Título: Estado precisa recuper ar o controle dos presídios
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Fonte: O Globo, 17/02/2013, Opinião, p. 14

A pane penitenciária do país decorre de injunções que vão da superlotação dos presídios à manutenção de um sistema que, de correcional, tem muito pouco. Nele, convivem bandidos perigosos e presos que cumprem penas por crimes de menor gravidade, geralmente em instalações que dão às unidades de apenamento a aparência de masmorras medievais, imagem criada pelo próprio ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para descrever a rede prisional, sob responsabilidade de sua Pasta.

O grave problema dos desrespeitos a elementares direitos dos presidiários é um dos aspectos da questão; outro, no terreno da gestão, é a virtual falência da capacidade do Estado de assegurar o controle, administrativo e disciplinar sobre a população carcerária em boa parte das unidades prisionais do país.

No primeiro caso, o desapreço do poder público pelas condições em que são mantidos cerca de 500 mil detentos é fator de demandas que, em geral, ficam circunscritas ao sistema (manifestando-se, por exemplo, em sistemáticas explosões de violência da massa de presos). Mas, no segundo, a leniência das autoridades penitenciárias com o poder de vida e morte que presos ligados ao crime organizado detêm dentro das prisões se reflete tanto interna-mente quanto fora dos muros das cadeias.

De dentro de suas celas, chefes de quadrilhas não só preservam o controle sobre as atividades dos respectivos bandos nas comunidades sob seu domínio, como organizam demonstrações de violência contra a sociedade. No Rio, de prisões tidas como capazes de seccionar a ligação entre os chefões e seus asseclas, como o complexo penitenciário de Bangu, já saíram demonstrações de força desses presos, com reflexos para muito além das grades.

Na prática, a prisão havia sido convertida em “escritório do crime”. O problema não é pontual, mas sistêmico. Foi de celas de presídios supostamente inexpugnáveis que chefões do tráfico fluminense ordenaram a execução da série de atos terroristas em 2010, contra a qual o poder público reagiu com a ocupação do Complexo do Alemão. A principal facção do crime organizado em São Paulo, por sua vez, também emite sinais de guerra de dentro das celas. O mesmo tem acontecido no Nordeste. A preocupante e crescente onda de violência em Santa Catarina é nova evidência de que o estado está perdendo o domínio interno dos presídios.

De dentro das prisões catarinenses partem as ordens dos chefes de quadrilhas para atos que, à semelhança de Rio e São Paulo, aterrorizam a população e tentam emparedar as autoridades . Blindar de fato as cadeias, em todo o sistema penitenciário do país, enfrentar suas crônicas demandas (físicas, gerenciais e disciplinares) e retomar o controle do sistema é tarefa urgente do poder público.