Título: Um desconfortável Banco Central
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Fonte: O Globo, 10/02/2013, Opinião, p. 18

O esperado aumento da pressão inflacio­nária neste início de ano se confirma em grande estilo, com o IPCA de 0,86% em janeiro, ou 6,15% nos doze meses anteriores, apenas 0,35 ponto percentual do teto da meta anual de 4,5%, já não alcançada há três exercícios. É a mais elevada taxa em janeiro desde 2003, quando o recém-empossado governo Lula se viu diante de um choque de inflação provocado pela alta do dólar durante a campanha eleitoral, subproduto dos temores dos mercados e de parte da sociedade com a chegada do PT ao poder.

À época, numa demonstração de maturida­de, o governo aplicou os remédios monetários (juros) e fiscais (gastos) adequados, e os índi­ces cederam. Hoje, a conjuntura é diferente e mais complexa.

Em outros tempos, o BC já teria elevado a taxa básica de juros, de 7,25%, a mais baixa desde a cri­ação da Selic. Mas o momento é outro. A econo­mia cresce em ritmo lento — na melhor das hipó­teses, 3,5% este ano, e muito em função da baixa base de comparação de 2012 — e há a aposta do BC e do governo em que o segundo semestre será menos ingrato, com a inflação do ano fechando abaixo dos 5,8% de 2012.

Um parêntese: mesmo assim, um índice alto, não só, mais uma vez, acima da meta de 4,5%, co-mo, por exemplo, à frente da inflação do emer­gente mais próximo do Brasil no continente, o México (3,6% no ano passado, mais que a meta de 3%, e com um crescimento bem maior, 4%, contra cerca de 1% do Brasil).

O BC de Alexandre Tombini conseguiu o feito de, contra a maioria das expectativas, fazer um corte histórico nos juros, por antever, com eficiên­cia, a degradação da economia mundial, com a entrada da Europa em parafuso. BC e governo dão todos os sinais de que farão o máximo para man­ter os juros baixos. Mas Tombini acaba de reco­nhecer que "a situação não é confortável"! Em "bancocentralês" significa que a autoridade mo­netária, apesar de visões em contrário, não abrirá mão do seu mandato para preservar o poder aqui­sitivo da moeda, já erodido pela inflação elevada dos últimos anos. E é bom que assim seja

Os alimentos continuaram a pressionar os índi­ces. Porém, prevê-se uma descompressão daqui para a frente. Não deverá haver nova seca históri­ca nos Estados Unidos, e o Brasil colherá uma su- persafra de grãos. Um reajuste mais baixo do salá­rio mínimo, por sua vez, poderá pôr rédeas curtas nos preços dos serviços. São em pontos como es­tes que se baseia o governo para ostentar algum otimismo. Mas, até que os ventos soprem a favor, ó quadro piorará, com taxas talvez bem acima do teto de 6,5%. Qual a dimensão dos estragos que os mecanismos de indexação existente nas econo­mia farão, não se sabe.

Além disso, é certo que o BC — como tem sido norma — continuará sem a ajuda do Ministério da Fazenda na contenção,dos preços, por ele ser um gastador incorrigível. Neste contexto, é bom um BC desconfortável.