Título: Bloqueadores de sinal não evitam o uso de telefones
Autor: Herdy, Thiago
Fonte: O Globo, 06/01/2013, País, p. 3

Para especialistas, há hoje tecnologia capaz de inibir o uso de celulares, mas falta eficiência

SÃO PAULO Alardeados no início dos anos 2000 como solução para o fim dos celulares em presídios, os bloqueadores de sinais de celular se transformaram em equipamentos obsoletos para lidar com o problema. Quatorze dos 23 estados que responderam ao levantamento do GLOBO relataram a realização de testes, no passado e nos dias de hoje, com os equipamentos sem resultados 100% satisfatórios.

Estado onde foram encontrados mais celulares com detentos no ano passado, São Paulo ainda estuda dois tipos de tecnologia diferentes para tentar obter algum resultado. Em 2002 foi instalado o primeiro equipamento no estado, mas não funcionou. O mesmo ocorre no Rio Grande do Sul: "Vários testes foram realizados, nenhum foi eficaz", informou a Superintendência dos Serviços Penitenciários.

- Instalamos em quatro unidades por dois anos, não funcionaram a contento -disse o gerente de planejamento da Defesa Social em Pernambuco, coronel Geovane Melo.

"Solicitamos instalação para período de testes, o processo licitatório será aberto se confirmada a eficácia", informou o governo do Pará.

Em 2012, o governo de Santa Catarina sancionou uma lei que obriga as operadoras a instalar bloqueadores de sinal nas 49 unidades prisionais do estado. Nove já contam com bloqueadores, mas nem por isso a entrada de aparelhos cessou: foram apreendidos 589 aparelhos em 2012. A Associação Nacional das Operadoras de Celular (Acel) ingressou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a legitimidade da nova lei.

- A lei de execuções penais diz que a competência de instalar bloqueadores é do estado - diz o presidente executivo da Acel, Eduardo Levy, que garante haver tecnologia eficaz para bloquear o sinal apenas em áreas definidas, sem atingir residências no entorno das prisões.

- Não há bloqueador que funcione 100%, sempre vão existir pontos cegos. Imagine o que acontece quando alguém tem 24 horas disponíveis apenas para ficar procurando isso. As próprias empresas de telefonia sabem que não há condições de bloquear, mas não falam. Acredito que nem elas têm interesse em trazer uma tecnologia que vai contra seus interesses econômicos - rebate o promotor de Justiça aposentado e ex-diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) Maurício Kuehne, há 29 anos dedicado à discussão da execução penal.

Atualmente diretor do Deparamento de Execuções Penais do Paraná, Kuehne acredita que os estados não devem ficar esperando o governo federal para investir em tecnologia nos presídios onde estão os detentos mais perigosos, mas também usar recursos do próprio caixa para diminuir o problema.

O atual diretor do Depen, Augusto Rossini, diz-se assustado com a presença de 34,9 mil em presídios brasileiros em 2012:

- Não poderia entrar nenhum celular. Isso é questão de gestão, tem que perguntar aos gestores locais (os motivos que levaram a isso).

Para ele, além de equipamentos, uma gestão mais eficiente de pessoal é uma forma de tratar o tema. Atualmente há aproximadamente cem mil agentes penitenciários em serviço no Brasil.

- Não vou citar o nome, mas há estados onde o agente passa no concurso hoje e amanhã já toma posse. Ele deveria ser qualificado antes de ir para a grade de funcionários - acredita Rossini, que cobra a aprovação pelo Congresso de projeto-lei que trata da regulamentação de procedimentos relacionados à execução penal, como a visita íntima, por exemplo.

Mas criatividade nunca faltará aos detentos. Prova disso é o meio usado por detentos do Presídio Desembargador Luiz de Oliveira Souza, em Arapiraca, em Alagoas, para receber no último mês telefone, baterias e até um carregador: estava tudo colado com fita crepe no corpo de um gato.