Título: Elétricas devem ter apagão de dividendos
Autor: Neto, Sorima João
Fonte: O Globo, 14/01/2013, Economia, p. 19

Depois de tomarem um tranco na Bolsa de Valores, após o governo federal anunciar, em setembro, medidas para reduzir o custo da energia, as ações do setor elétrico voltam a ficar na berlinda neste início de ano. Nos sete primeiros pregões da Bovespa de 2013, as ações das 34 companhias do setor perderam R$ 2,5 bilhões em valor de mercado. Nos quatro últimos meses de 2012, elas já haviam perdido R$ 34,8 bilhões do seu valor. Desta vez, o fantasma de um racionamento de energia foi o motivo para a debandada dos investidores. É um paradoxo para um segmento que sempre foi atraente por um motivo especial: o pagamento de dividendos. Neste novo cenário para as elétricas, os dividendos devem minguar, por enquanto, avaliam especialistas no setor. Para investir nesses papéis, dizem eles, será necessário garimpar empresas que terão sua receita menos afetada.

- Até 2011, as elétricas pagavam dividendos que variavam entre 10% e 12%, na média. Agora, esse percentual deve ficar entre 6% e 7%. Mas algumas companhias podem nem pagar - avalia William Alves, analista da XP Investimentos.

O dividendo nada mais é do que a distribuição de parte do lucro obtido pela empresa entre os acionistas. É um rendimento extra, que não depende da valorização das ações. As elétricas sempre pagaram bons dividendos porque tinham boa geração de caixa e pouca necessidade de fazer investimentos. Eram também consideradas ações defensivas, papéis que oscilavam pouco, mesmo nos momentos de maior solavanco no mercado. Como se viu nos últimos meses, isso mudou. As quedas na Bolsa chegaram a quase 50%.

O tombo das elétricas começou quando o governo mexeu com a perspectiva de lucro dessas companhias, explica Júlio Oliveira, sócio da Magliano Corretora. Para reduzir o valor das contas de luz em até 20%, a partir de fevereiro deste ano, Brasília antecipou a renovação das concessões das usinas que venceriam até 2017 e exigiu que as geradoras e transmissoras aceitassem uma remuneração até 70% menor pelo serviço prestado. Com isso, as companhias que aderiram à proposta vão perder receita. E, embora o governo negue que exista o risco, um racionamento de energia reduziria as vendas, também tendo impacto sobre a receita.

- A utilização das térmicas também preocupa os acionistas de empresas distribuidoras. O custo de produção de energia é mais alto, e as empresas terão gastos maiores até que as tarifas sejam reajustadas - explica Pedro Galdi, estrategista da corretora SLW.

Embora todo o setor tenha sofrido na Bolsa, os analistas não recomendam a venda maciça dos papéis. Eles estão estudando com lupa o impacto das mudanças sobre cada companhia e já chegaram a algumas conclusões. É consenso que as ações da Eletrobras não são uma boa opção de compra neste momento. Há gente prevendo que a empresa nem pagará dividendos. A recomendação é que quem tem ações da Eletrobras as substitua por outras.

- A estatal foi a primeira a aderir à proposta do governo. Essa nova realidade reduz a geração de caixa, afetando o pagamento de dividendos - diz William Alves, da XP.

Para Julio Oliveira, da Magliano, se a Eletrobras conseguir pagar dividendos, provavelmente será o patamar mínimo exigido por lei: 25% do lucro.

A Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (Cteep), que já distribuiu 100% do lucro em forma de dividendos, dificilmente deve repetir a perfomance, acredita Beatriz Nantes, analista do setor de energia da Empiricus Reserach/Investmania. Para ela, o fato de a transmissora ter aceitado a proposta do governo afetará sua receita. Beatriz também acha difícil que a Eletropaulo ofereça bons dividendos. A distribuidora nem foi tão afetada pelas medidas do governo, mas passou pelo terceiro ciclo de revisão tarifária, em que os preços praticados pela empresa são reavaliados. Houve redução média de 9%.

- A Eletropaulo deixou de ser uma boa pagadora de dividendos - diz Beatriz.

Entre os papéis que ainda podem oferecer um dividendo atraente, a analista aponta as ações de Tractebel, Transmissora Aliança de Energia Elétrica (Taesa) e AES Tietê. Ela avalia que estas empresas não foram tão afetadas pelas mudanças impostas pelo governo.

A XP recomenda também Taesa e Tractebel.

- A Tractebel tem um nível de endividamento baixo, o que permite gerar caixa. E as concessões da Taesa vencem em 2030, o que reduz o risco regulatório - explica William Alves.

A Magliano Corretora retirou todos os papéis de elétricas de seu portfólio recomendado.

- Não se deve ficar sentado sobre as mesmas ações por cinco ou dez anos, principalmente depois dessas mudanças. Temos uma carteira de ações que pagam dividendos, não tão generosos como eram os das elétricas, mas com custo de oportunidade muito melhor. Entre elas, estão os papéis de Ambev, Souza Cruz, Sabesp e Vale. A Souza Cruz, por exemplo, vai distribuir 100% do lucro em dividendos. É uma opção enquanto a rentabilidade das elétricas não ficar mais clara - avalia Oliveira.