Título: Governo busca investidores em NY
Autor: Ennes, Juliana
Fonte: O Globo, 27/02/2013, Economia, p. 26

O governo brasileiro deu início ontem, em Nova York, à rodada internacional de apresentação a investidores e representantes do mercado financeiro do pacote de concessões do setor de infraestrutura - de geração e transmissão de energia elétrica e de petróleo e gás, na construção de estradas, ferrovias, portos e aeroportos, além da construção do trem de alta velocidade -, que pode chegar a US$ 235 bilhões, de acordo com o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

O governo espera ampliar a participação do setor privado na concessão de financiamentos, com possibilidade de os bancos privados receberem aportes de recursos sem a intermediação do BNDES, a exemplo do que já acontece com o setor agrícola. O presidente do banco de fomento, Luciano Coutinho, acredita ter chegado a hora de as instituições financeiras privadas terem liderança no processo de estruturação do financiamento, dado o volume necessário de investimentos, possível somente com a entrada de novos players , segundo ele.

correção de distorções

Com cerca de 300 pessoas no road show , representantes do governo apresentaram projetos otimistas de investimento. Embora muitos investidores estejam interessados no Brasil, ainda é recorrente o ceticismo quanto à capacidade de o país de tirar os projetos do papel.

Um advogado que representa investidores americanos queixou-se das mudanças de regras no mercado brasileiro. Em seu discurso e durante a entrevista coletiva, o ministro da Fazenda defendeu as mudanças realizadas pelo governo para a redução da tarifa de energia elétrica, alegando ter sido dada a opção de manutenção do contrato anterior.

- Nem neste, nem em qualquer outro setor houve quebra de contratos - afirmou Mantega.

Nem todos os investidores concordam. O advogado disse que, tecnicamente, pode não ter havido quebra contratual, mas houve mudança de regras:

- Eles apontaram uma arma para a cabeça dos concessionários. Esse tipo de ação preocupa.

Além disso, a rentabilidade esperada para os projetos de infraestrutura, a partir de 10% reais ao ano, não foi considerada tão boa por um representante de fundos asiáticos, quando comparada à emissão de equity em outros países, como a Colômbia, por exemplo.

Durante a apresentação aos investidores internacionais, o ministro da Fazenda disse que o governo brasileiro tem corrigido três grandes distorções que existiam na economia brasileira ao estabilizar a taxa de juros em um patamar mais baixo, diminuir a volatilidade cambial e reduzir a carga tributária, facilitando os investimentos.

- Estamos pondo em prática no Brasil nova política macroeconômica que estimula o crescimento, com combinação de taxa de juros mais baixa - afirmou Mantega, acrescentando que a queda da taxa de juros ajuda a levar o câmbio para um patamar de "maior equilíbrio", já que anteriormente, com a taxa muito elevada, havia uma "atração exagerada de capital". - Hoje temos um câmbio estabilizado em patamar mais realista e com baixa volatilidade. O câmbio é flutuante, mas com baixa volatilidade.

O ministro afirmou que continuará com os esforços para reduzir o custo tributário no Brasil. Mantega também se mostrou confiante na aprovação da reforma do ICMS, em tramitação no Senado.

Coutinho: "fonte privada competindo"

Há algumas opções para a entrada do setor privado nos financiamentos, de acordo com Coutinho. Assim que definido um vencedor no leilão, os empreendedores deverão precisar de recursos para o projeto, podendo emitir debêntures ou ações. O governo já isentou as chamadas debêntures incentivadas de Imposto de Renda e de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para aumentar o volume de emissões.

- É oportunidade para investidores estratégicos, brasileiros ou estrangeiros - disse Coutinho.

Bancos privados poderão oferecer também o chamado empréstimo-ponte para os recursos de curto prazo necessários no início de uma obra de infraestrutura. Além disso, a expectativa do governo é que os bancos privados participem dos financiamentos de longo prazo, nos quais poderão trabalhar no que o governo chamou de "sindicalização", com a atuação conjunta de instituições públicas e privadas. Coutinho diferenciou também as emissões realizadas pelas holdings que participarem dos leilões de concessão daquelas feitas pelas empresas de propósito específico, aumentando a possibilidade de participação do setor privado.

De acordo com Mantega, o governo estuda uma maneira para que os recursos cheguem aos bancos privados também diretamente, pois atualmente já trabalham em conjunto com o BNDES.

- Estamos estudando isso. É como acontece no setor agrícola. No Plano Safra, o financiamento vai direto para todos os bancos que querem acessar os recursos, sem passar necessariamente pelo BNDES - disse o ministro.

Para Coutinho, se os bancos privados se tornassem repassadores de recursos do Tesouro, sem ser via BNDES, seria interessante. Se eles usarem os recursos do compulsório, poderão obter outras fontes. Como há muita liquidez no mundo, os bancos poderão, em alguns casos, obter recursos em moeda estrangeira e repassar recursos de longo prazo em reais, de acordo com Coutinho.

- Para desafogar o BNDES, também para ter mais concorrência. Os bancos podem não apenas ser emprestadores, mas também ser os grandes estruturadores de produtos, de debêntures. Compondo as fontes, eles têm mais agilidade de estruturar a operação de mercado de capitais.

Segundo o presidente do BNDES, a intenção do governo é facilitar a transição do sistema financeiro brasileiro em direção a prazos mais longos, habilitando os bancos e, principalmente, o mercado de capitais para poder chegar nessas operações em uma escala crescente.

- A fonte de compulsório vai ser uma fonte altamente competitiva. Isso é que é importante. Vai haver uma fonte privada competindo. Vai ter o Banco do Brasil e a Caixa competindo. Eles têm fontes importantes.