combativa não lhe daria os votos de chavistas mais moderados numa eventual disputa com Maduro".

Além de não confirmar presença nas ruas, o governador de Miranda se absteve de declarações mais duras contra a decisão do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ). A corte decidiu no dia 9 que Chávez não está ausente, mas licenciado com aval da Assembleia Nacional e que, portanto, a cerimônia de posse seria desnecessária, mantendo Maduro à frente do governo. Enquanto a MUD dizia ser necessário evocar os tribunais internacionais, Capriles defendia a não confrontação e pedia que o Executivo se preocupasse com "problemas que afligem os venezuelanos, como a questão da segurança".

- Esta estratégia pode ser a melhor para quem desejar ganhar eleitoralmente do chavismo. As pessoas estão cansadas do discurso polarizado, o que a oposição precisa para sair da crise é apresentar ideias novas, que atraiam o povo beneficiado pelas políticas sociais de Chávez - diz Margarita.

Os líderes da oposição descartam qualquer rumor de divisão ou disputa interna. Em entrevistas ao GLOBO, Carlos Vecchio, coordenador político da Vontade Popular, e Julio Borges, deputado do Primeiro Justiça, disseram que a MUD está unida e "certamente apresentará um candidato único à Presidência, numa eventual disputa com Maduro".

- Se vamos realizar novas primárias ou não, depende do tempo de que disporemos. O fato é que, mais cedo ou mais tarde, teremos um novo processo eleitoral e temos que estar preparados - declarou Borges, que não vê problemas na realização de duas marchas. - Todo partido tem direito de organizar o ato que quiser.

"IGUAL A BARACK OBAMA"

É praticamente consenso que, quanto mais as eleições presidenciais forem adiadas, melhor para a oposição. Um prazo maior daria tempo para avaliar propostas, se reaproximar da massa e, principalmente, evitar uma votação maciça em Maduro como homenagem à figura de Chávez.

- Defendemos que tudo seja feito dentro do processo constitucional. É isso que começaremos a debater com nossos partidários a partir de hoje, na assembleia - afirma Carlos Vecchio.

Universitários de dois estados, Táchira e Bolívar, também realizaram protestos e prometem novos atos nos próximos dias. Ontem, aquele que é considerado o preso político mais proeminente do chavismo, Raúl Baduel ex-general e ex-ministro da Defesa de Chávez, exortou os venezuelanos a restabelecer a ordem constitucional, classificando o episódio da "posse virtual" de violação em andamento. Numa nota emitida da prisão militar de Ramo Verde, no Sudeste da capital, Baduel acusou o governo de perpetrar uma "novo golpe de Estado constitucional" ao aprovar a postergação da posse de Chávez. "Todo cidadão tem o dever de colaborar com o restabelecimento da ordem", disse. Ele, que foi responsável por trazer Chávez de volta ao poder após o golpe de 2002, foi sentenciado em 2010 a mais de sete anos de prisão sob acusações de corrupção e abuso de poder. Mas se declara inocente e diz que foi preso porque rompeu com abusos de poder do chavismo, em 2007.

No lado oficialista, o ministro da Comunicação, Ernesto Villegas, disse que o presidente está assimilando bem o tratamento e "está consciente da situação em que se encontra".

- Apesar de não estar na Venezuela, ele continua governando. Assim como, se Barack Obama não estiver nos EUA, ele continua exercendo a Presidência - afirmou, acrescentando que Chávez, "como qualquer cidadão, tem direito de preservar a informação sobre seu estado de saúde".

A Transparência Internacional, no entanto, defendeu que os dados sobre a saúde do presidente devem ser públicos e verificáveis. Ontem, a Organização dos Estados Americanos (OEA)disse respeitar a decisão do TSJ sobre Chávez.