Título: Compaixão milionária
Autor: Queiroz, Guilherme
Fonte: Correio Braziliense, 11/10/2009, Política, p. 6

Auxílio-caixão¿ pago por deputados a viúvas e herdeiros de colegas falecidos chegou a R$ 7,3 milhões este ano devido à morte de 14 parlamentares

Maia: ¿É dinheiro que sai do nosso bolso para ajudar numa hora importante¿

Uma tradição às vésperas de completar 20 anos no Congresso Nacional custou R$ 7,3 milhões em descontos nos contracheques de deputados nesta legislatura. Apelidado de ¿auxílio-caixão¿, o pecúlio pago a famílias e herdeiros de congressistas falecidos escalou à milionária quantia impulsionado por uma estatística fúnebre: as mortes de 14 parlamentares da Casa, desde fevereiro de 2007. Em luto a cada desfalque, deputados chegam a fazer piada sobre um eventual fim da obrigação, mas não se atrevem a sepultar o rito.

Criado em 1990, o auxílio serve como uma espécie de apólice destinada a amparar financeiramente viúvas ou herdeiros de parlamentares falecidos. O dinheiro pago é descontado do salário dos demais deputados, no mês seguinte, e equivale a dois dias de trabalho. Com base no vencimento atual, de R$ 16.512, cada colega abre mão de R$ 1,1 mil por morte. Somada, a contribuição dos demais 512 parlamentares chega a R$ 563 mil por beneficiário. Pelas regras, o pecúlio deveria ser pago solidariamente entre deputados e senadores, mas o Senado não tem repassado a cota de seus membros.

A iniciativa de auxiliar familiares dos falecidos foi instituída pelo antigo Instituto de Previdência dos Congressistas (IPC). Apesar da extinção do órgão, em 1997, a tradição perdurou e hoje se mantém por adesão de 100% da Casa. Ao tomar posse, um deputado assina um documento no qual se declara participante do fundo. ¿Todos entendemos que isso é bom, mesmo que represente uma parcela significativa do salário de um deputado. Quem tem filho para criar sabe que essa quantia ajudaria no caso de acontecer o pior¿, pondera o deputado Zenaldo Coutinho (PSDB-PA), no quarto mandato.

Impacto Para reduzir o impacto nas finanças dos deputados nas três ocasiões em que houve mais de uma morte em determinado mês, a direção da Câmara tem diluído os descontos nos contra-cheques seguintes. A medida foi tomada em julho de 2007, com as mortes dos deputados Júlio Redecker (PSDB-RS) e Nélio Dias (PP-RN); em abril deste ano, quando faleceram João Herrmann (PDT-SP) e Carlos Wilson (PT-PE); e em julho passado, após as mortes de Dr. Pinotti (DEM-SP) e Fernando Diniz (PT-MG). O auxílio não foi descontado apenas no caso de Clodovil Hernandes (PR-SP), falecido em março de 2009, que não tinha herdeiros e não indicou um beneficiário.

Primeiro vice-presidente da Casa, o deputado Marco Maia (PT-RS) reconhece que sugestões para se pôr fim ao auxílio-caixão podem ser ouvidas nos corredores da Câmara quando o salário é depositado com R$ 1,1 mil a menos, mas classifica os comentários como desabafos ditos ao vento. ¿É uma tradição importante que temos. Não é dinheiro público, é dinheiro que sai do nosso bolso para ajudar numa hora importante¿, conclui.

O número Solidariedade Números do auxílio-caixão

Um deputado recebe R$ 16.512 por mês.

Somada a contribuição de R$ 1,1 mil paga por 512 deputados, o valor pago à família chega a R$ 563.509,60

Total desembolsado na atual legislatura: R$ 7.326.924,80