Título: Foi uma piada
Autor: Batista, Henrique Gomes; Paula, Nice de
Fonte: O Globo, 02/03/2013, Economia, p. 25

A economia brasileira cresceu 0,9% em 2012 - o pior resultado desde a recessão de 2009 - e o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços) chegou a R$ 4,403 trilhões. Em 2011, o avanço também foi pequeno: 2,7%. Apesar de todos os incentivos, o resultado foi abaixo do esperado anteriormente pelo próprio governo e fez o PIB per capita ficar praticamente estável, com alta de 0,1% sobre 2011, chegando a R$ 22.402. O número ficou abaixo das projeções de junho do banco Credit Suisse, de alta de 1,5%, que foi classificada, à época, como "piada" por Guido Mantega, pois o titular da Fazenda garantia que o resultado seria muito melhor.

Mas essa "piada" custou ao Brasil o posto de sexta maior economia do planeta. Nem mesmo a leve recuperação do último trimestre do ano passado evitou que diversos analistas revisassem para baixo as expectativas de crescimento para 2013, para perto de 3%, motivados principalmente pela baixa do investimento, que voltou aos patamares dos piores momentos da crise global de quatro anos atrás, com recuo de 4% em 2012. No segundo ano seguido de crescimento baixo no seu governo, a presidente Dilma Rousseff não fez comentários sobre o resultado da economia brasileira.

Construção civil caiu

Nos últimos três meses de 2012, o PIB cresceu 0,6% na comparação com o terceiro trimestre, que por sua vez havia apresentado alta de 0,4% sobre o período anterior. Mas essa aceleração, afirmam, ocorreu em velocidade aquém da necessária para dar ao país um ritmo de crescimento sustentável e dentro do esperado pelo próprio governo, na casa de 4% ao ano: anualizada, a taxa do quarto trimestre, mesmo com a recuperação, chegou apenas 2,4%.

O destaque positivo foi a alta de 0,5% no investimento na comparação com o terceiro trimestre de 2012, após cinco trimestres seguidos de baixa. A indústria também apresentou, nesta comparação, alta de 0,4%, embora a indústria de transformação e a construção civil tivessem desempenhos negativos, com queda de 0,5% cada uma.

- É preciso ser cauteloso, mas na margem houve uma mudança e pode ser um sinal de que estamos tendo uma retomada - disse Roberto Olinto, coordenador de Contas Nacionais do IBGE.

José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, acredita que quem consegue enxergar nos números do IBGE uma retomada de crescimento mais vigoroso tem "olhos mágicos":

- O resultado veio sem surpresas e mostra que, na melhor das hipóteses, cresceremos 3% neste ano.

Governo consome mais que famílias

Enquanto em 2012 o consumo das famílias apresentou alta de 3,1% e os gastos do governo avançaram 3,2%, os investimentos caíram 4%. A produção industrial do país recuou 0,8% - na indústria da transformação a queda foi ainda maior, de 2,5% - e a agricultura apresentou retração de 2,3%. Do lado da oferta, o único destaque foram os serviços, que apresentaram alta de 1,7%.

- Este foi o terceiro pior resultado da economia em 12 anos. O país cresceu apenas 0,9% apesar de todos os incentivos do governo, em parte porque estes incentivos foram feitos de qualquer maneira, sem uma estratégia, focados no consumo, mas sem objetivos claros - afirmou Mônica de Bolle, economista da Galanto Consultoria.

Para Mônica, os exemplos mais gritantes dos desequilíbrios na economia são as quedas da taxa de investimento, que passou de 19,3% do PIB em 2011 para 18,1% no ano passado, mesmo patamar de 2009, e da taxa da poupança, que desabou de 17,2% para 14,8% do PIB no ano passado, pior resultado desde 2002. Fábio Kanzuc, professor da FEA/USP, acredita que, com investimentos de 18% do PIB, a economia cresce apenas 2%.

- A forte queda na taxa de poupança, e consequentemente do investimento, não é causalidade, casa justamente com a informação de que os gastos do governo cresceram em velocidade maior que o consumo das famílias. Parte deste resultado fraco do PIB é consequência do aumento do gasto público - afirmou Roberto Padovani, economista do Banco Votorantim.

Os gastos do governo crescendo acima do consumo das famílias era um fato que não ocorria desde 2004. Uma das causas, diz Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais do IBGE, foi o aumento no número de funcionários públicos em 2012.

Leonardo Carvalho, economista do Ipea, afirma que a leve recuperação do PIB no quarto trimestre já garante para este ano um crescimento de 1%, ou seja, se o país não crescer nada este ano, vai herdar expansão do ano anterior. Ele acredita que a grande diferença deste ano em relação ao início de 2012 é o fato de as empresas estarem com os estoques baixos:

- Este ano está começando sem o acúmulo indesejável de estoques e temos um indicador de aumento de 1,5% na produção industrial de janeiro - disse.

Alexandre Maia, da GAP Asset Management, diz que o futuro é incerto :

- Temos que ser mais modestos nas nossas pretensões de crescimento potencial, a menos que tenhamos uma agenda de produtividade e de competitividade, nosso equilíbrio do crescimento ainda está muito aquém do que poderia.

Previsão se realiza

De piada a sonho. Assim pode ser resumido o rebuliço provocado em junho passado, quando o banco Credit Suisse reduziu sua previsão para o crescimento da economia brasileira em 2012 de 2% para 1,5%. Na época, o Boletim Focus, do Banco Central, estimava expansão do PIB em 2,3%. Por isso, a nova projeção provocou polêmica. Principalmente, por causa da reação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que não hesitou em classificar o 1,5% como “piada”.

— Acho que é uma piada. Vamos crescer muito mais — disse o ministro no dia seguinte à divulgação do relatório do banco suíço, que já citava a desaceleração do investimento.

O economista-chefe do Credit Suisse no Brasil, Nilson Teixeira, já havia sido um dos primeiros a prever, em 2011, que a economia cresceria menos de 3% naquele ano. A expansão foi de 2,7%. Para alguns, Teixeira lembrou o economista Nouriel Roubini, o “Dr. Catástrofe”, o primeiro a prever a crise mundial de 2008.

Para este ano, Teixeira se coloca na ponta mais otimista dos analistas, ao dizer que haverá uma expansão de 4%, contra média de 3% do resto do mercado e até do governo.