Título: Fala de Mantega sobre juros cria volatilidade, dizem economistas
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 17/02/2013, Economia, p. 34

Mercado financeiro se preocupa com desencontro entre Fazenda e BC

HENRIQUE GOMES BATISTA ROBERTA SCRIVANO

RIO E SÃO PAULO- Para economistas, a fala do ministro Guido Mantega em Moscou, onde disse que o governo fará o que for preciso para controlar a inflação, inclusive elevar a taxa básica de juros (Selic ), pode provocar nervosismo e causar uma volatilidade desnecessária à economia brasileira. Mantega afirmou que o câmbio não é o instrumento para o controle da inflação, mas sim os juros, e que o “Banco Central (BC) tem de ficar vigilante e, se não houver uma queda de inflação espontaneamente , ele tomará as devidas providências ”.

Além de demonstrar um descompasso da Fazenda com o BC —que em suas últimas comunicações, como a ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), previu a Selic no piso de 7,25% ao ano por um longo período — pode, para alguns, significar algo ainda pior: a falta de rumo da política macro-econômica. A estratégia é ora focada na retomada do crescimento , ora preocupada com a elevação dos preços e ainda, por vezes, mais interessada em utilizar o câmbio como política industrial.

Mais que uma falha de comunicação, dizem especialistas, a frase de Mantega coloca em xeque, de certa maneira, os princípios da economia, como a perseguição do centro da meta da inflação, de 4,5%, o câmbio flutuante e a independência do BC. Além de abalar a credibilidade dos instrumentos de comunicação da políti-ca econômica com o mercado, como as atas do Copom e os relatórios de inflação. — Esses pronunciamentos erráticos são ruins, criam confusão. Começa que não cabe ao ministro da Fazenda falar de juros, uma atribuição do Banco Central. Isso aumenta a volatilidade, uma volatilidade desnecessária, que gera prêmio de risco — afirmou Carlos Thadeu de Frei-tas, economista da Confederação nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor do BC. Ele lembra que, desde que Mantega começou a falar sobre uma espécie de “piso ” para o dólar — R$ 1,85 —, os juros futuros não param de subir. De fato, os contratos de DI para janeiro de 2014 passaram de 7,12% ao ano em 10 de janeiro para 7,62% no fechamento do mercado na sexta-feira.

Os contratos de janeiro de 2015 passaram de 7,74% ao ano no dia 10 do mês passado para os atuais 8,29% ao ano. — Algumas pessoas já estão prevendo Selic a 9% no fim do ano, o que começa a deixar de ser algo improvável. Isso é um problema, o que mais afasta investimento é a expectativa de taxas de longo prazo — disse. Armando Castelar , professor de economia da FGV e da UFRJ, lembra que expectativa é muito importante para a economia. E diz que o governo não está conseguindo trabalhar essas expectativas: — Mais que um erro de comunicação, isso mostra que o governo está inseguro para aonde sua política econômica deve ir .

O desencontro dos discursos de Mantega, e do presidente do BC, Alexandre Tombini, preocupa o mercado e confunde as expectativas sobre o tripé macroeconômico básico: juro, câmbio e inflação. Essa é a opinião de Clodoir Vieira, economista-chefe da corretora Souza Barros. — O juro futuro subiu forte na sexta-feira porque o Mantega falou sobre seu receio com a alta dos preços. Mas as atas do Copom garantem que a taxa básica (Selic) se manterá no atual patamar por um longo período — explicou. Vieira está no time dos que preferem acreditar na ata do BC e refutam a possibilidade de uma alta imediata da Selic. Ele estima que esta fechará dezembro em 7,5% ao ano.

Ao mesmo tempo, afirmou, tentar controlar a inflação apenas com o câmbio, como o BC tem feito, não traz efeitos. — Vai ser difícil fecharmos este ano com a inflação dentro da meta governamental. Em uma conta bem simples, se considerarmos o ritmo de alta dos preços dos últimos três meses e projetarmos o índice, vemos que 2013 terá 9,50% anuais de inflação — disse.