Título: Após vitória, Correa se apressa em mudar Lei de Comunicação
Autor: Costa, Mariana Timóteo
Fonte: O Globo, 19/02/2013, Mundo, p. 27

SIP diz que situação no Equador é tão ou mais grave que a da Venezuela

Reeleito por uma ampla margem e com seu partido abocanhando ao menos 90 das 137 cadeiras no Congresso, o presidente do Equador, Rafael Correa, tratou ontem de desmentir rumores de que tentará reformar a Constituição para disputar mais um mandato, em 2017. Mas ele e os aliados já ofereceram as diretrizes do que pretendem fazer com o domínio absoluto do Legislativo. Depois que Correa teceu duras críticas à imprensa, o presidente da Assembleia, Fernando Cordeiro, indicou, segundo o jornal "El Comercio", que pedirá às bancadas a convocação na próxima semana de uma sessão para definir a aprovação da Lei de Comunicação. O fato de Correa estar mais poderoso do que nunca para aprovar a lei que desejar aumentou o alerta entre as entidades de imprensa, diz Claudio Paolillo, presidente da Comissão de Liberdade de Imprensa e Informação da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP).

- A gente ainda não sabe se será a mesma lei formulada em 2010 ou se ela trará alterações. Mas sabemos que o presidente quer calar a imprensa independente. Correa encara qualquer reportagem ou opinião crítica a seu governo como fator de distorção social, obstáculo à sua "revolução cidadã". Estamos muito preocupados com o que virá pela frente - diz Paolillo, lembrando que a SIP, assim como outras entidades, têm pouco a fazer a não ser denunciar os graves abusos.

redistribuição de terras

A SIP considera a situação equatoriana "tão ou mais grave" do que a da Venezuela, segundo um de seus dirigentes. A lei de 2010, conhecida como "lei da mordaça", prevê a criação de um Conselho de Comunicação - integrado por funcionários apontados pelo governo - para verificar o que é publicado; aplicar multas a quem escrever reportagens difamatórias; exigir o diploma de jornalista; o fim de monopólios; e determinar ainda que os meios prestem contas, em suas páginas na internet, sobre sua "linha editorial" e "código de ética".

Se no discurso da vitória, Correa prometeu lutar pela nova lei que, segundo ele, traria uma "imprensa mais decente" ao país, ontem, em entrevista à TeleSur, disse que a "imprensa corrupta, composta por políticos disfarçados de jornalistas" foi uma das principais derrotadas da eleição.

- E a corrupção da imprensa não existe só no Equador, se vê também na Venezuela, na Bolívia e na Argentina. São oposições que estão contra governos progressistas - disse o presidente, declarando que no Equador "já não mandam mais banqueiros, meios de comunicação e empresários".

Dos 71% dos votos que haviam sido contados até à noite de ontem, Correa obteve 57% contra 23% do segundo colocado, o banqueiro Guillermo Lasso. É seu maior índice de aprovação desde a primeira eleição, em 2006. Correa teve seu primeiro mandato revalidado numa nova votação, em 2009, após a nova Carta - citada ontem pelo presidente, ao ser indagado se tentaria perpetuar-se no poder.

- De acordo com a Constituição, sim, será a última reeleição. E mesmo que assim não dissesse a Constituição, iria para casa depois de quatro anos - afirmou. - Se a Aliança País voltar a ganhar o governo, (minha presença) ofuscaria quem vier a me suceder, inclusive um opositor.

Mesmo assim, segundo analistas, Correa lutará para dar continuidade a seu modelo político. O cientista político Felipe Burbano cita o "governo personalista" que ele criou como obstáculo tanto para a "revolução cidadã" quanto para a oposição. Mas diz que, com respaldo popular e controle do Congresso, se a economia do país continuar crescendo, o presidente pode construir um sucessor:

- Já a oposição está numa situação complicada. O movimento de Correa passou por cima dos partidos tradicionais. Eles terão que começar do zero, percorrendo o país, buscando credibilidade e propondo uma plataforma alternativa.

Enquanto os altos preços do petróleo permitirem que ele agrade aos setores populares, a expectativa é que Correa entre numa colisão maior com instituições e setores da sociedade. Ontem, além de citar a Lei de Comunicação, ele mencionou a importância da aprovação de novo Código Penal, "para colocar mais polícia nos bairros" e "destituir juízes que soltam delinquentes".

Segundo Burbano, ainda estão em pauta um conjunto de leis de redistribuição de terras, que podem criar tensões com donos de propriedades, além de uma Lei das Águas, que daria ao Estado o controle sobre a sua distribuição.

A SIP está avaliando a situação e prometeu para os próximos dias um comunicado oficial sobre o que a reeleição de Correa representa para o futuro da liberdade de expressão no país.

- A fraude de uma eleição como esta não ocorre nas urnas e sim antes, quando o Estado usa todo o seu poder e recurso para aumentar gastos com autopropaganda e assistencialismo, perseguir vozes contrárias a ele. Esta combinação de fatores tornou Rafael Correa imbatível. Isso, a nosso ver, não é democracia - diz Claudio Paolillo.

A presidente Dilma Rousseff ligou ontem para cumprimentar Correa. Segundo a Secretaria de Comunicação da Presidência, ela disse ao equatoriano que sua reeleição significou uma vitória para a democracia na região. O presidente aproveitou para convidar Dilma para visitá-lo em breve. Ela aceitou.

- A eleição demonstra clara opção do país pelo desenvolvimento social - disse Dilma.