Título: Cardeal com ares de Papa
Autor: Berlinck, Deborah; Eichenberg, Fernando
Fonte: O Globo, 11/03/2013, Mundo, p. 26

Eleição de Papa não tem pesquisa nem boca de urna. Mas se Igreja cheia é uma indicação, o brasileiro Odilo Scherer está bem posicionado na reta final da corrida para o comando do Vaticano. Ontem, sua chegada na Igreja Santo André do Quirinale, para celebrar sua última missa para o público em Roma antes do conclave que escolherá o futuro Pontífice, parecia a entrada em cena de uma estrela pop: câmeras, flashes e um batalhão de jornalistas de vários países disputando entrevistas. A imprensa era mais numerosa do que os fiéis. Bem-humorado, dom Odilo brincou:

- Nunca vi tanto jornalista interessado em missa.

O cardeal Cláudio Hummes, que no conclave de 2005 era o brasileiro mais cotado, também celebrou missa. Mas reuniu apenas 50 pessoas e duas equipes de jornalistas: do GLOBO e da TV católica Canção Nova. Ao final da celebração, muitos fiéis perguntavam aos padres da igreja "quem havia feito o sermão". Na igreja onde estava Scherer, os fiéis não tiveram dúvidas: estavam diante de um "papável". No sermão do arcebispo de São Paulo, duas expressões foram recorrentes: fé na Igreja e perdão.

- Fé na Igreja, que faça bem sua missão - disse.

Apresentado pela mídia italiana como o candidato da situação da Cúria romana, o brasileiro definiu o momento atual da Igreja como "muito bonito".

- Vivemos um momento de alegria e cheio de esperança. A quaresma, em preparação para a Páscoa da ressurreição, convida para a reconciliação e para a busca do perdão de Deus, que é infinito - afirmou Scherer.

Fiéis seguidores

O arcebispo de São Paulo não atraiu apenas os fiéis de Deus. Na pequena igreja do século XVII, desenhada por um dos maiores artistas da Itália, Bernini, estavam também seus fiéis seguidores, como a romana Maria Vadala, de 66 anos, que o conhece desde os anos 1990, quando Scherer foi padre na paróquia que ela e o marido (já falecido) frequentavam na capital - a igreja de Santi Patroni.

- Dei um beijo nele, e disse: "Deixa eu te dar um beijo agora, porque depois que você virar Papa não vou mais poder" - contou.

Maria descreveu Scherer como uma pessoa de "grande simplicidade", que deixou sua marca como um "carismático", com visão global da Igreja.

- A Igreja precisa de alguém com energia como ele, inclusive física - opinou Maria.

O padre João Maria do Nascimento, de 42 anos e originário de Natal, não escondia o entusiasmo com a possibilidade de um brasileiro ser nomeado Papa. Em matéria de fé, frisou, não muda nada se o Papa for brasileiro, africano, italiano ou americano. Mas ele não resistiu e acrescentou:

- Como somos um povo bairrista, seria uma grande alegria. Deus é brasileiro, agora falta o Papa!

Ao final da missa, rezada em italiano, Scherer fez sua única menção ao conclave: pediu que todos rezassem pelos cardeais - "para que sejam iluminados pelo Espírito Santo" - e por Bento XVI.

Dois dias antes de se trancarem na Capela Sistina, vários cardeais destacados rezaram missas em Roma. Jornalistas de vários países (já são mais de 5 mil) passaram o dia de uma igreja para outra à caça de declarações de "papáveis".

Outro brasileiro cotado no conclave, João Braz de Aviz - prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica - optou por celebrar uma missa privada no sábado. Não foi visto ontem.

campanha para americano

O italiano que mais ameaça as chances de Scherer de chegar ao comando do Vaticano, Angelo Scola, celebrou sua missa na Basílica de Santi Apostoli. Ele também pediu aos fiéis que rezassem pela escolha do novo Papa:

- O conclave é agora iminente. Rezemos para que o Espírito Santo ofereça à sua Igreja o homem que poderá conduzir os passos marcados pelos grandes Papas dos últimos 150 anos.

O húngaro Peter Erdö, outra possível surpresa no conclave, disse em missa na igreja Santa Balbina:

- Temos que nos levantar, erguer nossas cabeças e, se não encontrarmos o caminho que conduz para casa, temos que perguntar qual é o bom caminho que leva da porta da prisão à verdadeira casa.

O cardeal americano Sean Patrick O"Malley também recebeu tratamento especial em Roma. Ao chegar a uma missa, ouviu do pároco local, Rocco Visca, que ele esperava que esta fosse sua "última visita como cardeal". O"Malley, porém, foi modesto. Sobre suas chances no conclave, disse:

- Vou voltar para Boston.

Já o arcebispo de Nova York, Timothy Dolan, contou "esperar um conclave breve". Em missa na igreja Nossa Senhora de Guadalupe, fez várias gracinhas, ao dizer, por exemplo, que pensava em levar um saquinho de caramelos para a reunião. Ao ver a numerosa audiência, comentou, com bom-humor:

- Vejo uma multidão, vamos fazer duas coletas.