Título: Brasil sem proposta para Copenhague
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Fonte: Correio Braziliense, 22/10/2009, Opinião, p. 30

O Brasil corre o risco de protagonizar um vexame internacional muito em breve. Na vanguarda mundial no uso de energia limpa, líder em biocombustíveis, sede da maior floresta tropical do planeta, ator global em ascensão, o país é aguardado com expectativa em Copenhague, na Dinamarca, em dezembro, para a 15ª conferência dos países que integram a Convenção do Clima, de 1992. Espera-se que Brasília cumpra papel determinante naquela que é considerada a última oportunidade de superação do fracasso do Protocolo de Kyoto, derradeira chance de se chegar a um acordo de fato capaz de, pelo menos, impedir o agravamento do aquecimento global. Mas o governo escorrega na elaboração de um projeto, até aqui resumido a não mais do que um rol de boas intenções.

Faltam menos de dois meses para a Conferência das Partes da Convenção do Clima (COP 15). Contudo, o prazo para a apresentação de propostas é ainda mais exíguo. Já em novembro, na própria capital dinamarquesa, haverá uma pré-COP. Ali, na verdade, é que devem se travar os debates e ser costurado um acordo que os chefes de Estado e de governo tenham, apenas, que homologar no mês seguinte. A questão é crucial para a humanidade. Não há tempo a perder. A temperatura da Terra subiu 0,7°C. Cientistas preveem uma série de catástrofes caso essa escalada atinja os 2°C. Há dois anos, as Nações Unidas alertaram para o risco de um aumento entre 1,8°C e 4°C até o fim do século. Em setembro último, o Centro Hadley, mais importante do Reino Unido sobre mudança climática, foi decisivo: ou se reduzem drasticamente as emissões de carbono, ou o clima estará 4°C mais quente já em 50 anos.

No contexto internacional, o impasse entre países ricos e emergentes empurra a todos para a derrota. No Brasil, que poderia liderar uma saída, interesses econômicos se chocam enquanto o governo, em vez de mediar o conflito, é acusado de tentar agradar a gregos e a troianos. Desde o ano passado no Congresso, o Plano Nacional de Mudanças Climáticas ainda aguarda a instalação de comissão especial para ser analisado na Câmara. Líder do Partido Verde na Casa, o deputado Sarney Filho (MA) diz que o Executivo não assume uma meta objetiva de redução de emissão de gases poluentes para não ficar em saia justa, inclusive com parceiros do Bric (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Outra questão é a indefinição quanto às fontes de financiamento. ¿Estamos muito focados na contribuição internacional, mas sem uma política de verdade não veremos a cor do dinheiro¿, alerta Rodrigo Lima, gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Ícone).

No vácuo do vacilo governamental, o país experimenta situação peculiar. Enquanto governos de outras nações enfrentam o lobby de grandes grupos empresariais, temerosos dos encargos financeiros acarretados pelas adaptações da produção a um mundo menos poluidor, aqui ocorre justamente o contrário. Premidas pela competição do mundo globalizado, em que consumidores atentos cada vez são mais exigentes na escolha de produtos menos poluentes, 22 empresas nacionais lançaram carta aberta exigindo arrojo do Palácio do Planalto. Basta de discurso vazio. A hora é de firmeza na liderança do processo.