Título: Pagamentos suspensos
Autor: Batista, Henrique Gomes; Cabral, Renata
Fonte: O Globo, 08/03/2013, Economia, p. 25

O Rio já sofre com a perda dos royalties do petróleo: ontem, o governador Sérgio Cabral (PMDB) determinou a suspensão de todos os pagamentos do estado, mantendo em dia apenas salários de servidores e transferências a municípios. A decisão do governador ocorre no dia seguinte à derrubada, pelo Congresso, dos vetos da presidente Dilma Rousseff à lei que fixou novas regras de distribuição dos recursos do petróleo, inclusive para campos já licitados. Os cortes, que pegaram de surpresa até secretários de governo, serão indiscriminados e atingirão da mesma forma o pagamento de merenda e material hospitalar, investimentos, viagens e mobiliário, por exemplo. Apenas ontem deixaram de ser pagos R$ 82 milhões, de um total de R$ 470 milhões previstos para este mês.

- É o caos para o governo do Estado, é o caos para os seus municípios. Eu não consigo compreender o que leva a se tomar uma decisão dessa (a derrubada do veto) que não resolverá o problema de nenhum estado brasileiro, de nenhum município brasileiro, e leva a falência um governo do Estado e muitas das prefeituras do Estado - disse o governador ontem pela manhã, afirmando que os recursos do petróleo significam até um quarto da receita líquida de seu governo.

Como a nova regra de distribuição dos royalties ainda depende da publicação da derrubada dos vetos no Diário Oficial, a queda na arrecadação não é imediata. Por isso, a determinação da suspensão imediata do pagamento de despesas pelo governador Cabral está sendo interpretada por interlocutores como um instrumento de pressão, já que o estado irá ao Supremo Tribunal Federal contra a lei dos royalties.

A Secretaria da Fazenda afirmou, em nota, que a suspensão ocorre por tempo indeterminado. "A Secretaria de Fazenda informa que suspendeu todos os pagamentos agendados para hoje, com exceção dos relativos a despesas de pessoal.(...) Os pagamentos estão suspensos até que se tenha clareza do fluxo de recursos com que o Estado poderá efetivamente contar para honrar seus compromissos", explica. O órgão, contudo, não informou quais contratos já foram afetados e quais serão as consequência da suspensão destes pagamentos, tanto no fornecimento de serviços, como no impacto com multas e juros. A princípio, segundo fontes do governo, a suspensão ocorrerá pelo menos até que o STF comece a avaliar o caso.

cortes e desequilíbrio em ES e SP

No Rio, a perda de receitas está estimada em R$ 75 bilhões até 2020. Apenas este ano, o estado perde R$ 1,4 bilhão, e os municípios, R$ 1,5 bilhão. Já o governo do estado e os municípios capixabas perderão R$ 10 bilhões até 2020, cifra próxima do prejuízo do governo paulista e de seus municípios no período (R$ 10,6 bilhões), segundo cálculos de especialistas.

De acordo com o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), haverá um ato político para marcar a entrega das ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) contra a nova lei. Cada estado terá seu próprio processo. Casagrande planeja ir pessoalmente ao encontro do presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, ao lado de Cabral e do governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB), quando aproveitarão para conversar com o ministro sobre a causa. Apesar de dizer que está confiante em uma decisão liminar no STF, Casagrande também já planeja cortes.

- Vamos ter que cortar 10% de nosso custeio e parte de nossos investimentos com recursos próprios. Isso afetará o povo capixaba. Somente de custeio seria algo em torno de R$ 200 milhões . Não vamos cortar salários, saúde ou educação, mas outros serviços que vão prejudicar a população - disse.

Em São Paulo, Alckmin disse que a ação que será proposta pelo governo contra a nova divisão dos recursos do petróleo está "praticamente pronta" e terá como base de argumentação o desequilíbrio orçamentário que a mudança das regras causará aos estados e municípios produtores de petróleo.

- Os estados e municípios já contam com os recursos dos royalties no PPA (Plano Plurianual) e na lei orçamentária. Mudar essa regra, tirar esses recursos agora causará um desequilíbrio. É possível ter uma nova regra mas para novos contratos. Vamos defender esse argumento - disse Alckmin .

O secretário de Energia de São Paulo, José Aníbal, criticou a derrubada do veto e disse que "nem a racionalidade nem a melhoria da vida dos brasileiros foram a centralidade desse processo". Sobre a decisão de Cabral, de suspender os pagamentos governamentais, Aníbal disse que "há razão na medida".

- O Rio tem hoje uma participação expressiva dos royalties, que é de bilhões, não milhões. Não sabemos o quanto o estado se preparou para uma decisão assim. Nós podemos encarar essa decisão como uma coisa preventiva, um freio de arrumação - afirmou.

O secretário de Desenvolvimento do estado do Rio, Júlio Bueno, lamentou a derrubada do veto e classificou a atitude dos parlamentares que representam os estados não produtores como oportunista e imediatista:

- Agora, o Supremo terá que resolver. Se ele mantiver o veto, aí é sentar e chorar. Mas temos a presidente Dilma do nosso lado, que alegou inconstitucionalidade. O que levou (os estados não produtores) a brigar pelos royalties foi o imediatismo e o oportunismo, além da carência de recursos

união pode elevar repasses ao Rio

O prefeito do Rio, Eduardo Paes, afirmou que o Congresso "se apequenou" ao rejeitar os vetos de Dilma. Paes disse que a cidade não terá suas finanças paralisadas pela decisão, já que a arrecadação dos royalties fica entre R$ 100 milhões e R$ 150 milhões, e garantiu que substituirá os recursos para obras.

- Tenho certeza que o Supremo vai fazer justiça e impedir que esse assalto, essa tunga, aconteça no Rio de Janeiro.

Em Brasília, fontes da área econômica afirmam que o governo federal não vai deixar o Rio "à mingua", caso o estado perca a questão no STF. O principal argumento para um possível apoio do Planalto é o fato de a população sofrer com as perdas dos royalties. O caminho cogitado é aproveitar os convênios que o estado tem com o governo federal. A ideia é incrementar os repasses por essas vias.

A decisão anunciada ontem por Cabral, de suspender os pagamentos, foi mal recebida na equipe econômica. Na avaliação de interlocutores, a medida só piora a situação do estado, porque os fornecedores não têm culpa e podem entrar com ações contra o governo.