Título: Síria acusa Israel por ataque
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Fonte: O Globo, 31/01/2013, Mundo, p. 31

Um forte estrondo relatado por moradores de vilarejos ao longo da fronteira entre o Líbano e a Síria ainda nas primeiras horas de ontem deflagrou boatos. E esses ganharam peso quando a imprensa internacional noticiou uma ofensiva aérea israelense. Durante horas, fontes militares de Estados Unidos, países da Europa e do Oriente Médio asseguravam tratar-se de um bombardeio contra um comboio que levava armas ao grupo xiita libanês Hezbollah. À noite, porém, veio a denúncia que elevou ao ápice a tensão regional: o governo da Síria acusou Israel de violar sua soberania. E de destruir um centro de pesquisa científica militar em Jamraya, numa zona rural cerca de 15 quilômetros a Noroeste de Damasco. Dois funcionários do complexo morreram na ação e outros cinco ficaram feridos, de acordo com a agência estatal Sana. Fontes da oposição, porém, alegam que o local é um conhecido polo de fabricação de armas químicas.

Em Jerusalém, manteve-se de pé uma tradicional política do silêncio tanto no Ministério das Relações Exteriores quanto no Exército. A estratégia foi acolhida também em Washington.

- Eu lhes recomendaria o governo de Israel para questões e atos que eles podem ou não ter feito - declarou aos jornalistas o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney.

Desde cedo, a imprensa do Líbano soou o alarme regional ao denunciar três supostas violações israelenses de seu espaço aéreo ao longo do dia. A agência estatal, porém, descartou um ataque a seu território. À noite, o governo sírio acusou os aviões de Israel de invadir sua soberania logo ao amanhecer. As aeronaves teriam chegado pela região do Monte Hermon, nas disputadas Colinas de Golã, e atingiram o centro de pesquisa usado "para melhorar os níveis de resistência e autodefesa".

VERSÕEs distintas como NA OFENSIVA de 2007

O ataque misterioso remeteu ao ano de 2007, quando caças israelenses bombardearam uma usina atômica síria em Deir el-Ezzor. Hoje, o episódio é reconhecido internacionalmente por governos e fontes militares mundo afora, embora tenha sido negado num primeiro momento pelo regime sírio. Somente meses depois o governo de Bashar al-Assad mudou sua versão e admitiu ter sido alvo de um ataque contra uma "base militar". Damasco nunca admitiu tratar-se de um complexo nuclear - assim como Israel jamais assumiu a autoria do bombardeio.

As acusações sírias ofuscaram, em parte, as suspeitas anteriores segundo as quais o alvo do bombardeio eram armas que seguiam para o Hezbollah. Mas, no vaivém de informações, fontes americanas ouvidas pelo "New York Times" afirmaram que a ação israelense foi, de fato, contra um carregamento de armas - e que a Casa Branca fora notificada da ofensiva.

As capacidades balísticas do Hezbollah são preocupação recorrente dos israelenses. Numa conferência na terça-feira, o comandante da Força Aérea de Israel, major-general Amir Eshel, disse que a Síria era um exemplo de "como governos em colapso nos países vizinhos podem ficar expostos a ações hostis". A advertência, comum entre oficiais israelenses, ganhou força nos últimos dias, com novas ameaças quanto ao uso eventual de armas químicas na Síria. E mesmo quanto às armas convencionais recebidas dos sírios pelo Hezbollah.

Enquanto isso, na Síria, grupos rivais se aproveitavam do caos em causa própria. Pelo Twitter, partidários de Assad diziam que a ação era prova de que "a oposição é um golpe de Israel para acabar com o Estado". Fontes rebeldes acusavam o governo pelas explosões em Jamraya.

Nesse cenário de incertezas, cresce, renovado, o temor de que o conflito cruze novas fronteiras, chegando a Israel - e Irã. Há dois dias, a república islâmica afirmara categoricamente que qualquer ataque à Síria seria considerado como um ataque desferido contra Teerã.