Título: Torturado na ditadura, ainda criança, filho de militante político morre em SP
Autor: Herdy, Thiago
Fonte: O Globo, 19/02/2013, País, p. 8

Carlos Alexandre não se recuperou dos maus-tratos sofridos quando tinha apenas 1 ano e 8 meses

Carlos Alexandre Azevedo, o Cacá, tinha 1 ano e 8 meses quando policiais invadiram a casa de sua avó, na Zona Sul de São Paulo, e o levaram para a sede do Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Dops), em janeiro de 1974, onde estavam presos os seus pais. Foi esbofeteado quando chorava e jogado ao chão durante a visita de militares de madrugada à casa da avó, em São Bernardo do Campo, em uma operação de identificação de possíveis aparelhos da resistência ao regime militar. Bateu a cabeça e nunca mais se recuperou, segundo o pai, o jornalista Dermi Azevedo, que contou a história no livro de memórias "Travessias torturadas", lançado no último ano.

Policiais que levaram o menino diziam que ele "já era doutrinado e perigoso", relatou a mãe, Darcy Andozia, que também foi processada sob acusação de dar proteção a militantes de esquerda, principalmente aos integrantes da ala progressista da Igreja Católica. Durante o tempo em que os pais ficaram presos, Carlos Alexandre foi criado pelos avós. Começou a procurar saber sobre o seu passado quando tinha entre 10 e 11 anos. As sequelas do que sofreu na infância se agravaram ao longo da vida.

Foi diagnosticado como portador de "fobia social" e tomou antidepressivos e antipsicóticos. Tinha dificuldade de criar laços de amizade, e trabalhou como operador de computadores, mas por pouco tempo. Carlos Alexandre recebeu indenização da Comissão da Anistia. Suicidou-se com uma overdose de remédios no último fim de semana, aos 40 anos.

- Meu coração sangra de dor - escreveu Dermi Azevedo em mensagem endereçada a amigos em sua conta no Facebook, onde atribuiu as agressões ao filho à "equipe do delegado Sérgio Fleury", chefe do Dops no período em que Carlos Alexandre foi preso e agredido.

O Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) divulgou nota em solidariedade à família em que diz que "hoje a ditadura militar concluiu a morte de Carlos iniciada em tão tenra idade" e acrescenta que o acontecimento "fortalece o empenho na luta por memória, verdade e justiça".

Presidente do Grupo Tortura Nunca Mais em São Paulo, Rose Nogueira disse ter recebido a notícia da morte de Carlos Alexandre com perplexidade e lembrou a seriedade do pai ao longo da vida, compartilhando do luto da família.

- Meus dois filhos foram presos quando eram crianças, e minha sobrinha nasceu dentro da prisão. Quem viveu essa experiência sabe que são traumas que carregaremos a vida inteira. Não é algo que você consegue superar - disse Maria Amélia Telles, ex-presa política.

- O suicídio é o limite da angústia - escreveu Dermi Azevedo na mensagem.

Maria Amélia disse admirar o amigo "por ter conseguido expor por escrito uma dor que não tem tamanho".