Título: Cresce pressão por divulgação de dossiê
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 06/03/2013, Mundo, p. 26

Os apelos de cardeais brasileiros para que os responsáveis por eleger o próximo Papa tenham acesso ao dossiê sobre o VatiLeaks - o escândalo de vazamento de documentos sigilosos que abalou o papado de Bento XVI - ganharam o apoio de outros importantes participantes do próximo conclave, mas até agora não foram atendidos pela cúpula da Igreja Católica.

As tentativas de um grupo de cardeais de peso de obter informações precisas sobre o dossiê secreto que Bento XVI deixou para seu sucessor, que contêm informações comprometedoras para a Igreja, encontraram resistências por parte da Cúria Romana. Tudo o que os cardeais conseguiram foram respostas vagas.

Estas revelações foram feitas ontem por Andrea Tornielli, do jornal "La Stampa", considerado um dos vaticanistas mais bem informados. O pedido teria acontecido logo nas primeiras horas do encontro preparatório para o conclave que vai eleger o próximo Papa, conhecido como congregações gerais.

Sob o título de "Explode o caso VatiLeaks - os cardeais querem saber", Tornelli revelou que o pedido foi feito pelo alemão Walter Kasper, o austríaco Christoph Schönborn e o húngaro Peter Erdö - estes dois últimos frequentemente citados como possíveis sucessores de Bento XVI.

"Um pedido que precisa ser lido em filigrana: eles representam, de fato, uma vontade comum de muitos cardeais que vêm de fora da Itália, dispostos a discutir com mais detalhes os escândalos que recentemente assolaram a Cúria Romana", escreveu Tornielli.

No domingo, os cardeais brasileiros Geraldo Majella e Raymundo Damasceno haviam frisado que não apenas eles queriam saber o conteúdo do dossiê.

Outro grande jornal italiano, "La Repubblica", destacou o clima de inquietação no encontro, sob o título "Tensão nas Congregações". O jornal entrou em detalhes sobre um encontro que, supostamente, deveria ser sigiloso. Todos os cardeais beijaram o Evangelho prometendo segredo sobre o conteúdo das reuniões.

O "La Repubblica" citou os mesmos três cardeais pressionando por esclarecimentos sobre o dossiê. Alguns não acreditam que o mordomo do Papa, considerado culpado pelo vazamento de documentos, tenha agido sozinho, o que expôs intrigas internas na Cúria.

Segundo o jornal, as respostas do cardeal Julian Herranz Casado, chefe da comissão que investigou o caso, foram "completamente evasivas". O italiano Angelo Sodano, decano que comanda as reuniões preparatórias, teria feito uma "forte defesa da máquina de governo do Vaticano".

Cinco cardeais - o egípcio Antonios Naguib, o alemão Karl Lehmann, o vietnamita Jean-Baptiste Pham Minn-Man, o polonês Kazimierz Nycz e o chinês John Tong Kong - ainda não haviam chegado em Roma ontem, 21 dias após Bento XVI anunciar sua renúncia. Na segunda-feira, primeiro dia do encontro preparatório, 12 estavam ausentes.

Tornielli, do "La Stampa", estranhou as ausências. Lembrando que o mundo inteiro sabia que o Papa renunciaria no dia 28 de fevereiro, ele perguntou:

- Por que nenhum (dos cardeais ausentes) se apresentou na segunda-feira de manhã (dia 4)? Por que nenhum deles veio para o último adeus ao pontífice demissionário na manhã do dia 28?

A ausência de uma explicação convincente do Vaticano e dos cardeais ausentes abriu espaço para especulações: alguns jornalistas italianos imaginavam que as ausências eram um ato deliberado da parte dos cardeais, que não gostariam que a eleição do Papa seja apressada, sem tempo suficiente para discutir os escândalos.

O porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, esclareceu ontem que não é necessária a presença de todos os cardeais para decidir a data do conclave.

- Mas é necessário que se tenha dado a todos aqueles que decidiram participar o tempo de chegar.

Não houve sessões à tarde do encontro preparatório ontem. E nem haverá hoje. O porta-voz do Vaticano confirmou que os cardeais querem tempo para discutir. A data para o início do conclave provavelmente só será decidida a partir de amanhã.

- Os cardeais não querem apressar as coisas - disse Lombardi.

O cardeal Walter Kasper confirmou à imprensa italiana:

- Para se conhecer é preciso tempo, a eleição de um Papa não pode acontecer na pressa e na fúria.

Enquanto isso, o Vaticano segue nos preparativos para o grande dia - o conclave. A capela Sistina fechou ontem para os turistas às 13h. Agora, aqueles que quiserem vir à Roma para visitar os grandes monumentos no Vaticano terão que esperar a eleição do novo Pontífice.