Título: Queda do número de católicos desafia a Igreja no Brasil
Autor: Ribeiro, Marcelle
Fonte: O Globo, 16/02/2013, Mundo, p. 30

Com número de fiéis em queda no Brasil, o catolicismo pode ganhar fôlego no país caso o sucessor do Papa Bento XVI adote uma postura menos doutrinária, mais próxima à realidade dos fiéis, e escolha bispos mais dinâmicos. É a avaliação de especialistas ouvidos pelo GLOBO, que toma como base o declínio da população católica nos últimos anos, medido pelos números do último Censo do IBGE. O levantamento detectou uma queda no percentual de brasileiros que se declaram seguidores da religião, que passou de 73,6%, em 2000, para 64,6%, em 2010.

No mundo, o Brasil continua sendo o país com a maior número de católicos em termos absolutos, segundo o Fórum Pew sobre Religião e Vida Pública, entidade de pesquisa americana. Mas o total de católicos diminuiu em 1,6 milhão de pessoas, de 124,9 milhões para 123,2 milhões em dez anos. Enquanto os números mostram a queda do número de fiéis católicos, o percentual de evangélicos do país passou de 15% para 22%, com mais 16 milhões de adeptos. A porcentagem de brasileiros sem religião também aumentou, de 7,4% para 8%.

Considerando o número absoluto de fiéis, o México estava em segundo lugar, onde havia, em 2010, 96 milhões de pessoas que disseram ser católicas. Mas no México a porcentagem de católicos é maior e chega a 85%.

Na opinião do professor de teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Fernando Altmeyer, o sucessor de Bento XVI pode mudar a situação do catolicismo no Brasil, mesmo que de forma não automática.

- Se o futuro Papa escolher bispos dinâmicos para o Brasil, ele muda o rosto da igreja. São os bispos que organizam o trabalho com os padres. Se tivermos novos bispos mais dinâmicos, mais abertos, talvez a Igreja consiga mais fiéis ou obtenha o retorno de fiéis que se afastaram - diz, lembrando que o Papa é quem decide os religiosos que se tornarão bispos, após debate interno no país. - É preciso bispos que usem um linguajar mais próximo à juventude, aos pobres e acompanhem o cotidiano das pessoas.

especialista defende descentralização

Para Altmeyer, a igreja ainda tem um discurso muito rural e precisa ter uma postura mais próxima do mundo contemporâneo.

- A Igreja tem que atingir as pessoas na realidade urbana. Não tem mais horta nas cidades. Tem que cuidar do metrô, estar no rádio, participar do mundo artístico. Alguns padres até fazem isso, mas fazem show. Ninguém aguenta mais (shows). A Igreja precisa de algo que mexa com a emoção das pessoas - diz Altmeyer.

Para o professor Jorge Cláudio Ribeiro, do Departamento de Ciência da Religião da PUC-SP, não é preciso que o novo Papa seja brasileiro para que a Igreja Católica retome sua força no Brasil.

- O próximo Papa tem que despertar o entusiasmo duradouro, que tem a ver com uma maior participação dos fiéis. E, para gerar entusiasmo, o Papa precisa ter uma atitude amorosa, mais pastoral, que tem menos a ver com a fixação de doutrinas - afirmou Ribeiro.

O teólogo Paulo Fernando Carneiro de Andrade, professor do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, diz que para se aproximar mais dos fiéis, a Igreja deveria descentralizar mais a maneira como toma decisões.

- É preciso que as instâncias locais tenham mais criatividade em relação à liturgia e deem mais atenção à cultura local, para atender às demandas locais. É possível inverter a queda de fiéis no Brasil, mas é preciso uma descentralização da Cúria e respeito às individualidades locais - opinou Andrade.

Professor de Teologia da PUC-Minas, Camilo de Lélis diz que é preciso um Papa que enfatize o diálogo e que viaje muito.

- Cada vez mais o Papa tem que dialogar. Tem que ser um Papa que saiba ouvir, que se desloque muito, que viaje muito. Um dos sucessos das igrejas pentecostais é que quando alguém entra num templo, três pessoas vão atendê-la. E na Igreja Católica? - questionou Lélis.

No Brasil, a proporção de católicos é maior entre as pessoas com mais de 40 anos, segundo o IBGE. Para o professor Jorge Cláudio Ribeiro, a Igreja tem que se aproximar mais dos jovens.

- As novas gerações estão afastadas da Igreja - afirmou Ribeiro.

rio tem menor percentual do país

De acordo com IBGE, o percentual de pessoas que se declararam católicas é maior entre homens (65,5%) que entre mulheres (63,8%). Em todas as outras religiões, as pessoas do sexo feminino formam a maioria. Segundo especialistas, isso é relevante porque normalmente as mulheres têm maior participação na vida religiosa.

- Normalmente, quem educa os filhos para a vida religiosa é a mãe. E as mulheres, por razões históricas, são mais religiosas que os homens em geral. Está havendo uma antipatia entre as mulheres e o catolicismo. Se uma mulher passa para a religião evangélica, por exemplo, ela leva a família com ela - diz o professor Ribeiro.

Especialistas afirmam que para o Papa Bento XVI, aparentemente, o crescimento do número de fiéis não é fator de preocupação.

- Para ele, massa não quer dizer nada. Não importa se for um grupo menor, desde que as pessoas sejam convictas na fé - analisa Altmeyer.

Segundo o IBGE, o Rio é o estado com menor percentual de católicos no país: 45,8%. Piauí é o estado com o maior índice, de 85,1%.