Título: Colunista do FT vê jeitinho na economia do Brasil
Autor: Valente, Gabriela; Villa-Bôas, Bruno
Fonte: O Globo, 17/01/2013, Economia, p. 23

Blogueira do jornal britânico diz que Banco Central faz "corte de juros disfarçados"

RIO E SÃO PAULO A correspondente do jornal britânico "Financial Times" Samantha Pearson recorreu à expressão "jeitinho brasileiro" para criticar o que chamou de "corte de juros disfarçado". Consagrada pela sociologia brasileira, a expressão se refere às formas pelas quais a sociedade contorna a obediência a regras e convenções, mediante estratégias criativas, às vezes ilegais.

Em seu blog Beyond Brics, a jornalista do "FT" acusa o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, de não fazer nada para impedir a queda sistemática do CDI (Certificado de Depósito Bancário, os juros cobrados entre bancos para empréstimos de um dia), que vem caindo em relação à Selic, a taxa básica do BC. Enquanto o CDI estava em 6,93% na segunda-feira, a Selic estava em 7,25%. Com esse "jeitinho", diz ela, Tombini busca estimular a economia sem cortar os juros.

Samantha afirma ainda que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, é "expert em jeitinho", citando as manobras de contabilidade criativa da Fazenda para garantir o superávit primário. Ela também menciona o recente pedido do ministro ao prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), para que adiasse o aumento da tarifa de ônibus na cidade, num esforço para evitar uma elevação exagerada da inflação. Ela alerta que, como essas medidas não são ilegais - e o Brasil não é o único a adotá-las -, o mercado vai acabar sendo mais rígido com relação à meta de inflação.

Desde dezembro, o CDI está de 0,17 a 0,25 pontos básicos abaixo da Selic efetivamente cobrada. Como o CDI é uma referência para títulos emitidos por empresas, a diferença representa, na prática, um estímulo adicional à economia, já que fica mais barato para empresas captarem dinheiro no mercado local. Ontem, a Selic efetiva estava em 7,11% ao ano. O CDI fechou em 6,94%. Uma diferença de 0,17 pontos básicos.

- O CDI costuma ficar abaixo da Selic, mas uma diferença menor. Historicamente, o fator de correlação era de quatro pontos centesimais. Ou seja, se a Selic está a 7,11%, o CDI giraria em em 7,07%. Houve um descolamento maior agora - explicou um operador.

PREFEITO DE SÃO PAULO rebate "ft"

Segundo especialistas, como se trata de um mercado entre bancos, o motivo principal dessa diferença seria o excesso de liquidez nas instituições. Um operador lembra, porém, que "o BC tem poder para colocar o CDI onde quiser".

Já Haddad rebateu a crítica do "FT":

- (O governo federal) faz uma política de gestão, não de jeitinho. Se há contratos que coincidem o reajuste, a coisa mais natural do mundo é fazer gestão no sentido de descasar os reajustes ao longo do ano, para que não haja um mês em que o impacto seja muito forte - rebateu o prefeito paulistano.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, disse ontem que o governo federal também lhe pediu que adiasse o aumento das tarifas de metrô e trem.