Título: Cerco a Rajoy
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Fonte: O Globo, 02/02/2013, Mundo, p. 39
Madri No segundo dia após a revelação, pelo jornal "El País", de um suposto esquema de caixa dois que tem entre os beneficiados o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, do Partido Popular (PP), parte da opinião pública do país marcou posição firme, nas ruas e na internet, por sua renúncia. O cerco também se fechou ainda mais com indícios de que o PP violou a lei de financiamento de partidos políticos. O Ministério Público espanhol já defende uma investigação sobre o caso, e novas descobertas das autoridades sobre um outro esquema de caixa dois do PP revelado em 2009, o caso Gürtel, atingiram a ministra da Saúde, Ana Mato. Rajoy, por sua vez, manteve o silêncio.
Ontem, Oscar López, um dos líderes do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), disse que a renúncia de Rajoy, caso fique comprovado que recebeu dinheiro de forma ilegal, é "uma obviedade". O presidente do governo é acusado de ter recebido ¬ 25.200 anualmente ao longo de 11 anos.
- Há uma acusação gravíssima contra o presidente, e os espanhóis fazem uma pergunta que vai perseguir Rajoy até que responda: se recebeu ou não esse dinheiro ilegal - cobrou.
Na internet, uma petição lançada anteontem pedindo a saída de Rajoy e de todos os políticos do PP supostamente envolvidos no caixa dois, além de eleições antecipadas, já contava ontem à noite com mais de 570 mil assinaturas. Assim como na noite de quinta-feira, manifestantes saíram ontem às ruas de Madri para pedir a renúncia do presidente do governo.
- Estamos num cenário de corrupção estrutural. O povo está reagindo e faz falta que a política reaja mais além de declarações - criticou o secretário-geral do partido ICV, Joan Herrera.
investigação iminente
Em entrevista à TV espanhola, o procurador-geral do país, Eduardo Torres-Dulce, defendeu que já é possível abrir uma investigação penal com base no que foi revelado pelo "El País", mas não deu prazo para fazê-lo. Segundo Torres-Dulce, Rajoy pode ser chamado a depor:
- Todos que podem aportar algo à investigação e ao esclarecimento da verdade serão convocados.
A pressão sobre Rajoy e a cúpula do PP cresceu ontem com a revelação de que pelo menos 70% das doações registradas na contabilidade do ex-tesoureiro do partido Luis Bárcenas e reveladas pelo jornal há dois dias violam a lei de financiamento de partidos políticos. Em diversas ocasiões, o volume de dinheiro registrado por Bárcenas supera o limite legal de ¬ 60 mil, até 2007, e ¬ 100 mil, depois disso. Donos de empresas do setor de construção civil e do ramo imobiliário predominam entre os supostos doadores. Um deles é Juan Miguel Villar Mir, presidente do grupo OHL, que administra rodovias federais e estaduais no Brasil. Villar Mir nega as acusações contra ele.
Outro baque foi a confirmação pela polícia espanhola de que, entre 2000 e 2005, a ministra da Saúde, Ana Mato, e seu então marido, o ex-senador Jesús Sepúlveda, tiveram viagens de ¬ 50 mil e artigos de luxo, como bolsas da grife Louis Vuitton, bancados por empresas envolvidas no caso Gürtel. Ao "El País", a ministra negou ter recebido os benefícios citados.
Ainda não foram divulgadas provas sobre uma possível ligação entre as denúncias recentes e o caso Gürtel, que já está sendo investigado pela Audiência Nacional espanhola. Em comum, a presença de Luis Bárcenas como o responsável pelas finanças irregulares. Há duas semanas, foi revelado que Bárcenas mantinha ¬ 22 milhões numa conta na Suíça pouco antes da explosão do caso Gürtel, quando espalhou o dinheiro por contas nos Estados Unidos.
Desde anteontem, dirigentes do PP negam a existência do esquema. Ontem, a vice-presidente do governo espanhol, Soraya Sáenz de Santamaría, evitou comentar o assunto durante o Conselho de Ministros. Defendeu que aquele não era o local indicado para assuntos partidários e disse apenas que Rajoy "nunca violou uma norma".